Indicado por Lula para o STF pode ser barrado?
Pela Constituição, presidente só nomeia quem vai para o STF, PGR e BC; Congresso Nacional deveria deixar clara legislação sobre quem tem a competência para fazer as indicações
Dúvida que até a Folha de S.Paulo lançou, editorialmente: o presidente Lula da Silva viola o princípio da impessoalidade ao indicar seu amigo e advogado Cristiano Zanin para uma vaga aberta no Supremo Tribunal Federal? Roberto Requião, ex-senador e ex-governador do Paraná, petista-novo que se considera magoado por não ter sido nomeado para um cargo de importância no governo Lula, resolveu abraçar uma polêmica jurídica-institucional: “Acredito que a indicação de Zanin para o STF é a mais adequada e legítima”. Sem dúvida, a regra em vigor permite que o presidente da República nomeie quem for julgado competente para compor a Corte Constitucional. Cabe ao Senado Federal aprovar o nome — que não precisa ser necessariamente indicado pelo titular do Palácio do Planalto.
Nunca foi “competência constitucional” do presidente da República indicar o nome de pessoa que ocupará o cargo (considerado quase vitalício) de ministro do STF. No Brasil, a indicação presidencial tem acontecido por “usos e costumes”, o que empresta a ares de tradição a um ato que não é previsto na Constituição, na qual fica claro apenas que cabe ao presidente nomear o nome sabatinado no Senado. Não tem previsão na Carta de 1988 — nem em qualquer lei em vigor — a quem cabe “indicar” para o STF. A legislatura que assumiu agora em 2023 tem a obrigação de solucionar esse problema, uma falha de redação legal que peca por falta de clareza. Para a oposição, seria um meio politicamente legítimo de impedir que Lula “emplaque”, no mínimo, dois nomes para o STF, nas vagas que serão abertas com a aposentadoria de Ricardo Lewandowski e Rosa Weber.
A regra é clara no artigo 84 da CF: “Compete privativamente ao Presidente da República: (…) XIV — nomear, APÓS aprovação pelo Senado Federal, os ministros do Supremo Tribunal Federal e dos tribunais superiores, os governadores de territórios, o procurador-geral da República, o presidente e os diretores do Banco Central e outros servidores, quando determinado em lei”. O artigo 101 também é cristalino: “O Supremo Tribunal Federal compõe-se de onze ministros, escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada. Parágrafo único. Os ministros do Supremo Tribunal Federal serão nomeados pelo presidente da República, depois de aprovada a escolha pela maioria absoluta do Senado Federal”. A redação fala de “A ESCOLHA”. Não prevê “A SUA ESCOLHA” (a escolha do presidente). Também não consta no texto a palavra “indicado”.
Existem várias Propostas de Emendas Constitucionais sobre mudanças no artigo 101: PEC 473/2001; PEC 566/2002; PECs 393, 434, de 2009; PEC 17, de 2011 (apensada à PEC 473/2001); PECs 44, 161, de 2012; PECs 3, 46, 55, de 2014; PECs 17, 35, 52, 55, 90, 95, 180, de 2015; PEC 388, de 2017; PEC 406, de 2018. Algumas ainda podem ser apreciadas e outras já estão arquivadas. O curioso é que todas repetem a falha na redação que não permite ao presidente da República a prerrogativa de poder encaminhar (indicar) nome de ministro para o STF, a ser submetido a sabatina no Senado. A mesma omissão sobre o “quem indica” ocorre para o poderoso cargo de procurador-geral da República (sobre o qual Lula já avisou que não vai respeitar a lista tríplice a ser apresentada pelos membros do Ministério Público Federal). No artigo 128, §1º está escrito: “O Ministério Público da União tem por chefe o procurador-geral da República, NOMEADO pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira, maiores de trinta e cinco anos, APÓS a aprovação de seu nome pela maioria absoluta dos membros do Senado Federal, para mandato de dois anos, permitida a recondução”.
Resumindo: Lula não viola a impessoalidade ao indicar seu amigo, advogado ou companheiro de partido para uma vaga no STF. Também não tem qualquer regra que o obrigue a botar na PGR um nome indicado pelos procuradores. O regramento é omisso. Os políticos, também. Dificilmente, o Senado barra algum “indicado” pelo titular do Palácio do Planalto. Desde 1890, só cinco indicações do Presidente (Floriano Peixoto) foram derrubadas pelo Senado, em 1894. As Constituições republicanas do Brasil deixaram claro que os indicados para o STF precisam ter notável saber jurídico. A de 1988, exige sabatina no Senado. O indicado por Lula passa ou repassa? Pode ser barrado? O tempo dirá… Só que os senadores e deputados poderiam — e deveriam — aprimorar a legislação, que é omissa.
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