Ao contrário dos dias mais prósperos, finlandeses fazem filas por alimentos

  • Por Agencia EFE
  • 15/04/2015 10h52
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Juanjo Galán.

Helsinque, 15 abr (EFE).- A maior parte da população finlandesa vive melhor do que nunca, segundo os especialistas, mas existe uma crescente minoria que se vê obrigada a recorrer à beneficência para sobreviver porque o invejado modelo nórdico de bem-estar social já não é capaz de cobrir suas necessidades mais básicas.

A distribuição gratuita de alimentos, popularmente conhecida como “leipäjono”, surgiu na Finlândia no início dos anos 90, durante a pior crise econômica sofrida pelo país em tempos de paz em seus quase cem anos de história.

A Finlândia superou essa crise com muito esforço e retomou o caminho do crescimento graças ao estímulo da indústria tecnológica, com a liderança da Nokia, mas a distribuição de comida, um fenômeno que o país acreditava ser temporário, hoje atende a mais gente do que nunca.

Em um país de 5,4 milhões de habitantes, os bancos de alimentos, a Igreja Luterana, o Exército de Salvação e outras organizações beneficentes atendem a mais de 22 mil pessoas semanalmente, número que não deixa de crescer devido à persistente crise econômica.

“A situação piorou muito nos últimos dez anos. Quando eu comecei a distribuir comida de graça em 2005, vinham entre 200 e 300 pessoas por semana. Hoje em dia chegam cerca de 2.600”, explicou à Agência Efe Heikki Hursti, diretor de um banco de alimentos situado em Kallio, um bairro de Helsinque.

Ao contrário de outros países ricos, os que são atendidos pela distribuição não são, em sua maioria, indigentes, mas aposentados, desempregados, famílias e inclusive estudantes, cujas pensões ou ajudas do governo mal chegam ao fim do mês em um dos países mais caros da Europa.

“Muitas fábricas fecharam, há cada vez mais pessoas sem trabalho e os subsídios que recebem da seguridade social mal dão para pagar o aluguel. Por isso vêm pedir ajuda”, afirmou Hursti ao descrever uma realidade geralmente desconhecida no resto do mundo.

Seu banco de alimentos, um dos mais antigos da Finlândia, não recebe nenhum apoio estatal e funciona graças a donativos privados e às doações de comida de empresas locais do setor de alimentos.

Ajudado por um grande grupo de voluntários, Hursti atende vários dias por semana a todas as pessoas que chegam a ele sem fazer perguntas, já que, em sua opinião, “se alguém é capaz de fazer uma fila na rua por mais de duas horas, é porque precisa”.

A Finlândia enfrenta três anos consecutivos de recessão, o que obrigou o governo de Helsinque a adotar medidas de austeridade para conter o crescente endividamento público, entre elas o corte de várias prestações sociais.

Isso contribuiu para que o desequilíbrio social entre os ricos e os que têm menos recursos não tenha deixado de crescer nos últimos tempos.

Segundo as últimas estatísticas disponíveis, cerca de 700 mil finlandeses (quase 13% da população) vivem abaixo da linha de pobreza, ou seja, têm renda abaixo de 60% da média nacional.

De acordo com um estudo da Universidade da Finlândia Oriental, 44% dos usuários dos bancos de alimentos dispõem de menos de cem euros ao mês para viver, uma vez descontadas despesas básicas como moradia e comida, e quase um terço vive com uma quantia entre 100 e 300 euros mensais.

“Os alicerces de nosso estado de bem-estar têm deficiências que são visíveis com as milhares de pessoas que enchem as ruas formando as filas por alimentos”, afirmam os autores do estudo.

Isso ocorre apesar de, em 2013, a Finlândia ter destinado 50,337 bilhões de euros a prestações sociais, 43% do gasto público total, segundo o escritório nacional de estatística Tilastokeskus.

O panorama é preocupante, já que, faltando menos de uma semana para as eleições gerais, quase todos os partidos políticos concordam com a necessidade de cortar ainda mais o gasto público – incluindo as prestações sociais – para conter o crescente endividamento.

“Se finalmente cortarem as despesas sociais para economizar, como estão dizendo ao longo da campanha, as filas por alimentos serão ainda mais longas”, alertou Hursti. EFE

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