‘Champions League da Amazônia’ propaga esperança em meio a incêndios

  • Por Jovem Pan
  • 12/09/2019 09h21
Fernando Bizerra Jr./EFE Crianças indígenas na Amazônia 'Champions League da Amazônia' propaga esperança em meio a incêndios

Quando cai a noite, Assis pode ser visto combatendo as chamas no coração da Amazônia, mas, de dia, usando a camisa número 7 da Juventus e de Cristiano Ronaldo, ele é um dos muitos jovens indígenas que veem no futebol uma alegria em meio aos incêndios que vêm devastando a maior floresta tropical do mundo.

A aldeia de Marmelos, no sul do estado do Amazonas, parou para assistir, das 8h até o final da tarde, a torneios de equipes masculinas e femininas das comunidades desta reserva indígena dos Tenharim.

A globalização no futebol fala alto até nesse pedaço de Brasil, e os times usam camisas piratas de equipes europeias como Borussia Dortmund, Paris Saint-Germain, Bayern de Munique, Manchester City e Schalke 04 que são vendidas por ambulantes de uma cidade próxima.

Esta “Champions League da Amazônia”, longe do glamour dos estádios europeus, tem campos com gols de finas traves de madeira que parecem prestes a cair a qualquer momento, gramados carecas, bancos de reservas com teto de folhas de palmeira seca e palafitas nos arredores.

O público, de pé e colado nas linhas do campo; e os protagonistas, alguns descalços e outros de chuteiras e meiões, driblam temperaturas escaldantes, enquanto o fundo musical é um reggaeton que não para de tocar.

As partidas se dividem em dois tempos de 10 minutos e são cheias de intensidade, como a que reuniu as versões locais de Juventus e Borussia Dortmund – mas sempre com disputas leais.

Os gandulas têm que estar mais atentos que os do Maracanã. Afinal, um chute forte pra fora pode levar a bola à vizinha rodovia Transamazônica.

Para os jogadores, os grandes ídolos são o português Cristiano Ronaldo e o argentino Lionel Messi – Neymar nem é citado. Para as jogadoras, a referência a seguir é Marta.

Assis se inspira tanto em Cristiano Ronaldo que usa até o mesmo penteado do craque.

“Ele está sempre superando as marcas de gols, disputando com Messi. Me inspiro nele, porque é um jogador que está lutando, perseguindo seu objetivo de ser o melhor jogador do mundo”, afirmou o jovem à Agência Efe.

“Meu time favorito é o Barcelona. E o jogador? Messi”, contou Julio, que usava uma camisa do Corinthians, único “intruso” brasileiro entre os participantes da competição – e que acabou sendo o campeão.

Com uma longa trança, Débora, goleira do PSG local, que levantou o troféu na disputa entre as mulheres, curiosamente se espelha em Marta, uma atacante.

O futebol é uma via de escape nessa reserva situada no sul do Amazonas e que, nas últimas semanas, se viu ameaçada pelos incêndios que se espalharam por diversos pontos da floresta amazônica.

Assis é um dos jovens que ajudaram a combater as chamas, que chegaram a apenas 30 quilômetros de distância de Marmelos e consumiram milhares de hectares.

As imagens de extensas áreas carbonizadas de floresta indignaram a comunidade internacional e ONGs, que cobraram o presidente Jair Bolsonaro pela retórica favorável à exploração de recursos naturais na região.

No caso do estado do Amazonas, onde fica a reserva dos Tenharim, quase metade dos incêndios deste ano ocorreram em terras indígenas e unidades de conservação ambiental.

Além do fogo, os indígenas também enfrentam as constantes pressões de madeireiros, garimpeiros e pecuaristas, e há alguns anos aumentou a tensão com os moradores da cidade de Humaitá, que acusam os Tenharim pelo desaparecimento de três pessoas em 2013.

Mas hoje, no improvisado campo de Marmelos, só havia a preocupação sobre quem será o campeão, que levou um prêmio de R$ 2 mil na categoria masculina, e R$ 500 na feminina.

Os sentimentos e os olhares que se cruzam no irregular gramado são parecidos com os da Champions League original. O gosto da vitória, como os dois pênaltis defendidos pelo goleiro da Juventus ao mais puro estilo Gianluigi Buffon, se mistura com o sabor da derrota experimentado por Mauricio, do Borussia, e Deise, do Bayern de Munique, namorados fora de campo.

A tensão também toma conta do campo na disputa de pênaltis, quando a torcida invade o gramado e celebra os heróis que se misturam entre o futebol e a luta contra os incêndios na Amazônia.

  • Com informações da EFE

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