Após aposentadoria, Joanna Maranhão vê futuro indefinido e promete não ser candidata agora
Joanna Maranhão está desempregada. Pela primeira vez na carreira, após 17 anos de uma rotina exaustiva de treinos e competições, ela pode acordar durante a semana a hora que bem entender, tomar tranquilamente o café da manhã, ler o jornal, dar uma volta sossegada com os dois cachorros e voltar para casa sem ter a obrigação de fazer nada.
Há duas semanas, uma das principais nadadoras da história brasileira anunciou aos 31 anos de idade sua aposentadoria das piscinas. E não foi por estar em baixa na carreira. Em 2017, ela bateu o recorde sul-americano dos 200 metros medley e dos 200m borboleta e também alcançou as melhores marcas do País nos 400 metros e nos 1.500 metros livre. Em entrevista ao Estado, ela disse que suas motivações em relação à vida mudaram e espera definir em breve qual novo caminho trilhará. “No momento estou desempregada”, disse.
“Já aviso que não vou me candidatar a nada. Bote aí, se puder: ‘a Joanna não vai se candidatar a nada’. Me enchem o saco com isso”, disse. O aviso vem porque há algum tempo brotam boatos de que Joanna Maranhão tentará a carreira política. Isso desde que ela se filiou ao PSOL, em novembro de 2017.
Mas uma coisa nada tem a ver com a outra, segundo ela. Joanna sequer pensa em se tornar dirigente esportiva. “Não me parece a melhor ideia que ex-atletas se tornem dirigentes. As gestões precisam ser técnicas acima de tudo.”
O ideal para o futuro seria transformar seu projeto social em negócio. Desde 2014, sem receber salários, ela toca o Infância Livre, ONG que tem como proposta ensinar crianças de 8 a 12 anos a nadar. As aulas acontecem duas vezes por semana em Belo Horizonte e o intuito é levar também para Recife, sua cidade natal.
Atualmente, ela vê com bons olhos a gestão da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA). Joanna foi uma das atletas que contribuiu para a denúncia contra o ex-presidente da entidade Coaracy Nunes, acusado de organização criminosa. O caso corre na Justiça e o dirigente está afastado do esporte.
“Agora já dá para notar um sentimento de pertencimento. Foi criado um Comitê de Ética na CBDA”, disse. Desde junho de 2017, o presidente Miguel Carlos Cagnoni assumiu o cargo. “Mas tem que ser assim: oito anos de mandato e tchau. Elege-se outro”, opinou
A mudança cíclica também precisaria acontecer na água, segundo Joanna. A falta de uma renovação nas provas que foi especialista chama sua atenção. “Apesar de ter muito orgulho de nunca ter perdido (uma competição nacional) de 2002 para cá, me preocupo muito com isso. Via que minha idade estava passando e em vez de a diferença diminuir, estava aumentando”.
Joanna Maranhão ganhou os holofotes com o histórico quinto lugar nos Jogos de Atenas-2000, quando tinha apenas 17 anos. Desde então esse é o melhor resultado de uma brasileira no maior evento esportivo do mundo. Depois bateu recordes sul-americanos, conquistou medalhas pan-americanas e disputou quatro Olimpíadas.
A medalha olímpica não veio e ela sabe o porquê. No auge da forma física, ela precisou enfrentar seu passado. As crises de pânico e a depressão vieram por causa do assédio sexual que sofreu quando tinha 9 anos de idade. Em 2008, ela tornou pública essa tragédia na sua infância. “Enquanto estava na terapia e nadando muito mal, a natação continuava, e aquele meu tempo do ano 2000 já não era mais tão bom”.
“Enquanto fazia as pazes comigo, esse timing passou. Fui em busca então de ser a melhor Joanna que eu poderia. E consegui isso com 29 anos de idade, quando fui mais rápida do que quando tinha 17”.
Hoje ela dá palestras para contar como fez para superar esse trauma e tenta ajudar de alguma forma pessoas que enfrentam problema semelhante. Sua exposição tem contribuído muito para escancarar esse grave problema. Tanto é que existe uma lei em vigor há seis anos batizada de Joanna Maranhão, que estende prazo de prescrição para estupro de criança. “Todo dia recebo mensagens sobre isso. Os mais graves, passo meu próprio telefone para poder conversar.”
Joanna vive de maneira transparente. Nas redes sociais, ela relata os momentos de alegria ao lado do marido, o judoca campeão mundial Luciano Corrêa, e também os momentos de sofrimento, como o “live” que fez para falar sobre a perda do filho semanas depois de ter descoberto a gravidez.
De certa maneira, consegue levar os “haters” na brincadeira por se sentir realizada com a carreira. Ainda mais agora, que está com a tarde livre para cozinhar um bolo ou nadar sem olhar o tempo no relógio – ela ainda treina ao menos três vezes por semana.
No momento, sua luta está em convencer Luciano a aceitar o gato vira-lata que apareceu na sua casa em BH. Enquanto isso, espera pelo surgimento de novas nadadoras capazes de bater seus recordes nacionais nos 200m borboleta, nos 200m e 400m medley, nos 200m costas, nos 400m e 800m livre e nos 1500m livre.
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