Lei Pelé completa 18 anos e deve ser substituída por nova legislação
A Lei Pelé chega à sua maioridade sob ameaça de morrer. Pelo menos em relação ao futebol. No momento, há três iniciativas que se propõem a criar uma lei específica para o futebol: uma na Câmara, outra no Senado, além da promessa da presidente Dilma Rousseff de enviar ao Congresso proposta de revisão do documento atual. É possível que já no próximo ano as relações ligadas ao esporte mais popular do País estejam sob novas regras.
Promulgada em 24 de abril de 1998, a lei 9.615 trouxe como grande novidade o fim do passe. Cessou o fim da ligação draconiana do jogador com o clube, que como “dono” era senhor do seu destino – muitas vezes, clubes interrompiam e até encerravam carreiras -, e criou os direitos econômicos.
Os atletas ganharam mais autonomia, mas então entrou em campo outra figura, a do empresário. Eles passaram a negociar com clubes em nome dos jogadores. Isso resultou em melhores salários, mas também em barganhas. Há quem considere que o jogador se livrou das garras dos cartolas, mas caiu nas dos empresários.
Outra consequência: tornou-se comum o “fatiamento” do atleta. Muitos deles passaram a ter os direitos econômicos divididos entre empresários (algo hoje proibido pela regras da Fifa), empresas e familiares, restando aos clubes um pequeno quinhão. Isso passou a ocorrer até com jogadores em formação, situação que atualmente é um dos maiores motivos de reclamação por parte dos clubes.
Esse é um dos pontos que o projeto que vem sendo gestado desde setembro passado por uma comissão de deputados na Câmara pretende modificar, dando mais segurança jurídica e garantias aos clubes formadores. Ainda em fase de discussão, tem como proposta básica fortalecer clubes e atletas, por meio de uma legislação específica para o futebol brasileiro.
“A Lei Pelé trata os desiguais de forma igual. Atleta de futebol não tem a mesma condição profissional de um de badminton, judô, do basquete”, diz o deputado Rogério Marinho (PSDB-RN), relator do projeto.
O documento em elaboração deve ser liberado para consulta pública em maio e a intenção de Marinho é que seja votado pela comissão por volta de 15 de junho, para que seja apresentado ao plenário da Câmara até o fim daquele mês. Também deverá prever a possibilidade de o clube se tornar empresa, dar maiores garantias aos atletas na relação com os clubes, definir novos parâmetros para o direito de imagem e reduzir os poderes dos empresários.
Otimista, o parlamentar acredita que em dezembro o projeto já terá vencido todas as etapas necessárias para ser promulgado e se tornar lei. Para Marinho, o projeto desenvolvido pelo Senado tem muitos pontos em comum com o da Câmara e os dois trabalhos podem vir a ser complementares.
Passo à frente
Advogado especializado em legislação esportiva, Domingos Sávio considera salutar uma lei só para o futebol. “Está tudo misturado num balaio só”, diz, lembrando que o artigo 28 tornou a Lei Pelé obrigatória apenas para o futebol – sendo opcional para outras modalidades, que acabaram, de maneira geral, pegando carona.
Ele vê aspectos positivos na Lei Pelé e não critica nem a criação dos direitos econômicos, que define como “uma forma disfarçada da lei do passe”. Sávio diz que os clubes se adaptaram à nova realidade, aprendendo a negociar os atletas antes do fim do contrato para ter ganho financeiro (seis meses antes do fim do compromisso o jogador fica livre para assinar com outro clube, sem que o atual tenha direito a alguma remuneração). Retrocesso, na sua opinião, foi a emenda de 2011, que reduziu de 20% para 5% o ganho dos atletas com o direito de arena.
Não é o que pensa, o vice-presidente do Internacional, Carlos Pellegrini. “A Lei Pelé tem que ser refeita na integralidade. É uma legislação de 1998 que já sofreu uma série de alterações substanciais”, diz. “As questões de responsabilidade fiscal e tributária, societária, trabalhista entre clubes e atletas têm de encontrar guarida na mesma norma. Os direitos trabalhistas dos atletas de futebol, por suas peculiaridades, não podem ser regidos pela CLT e sim por norma específica da categoria.”
Modesto Roma Junior, presidente do Santos, concorda com o gaúcho “Infelizmente a Lei Pelé foi feita para atender os interesses dos empresários. Os jogadores diziam que eram escravos do clube, agora são escravos dos empresários. Mudou do ‘Senhor de Engenho’ para o ‘Capitão do Mato’”, disse o santista, que conseguiu resistir o assédio do futebol chinês e manteve Ricardo Oliveira no clube. Como os chineses não pagaram o valor da multa rescisória, o atacante não saiu.
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