A aterrorizante odisseia dos sobreviventes do tráfico humano rumo à Malásia
Noel Caballero.
Bangcoc, 30 mai (EFE).- Enganados, desesperados, em busca de uma nova oportunidade ou embarcados à força por traficantes de pessoas, milhares de rohingyas empreendem uma perigosa travessia de Mianmar à Malásia.
Uma das sobreviventes deste horror é Yasmine, uma adolescente de 13 anos da etnia rohingya, que morava com seu pai e sua mãe no povoado birmanês de Maungdaw, no estado de Rakhine, quando seis homens invadiram a sua casa.
“Seu irmão está na Malásia! Você deve estar com ele!”, gritavam, enquanto a arrastavam diante da impotência dos pais.
Neste relato, divulgado junto a outros em um relatório da organização Human Rights Watch (HRW), a menina conta que os traficantes a encarceraram com mais 15 pessoas em um pequeno barco lotado de imigrantes onde passou por condições miseráveis até ser resgatada.
“Um dia, estava indo para casa do meu sogro com o meu marido quando um grupo de traficantes nos forçou a entrar em um grande navio. Ficamos dois meses nele. Um dia, meu marido voltou para o quarto com a cabeça, os ombros e os braços sangrando. Os traficantes tinham lhe dado uma surra sem que ele soubesse o porquê”, contou Sameera, de 16 anos, que foi libertada na Tailândia.
Yasmine, Sameera e outras mulheres de Mianmar e Bangladesh fazem parte de um grupo de sobreviventes que foi resgatado das quadrilhas de tráfico humano e foram entrevistadas pelo HRW para documentar os abusos sofridos.
Comida escassa, normalmente um punhado de arroz e uma pitada de sal e o único copo de água do dia, insalubres condições sanitárias dos barcos com destino à Malásia são uma constante nas narrações das vítimas, mas nem todas as pessoas foram obrigadas a embarcar. Algumas, de fato, entravam nos navios com a esperança de um novo começo.
“Meu irmão entrou em contato com um homem que nos levaria à Malásia. Ele nos disse que teríamos trabalho lá. Tinha ouvido histórias sobre muitas pessoas morrendo no caminho, mas não dava mais para ficar no meu país”, disse a jovem Hafsa, de 14 anos.
Após dois meses no porão do navio, ela foi levada a uma pequena ilha da Tailândia onde por dois dias passou fome e sede até que ser encontrada pelas autoridades tailandesas. Em seu relato, a adolescente destaca a pobreza e a carência de recursos educativos que os rohingyas enfrentam em sua terra, ao mesmo tempo em que sofrem abusos das autoridades birmanesas.
Khalida, de 25 anos, morava em um acampamento para deslocados internos perto da cidade birmanesa de Sittwe e acreditou nas promessas de trabalho que acabaram por transformá-la em outra vítima do tráfico de pessoas.
“Ele nos levaram a um acampamento (clandestino) em Padang Besar, fronteira entre Malásia e Tailândia. Tentei fugir pela selva, mas um aldeão tailandês me encontrou e me levou de volta”, explicou Khalida, relatando que cada rohingya devolvido vale 5 mil baht (R$ 470).
Mas ela não desanimou. Fez uma segunda tentativa e, desta vez, encontrou um tailandês honesto que a levou à polícia.
“Os traficantes chegaram a nossa cidade e nos ofereceram a viagem para à Malásia de graça para encontrarmos nossos maridos (que após a violência sectária de 2012 tinham ido a esse país), mas quando subimos no barco nos obrigaram a pagar uma quantia em dinheiro que não tínhamos. Então nos prenderam no porão”, lembrou Raziyaa, de 18 anos, da cidade birmanesa de Buthidaung.
No começo do mês, a Tailândia encontrou acampamentos e dezenas de túmulos perto da fronteira com a Malásia. Pouco tempo depois, a Malásia descobriu na mesma região 28 acampamentos clandestinos e 139 fossas.
De acordo com estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), 25 mil pessoas embarcaram em navios em Bangladesh e Mianmar somente nos primeiros três meses de 2015. EFE
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