Mesmo com recordes e medalhas, por que o futebol feminino não emplaca no Brasil?

  • Por Lucas Reis/Jovem Pan
  • 10/12/2015 17h21
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Ninguém na história do futebol fez mais gols com a camisa da Seleção Brasileira do que Marta. Fenômeno do futebol feminino nacional, a camisa 10 chegou aos 98 gols, ultrapassou o número de Pelé, que tem 95 tentos com o manto verde e amarelo, e mais uma vez fez história defendendo o Brasil.

Além do recorde, a atacante se consolidou como a maior jogadora da história do futebol feminino brasileiro e incentivou novas meninas a se arriscar na carreira, levou o país a patamares nunca antes alcançados, mas não conseguiu um feito que parece ainda distante: transformar a modalidade no Brasil. Um campeonato fraco, clubes sem apoio e pouco interesse por parte dos torcedores são fatores que ilustram a falta de força no futebol feminino brasileiro.

Treinador da Seleção Brasileira feminina em 2004, René Simões vê no pouco tempo de profissionalização da modalidade no Brasil como o principal motivo para o pouco desenvolvimento atual. Ouvido com exclusividade pelo Jovem Pan Online, René fez um paralelo entre futebol feminino e masculino e ainda criticou a falta de planejamento de longo prazo no país.

“Muita gente quer comparar o futebol feminino com o futebol masculino e não dá. O masculino é centenário e o feminino não tem 40 anos. Em termos de tentar dar uma estrutura, a partir de 2004 é que começou a pensar em comissões técnicas, colocando psicólogos, nutricionistas, fisiologistas. Antes nada disso era pensando no futebol feminino. É um futebol com evolução de 10 anos, e dentro desses 10 anos, acho que já teve alguma evolução”, declarou René.

Érika Cristiano, zagueira da Seleção Brasileira há 11 anos e jogadora do PSG, também enxerga esta evolução, mas com ressalvas. “Nesse tempo algumas coisas melhoraram e outras estagnaram. Tivemos uma repercussão muito boa em 2004, em 2008 chegamos na final das Olimpíadas também, tivemos um trabalho bem feito. A partir daí não teve um trabalho tão bom como precisava ter. Houve muitas dificuldades de parte financeira, de visibilidade, e muitas jogadoras preferiram ir pra fora, porque não tinham condições de se manter no Brasil”, analisou a jogadora.

“Tudo pra se estabilizar no Brasil é difícil. Nós não acreditamos em planejamento, não tem projeto de longo prazo. Não dá pra dizer que a CBF olhou de forma tardia. Ela olhou e antes simplesmente não olhava. Quando trabalhei lá, vi que (o futebol feminino) era o patinho feio”, completou René, que comandou as meninas do Brasil nas Olimpíadas de Atenas. Érika também acredita que a modalidade não é tratada como deveria pelos dirigentes do futebol brasileiro, muito por preconceito contra as mulheres.

“Tenho amigas no handebol, no vôlei, na ginástica, na corrida de carro, e todas falam que a mulher sempre tem mais dificuldades, cada uma com seu percentual no esporte. Não é por falta de capacidade, porque temos a mesma capacidade que o masculino, não de força física, mas de inteligência, da parte psicológica. Temos condições de viver de igual pra igual”, pregou.

Além da mudança cultural, René Simões acredita que novas leis possam mudar o esporte, principalmente se o Profut (projeto de refinanciamento das dividias dos clubes brasileiros que pede em troca algumas contrapartidas, entre elas a formação de equipes femininas) for estabelecido no país. “Se o Profut for uma coisa séria, for cobrado e fiscalizado, o futebol feminino vai melhor muito. Tomara que exista a cobrança”.

Érika também é otimista, mas por conta da atual comissão técnica da Seleção Brasileira feminina. “A chegada da comissão que hoje está na Seleção pode mudar a modalidade, não apenas a Seleção. Esse grupo que está na CBF hoje está pensando muito na modalidade em si. Tenho certeza de que eles vão mudar esse modo de pensar da sociedade, de muitos dirigentes, que ainda temos essa dificuldade porque dirigentes ou pessoas que poderiam modificar a modalidade não fazem isso porque não gostam dela”, disse a defensora do PSG.

A intenção é que a organização do futebol feminino brasileiro melhore. “Nos EUA e na Europa não têm medo de investir na modalidade. Eles têm programação, coisa que no Brasil não temos. Eles têm calendários. A palavra correta seria organização. No Brasil não temos organização”, concluiu.

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