Amigável com refugiados sírios, Brasil é o principal destino de quem foge de conflito

  • Por Camilla Feltrin/Jovem Pan
  • 07/04/2015 09h37

Os sírios Talal al-Tinawi e Ghazal Baranbo se instalaram em São Paulo com a família

Camilla Feltrin/ Jovem Pan Talal al-Tinawi e família

Ditadura, guerra civil e avanço do Estado Islâmico nas regiões fronteiriças. O cotidiano na Síria não é dos mais agradáveis. Não por menos, 3,9 milhões de habitantes daquele país decidem buscar a paz em outras nações.

Na América Latina, o Brasil é o principal destino dos sírios que tentam um refúgio, com 1,6 mil imigrantes, segundo números levantados pelo Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) em 2014.

Somente no ano passando, o Brasil recebeu 1.326 solicitações de ajuda humanitária feitas por cidadãos sírios, sendo que todas foram deferidas. Isso é permitido pela Resolução Normativa 17, emitida pelo Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) em 2013. Em seu texto, o governo brasileiro reconhece a situação de conflito armado no país árabe, e concede sem nenhum tipo de prerrogativa o visto a estes cidadãos.

“O Brasil é destino porque temos uma grande colônia árabe, a maior libanesa, por exemplo, e existe uma grande tolerância religiosa, étnica e política”, considerou Manuel Furriela, presidente da Comissão do Direito do Refugiado, Asilado e da Proteção Internacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de São Paulo e coordenador do curso de Relações Internacionais da FMU.

O especialista também acredita na extensão do prazo da normativa, que dura até setembro deste ano, já que a paz na Síria não deve voltar tão cedo.

A vida em solo brasileiro

Uma das famílias refugiadas no Brasil é a do engenheiro mecânico Talal Al-Tinawi, 42. Ele se mudou com a esposa Ghazal Baranbo, 32, e os dois filhos para São Paulo em dezembro de 2013. Ex-morador de Damasco, capital da Síria, Tinawi conta que foi detido pelo governo de Bashar al-Saad durante quase quatro meses ao regressar de uma viagem do Líbano porque as autoridades buscavam um homônimo dele.  “Nunca tive problemas com ataques e armas, mas fiquei na prisão injustamente por três meses e meio e isso é muito difícil para mim porque se o outro Talal Al-Tinawi fizer algo errado, eu vou para prisão de novo”, diz.

A família de Tinawi, que cresceu com o nascimento de uma menina em janeiro de 2015, optou por São Paulo após indicação de um conhecido, já que a cidade teria boas oportunidades de emprego, além de uma vasta comunidade árabe. “Só o Brasil autoriza os sírios entrarem sem problemas, só é preciso passaporte. Se eu quiser ir para a América (Estados Unidos), é muito difícil porque ia precisar de muitos documentos. Antes de morar aqui, eu conhecia só o futebol, Rio de Janeiro, São Paulo, Amazônia e café”, disse o engenheiro que matriculou outros dois filhos, um garoto de 13 anos e uma menina de 10, em uma escola estadual. Os dois já são fluentes em português.   

Felizes com o acolhimento do povo brasileiro, Tinawi e a esposa Ghazal pretendem firmar residência no País, mas desejam mudar-se para o interior ou para outro Estado. Eles estão insatisfeitos com a violência na capital paulista. Em março, a dona de casa foi espancada por três homens que buscavam dinheiro dentro do apartamento do casal, localizado na região do Brás. Ghazal ficou com marcas roxas nos braços e dedos, além de ter uma arma apontada para sua cabeça em frente aos filhos. Ela afirma que na Síria, em guerra, nunca sofreu violência parecida.

Assistência especial

Além de emprego e reconhecimento legal do governo, os imigrantes também contam a ajuda e empatia dos brasileiros. Exemplo da empresária paulistana Mena de Almeida, que já abrigou três sírios e hoje divide o próprio apartamento com um jovem de 29, também refugiado. “Um amigo me disse para eu ceder espaço para eles na minha casa e fui atrás para ver se era seguro e se alguém me dava uma garantia. O Consulado sírio se responsabilizou por dois rapazes e então os recebi”, informou.

Outro bom exemplo é o Adus (Instituto de Reintegração do Refugiado), que ajuda os imigrantes e pessoas em situação análoga ao refúgio a encontrarem empregos e a concluírem validação de documentos no Brasil. Um dos coordenadores da entidade, Andrey Brito conta que a maior parte da vagas encontradas para os imigrantes são em restaurantes em São Paulo e região metropolitana. “Uma das principais dificuldades é a língua, mas também a questão de validação de diplomas”, disse ao citar exemplos de engenheiros e médicos que deixaram a terra natal e encontram dificuldades em exercer a função no Brasil.

 

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