Com cooperação de vários países, investigações fecham cerco a Ricardo Teixeira

  • Por Estadão Conteúdo
  • 28/11/2017 09h27
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Divulgação Ricardo Teixeira Presidente da CBF entre 1989 e 2012, Ricardo Teixeira é investigado por envolvimento nos crimes de falsidade ideológica, apropriação indébita e evasão de divisas

Em 2016, o FBI enviou uma nota à Polícia Federal brasileira alertando que Ricardo Teixeira, ex-presidente da CBF, havia viajado em um jato privado da CBF para um paraíso fiscal no Caribe. Na lista de convidados no voo, porém, aparecia o nome de outro brasileiro, desconhecido das autoridades: Murilo Ramos. Agora, com a cooperação da França, os norte-americanos descobriram que Ramos era, de fato, um dos representantes do banco Pasche, usado por Teixeira em Mônaco e instituição suspeita de ter sido usada para receber propinas do Catar para a Copa do Mundo de 2022.

Murilo Ramos atuava no Rio de Janeiro em uma espécie de representação do banco de Mônaco. Ele garantiu ao jornal O Estado de S. Paulo que jamais entrou no voo citado pelo FBI. Mas o caso revela o papel da cooperação internacional no cerco que está sendo feito a Ricardo Teixeira.

Atualmente, o ex-dirigente está na mira da Justiça francesa, do FBI, de Andorra, do Brasil, da Suíça e da Espanha. Em cada uma das jurisdições é alvo de inquéritos sobre diferentes aspectos de sua gestão na CBF. Mas, segundo investigadores, as operações identificadas mostram ampla sofisticação e o quebra-cabeça começa a se compor graças à cooperação entre diferentes países.

Na Espanha, Ricardo Teixeira é suspeito de ter montado uma organização criminosa para desviar recursos dos amistosos da Seleção Brasileira. O esquema foi descoberto depois que passou a contar com a cooperação do Ministério Público de Andorra, que obrigou os bancos locais a apresentar os dados sobre as transações do brasileiro. Agora esse processo será transferido ao Brasil para que Teixeira possa eventualmente ser processado no País.

Nos Estados Unidos está sob análise o contrato que ele assinou com a Nike, além de propinas que teria recebido em troca de direitos de transmissão para torneios nacionais. O inquérito, nesse caso, tem a colaboração da Suíça, onde pelo menos três contas bancárias ligadas a ele foram descobertas.

A suspeita é de que Ricardo Teixeira seja o elo entre o Catar e o pagamento de propinas entre dirigentes, em 2010, com transferências a partir de Mônaco direcionadas a Nicolás Leoz, Jack Warner e Mohamed Bin Hammam, todos ex-cartolas da Fifa banidos do futebol. Esses dados, por sua vez, estariam com a Justiça francesa, que colabora com o FBI e a Justiça brasileira para fechar o cerco.

O que fica claro pelas investigações é que Ricardo Teixeira contou com a ajuda dos próprios bancos para escapar de um controle maior. Em entrevista ao O Estado de S. Paulo, a ex-gerente de contas do banco Pasche, Celine Martinelli, revelou que tinha ordens de seus superiores para esconder nos documentos oficiais os cargos de Teixeira no futebol e omitir qualquer relação que pudesse chamar a atenção das autoridades. Ela afirma que se recusou a assinar um crédito para o brasileiro nestas condições.

OBSTÁCULO – Um dos obstáculos nas investigações, porém, é o Brasil. Decisão de uma juíza federal do Rio de Janeiro, em 2015, proíbe o MPF de trocar informações sobre o ex-cartola com a Justiça norte-americana. O MPF entrou com um recurso e aguarda uma decisão do STF.

Mesmo assim, uma das revelações da troca de informações pode ainda respingar na atual gestão da CBF. Em um e-mail da direção da instituição a um hotel de luxo em Monte Carlo em 2014, por exemplo, solicita-se duas reservas de quartos. Uma em nome de Ricardo Teixeira e outra em nome de Murilo Ramos, que já não trabalha mais no banco.

Ao O Estado de S. Paulo, Murilo Ramos confirmou que trabalhou nesta posição e que, por Ricardo Teixeira ser cliente do Pasche, era “obrigado” a receber o ex-cartola para falar de suas aplicações e opções de investimentos. Mas insiste que a conta foi aberta antes de sua chegada ao banco e que a decisão não partiu dele.

Murilo Ramos também aparece em uma lista que, em 2016, o FBI passou à Polícia Federal sobre um voo do jato privado da CBF entre os Estados Unidos e o Rio de Janeiro. A informação consta em um relatório paralelo que o presidente da CPI do Futebol, o senador Romário, preparou no ano passado. No jato estava Ricardo Teixeira, mesmo que já não ocupasse o cargo de presidente da entidade. A aeronave, entretanto, fez uma escala em um paraíso fiscal do Caribe, antes de seguir viagem ao Brasil.

“As informações partilhadas com a Polícia Federal, ressalte-se produzidas pelo Federal Bureau of Investigation – FBI, confirmam que o Cessna 680, prefixo PPAAD, chegou a Orlando, Flórida no dia 31 de janeiro de 2014, vindo de Boa Vista, Brasil (SBBV), com dois tripulantes, Giulio Munhões Marchetti e Sérgio Ferreira Siqueira”, disse o relatório. “Segundo o FBI, a mesma aeronave saiu de Opa Locka, Flórida, no dia 10 de fevereiro de 2014, com os mesmos dois tripulantes e os seguintes passageiros: Murilo Ramos, Ricardo Terra Teixeira e sua filha Antonia Wigand Teixeira, com destino a Barbados e rota final Rio de Janeiro”.

Murilo Ramos, porém, garante que jamais entrou em um avião ao lado de Ricardo Teixeira. Na ocasião do voo citado, diz que de fato estava nos Estados Unidos no mesmo período que o ex-presidente da CBF e que teria tido o seu voo de linha cancelado para retornar ao Brasil. Segundo ele, um convite havia sido feito para que embarcasse no jato privado. Mas ele teria recusado. Ramos garante ter comprovantes da Anac de que ele não estava na aeronave e que comprou um outro bilhete por outra empresa aérea.

A CPI, com ou sem Murilo Ramos no voo, apontou que existem “provas cabais quanto ao uso de aeronave vinculada à Confederação Brasileira de Futebol em viagens, por demais suspeitas, para países considerados verdadeiros paraísos fiscais, notadamente, Barbados”.

“As circunstâncias de uma aeronave oficial da CBF voar para Barbados sem qualquer justificativa e, principalmente, com o ‘conveniente desconhecimento’ de Marco Polo Del Nero, conforme depoimento prestado à CPI, salvo melhor juízo, confirmam a tese de que o jato da entidade vem servindo para transporte de valores ocultos à fiscalização da lei, o que configura crime contra o sistema financeiro nacional (Lei 7.492/86), contra a ordem tributária (Lei 8.137/90), e de lavagem de dinheiro (Lei 9 613/98)”, completou a CPI.

A defesa de Ricardo Teixeira insiste que a conta é declarada e que nela estão recursos “absolutamente lícitos”. O banco Pasche não retornou os pedidos de esclarecimento feitos pelo jornal O Estado de S. Paulo desde a semana passada.

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