1914: O princípio do fim para quatro impérios europeus

  • Por Agencia EFE
  • 27/07/2014 11h42
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Ilya U. Topper.

Istambul, 27 jul (EFE).- Quando o imperador austro-húngaro Francisco José leu a declaração de guerra contra a Sérvia, em 28 de julho de 1914, ninguém imaginava que o conflito duraria quatro anos, e menos ainda que acabaria com quatro impérios europeus, mudando a história do Velho Continente, do Oriente e da geopolítica mundial.

O motivo formal da guerra foi o assassinato, um mês antes, em Sarajevo, do arquiduque Francisco Ferdinando, da Áustria, cometido por um jovem nacionalista servo-bósnio em protesto pela anexação austríaca da Bósnia, que considerava parte da Sérvia.

Mas, na realidade, a tensão se acumulava há tempos, e o atentado foi pouco mais do que um pretexto oportuno para redistribuir as cartas geopolíticas em uma Europa na qual dois impérios aliados, Alemanha e Áustria-Hungria, estavam rodeados por três potências em plena expansão colonial: França, Rússia e Grã-Bretanha.

A “corrida pela África” entre Londres e Paris terminou com uma divisão pactuada do continente, no qual Berlim só recebeu dois territórios africanos, um prêmio pequeno para um país de grande desenvolvimento tecnológico e militar, com aspirações de se igualar à Grã-Bretanha como potência marítima.

Não à toa a Alemanha respaldou incondicionalmente a Austria quando a opção de dar um golpe militar contra a Sérvia, aliado do império russo, foi cogitada.

Após os primeiros disparos da artilharia austro-húngara contra Belgrado, em 29 de julho, o czar russo deu a ordem para mobilizar seu exército, e a Alemanha declarou guerra não só à Rússia, mas também à França, aliada de Moscou.

As mudanças que o conflito provocou não foram só políticas e geográficas: a própria forma de fazer a guerra mudou diante da terrível constatação de que as velhas estratégias de ofensivas baseadas no arrojo pessoal de um grande número de soldados não eram efetivas perante os novos adiantamentos tecnológicos.

Centenas de milhares de recrutas morreram, especialmente na dura guerra de trincheiras no front ocidental, já que nada podiam contra as metralhadoras e a artilharia.

No front oriental, a Alemanha resistiu as tropas russas e conquistou a Polônia, então parte do império czarista, o que levou a desmoralização das tropas russas e uma crescente onda de protestos contra o czar.

A tensão entre a Rússia e o império otomano no Cáucaso movimentou o governo turco a escolher o lado da Alemanha e do império austro-húngaro, o que em 1915 levou ao desembarque britânico-francês em Dardanelos, um estratégico estreito marítimo ao sul de Istambul. Os combates terminaram com a vitória turca.

Ao mesmo tempo, a aliança de algumas milícias armênias com os russos que avançavam no leste fez Istambul decidir deportar todos os armênios da Anatólia para a Síria, provocando a morte de mais de um milhão deles no caminho.

O desgaste da guerra teve suas primeiras consequências na Rússia, onde o czar abdicou após a rebelião de fevereiro de 1917 em São Petersburgo.

Mas em novembro do mesmo ano, a revolução bolchevique liderada por Lênin derrubou o governo interino e deu lugar a uma guerra civil russa e à assinatura da paz, em separado, com a Alemanha.

A proclamação da União Soviética não só pôs fim a vários séculos de dinastias russas, mas marcou também de forma decisiva em todo o século XX o desenvolvimento político na Ásia, na África e na América do Sul, onde o modelo comunista inspirou governos, partidos e guerrilhas.

A entrada dos Estados Unidos na guerra, em 1917, foi um novo golpe para a Alemanha. O oficial britânico Lawrence da Arábia incitava com grande sucesso uma rebelião das tribos árabes contra o império otomano, que foi derrotado por tropas britânicas na Mesopotâmia.

No outono de 1918, Berlim e Viena reconheceram o fracasso, e as duas monarquias, a prussiana e a austro-húngara, tiveram que renunciar à coroa e buscar o exílio.

Mas enquanto a Alemanha proclamou a república, o império austro-húngaro foi despedaçado e deu lugar a quatro estados novos: Áustria, Hungria, Tchecoslováquia e Iugoslávia. Também houve aumento substancial dos territórios de Romênia, Polônia e, em menor medida, da Itália.

A quarta vítima da Grande Guerra foi o Império Otomano, que perdeu todos os territórios adquiridos em cinco séculos e esteve a ponto de ver dividida a Anatólia.

A guerra de libertação, liderada por Mustafa Kemal, o herói dos combates em Dardanelos, conteve este processo e levou à proclamação da República da Turquia em 1923.

Mas a nova geopolítica da Europa e do Oriente Médio não deixou de ser provisória, como mostrou 75 anos mais tarde a sangrenta desintegração da Iugoslávia.

O conflito curdo nunca foi resolvido, nem as tensões entre Turquia e Armênia. A aparição de correntes jihadistas que questionam as fronteiras da Síria e Iraque, traçadas durante a I Guerra Mundial, também são reflexo da guerra de um século atrás. EFE

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