As “aulas” de jornalismo da junta militar da Tailândia

  • Por Agencia EFE
  • 26/06/2015 06h46
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Noel Caballero.

Bangcoc, 26 jun (EFE).- Cansado de perguntas capciosas da imprensa que o menosprezam, o governo militar da Tailândia convocou cerca de 200 jornalistas para ilustrar como são realizadas “perguntas construtivas” sem “distorcer os fatos”.

Da reunião, programada para a próxima semana no Quartel-General da Polícia Nacional, vão participar veículos estrangeiros junto com representantes do exército e da polícia, informou o comandante militar Suchart Pogput.

“É meu dever construir uma relação saudável e de mútuo entendimento com os veículos”, declarou Suchart, secretário do comitê para o acompanhamento de artigos jornalísticos sobre o Conselho Nacional para a Paz e a Ordem, nome formal da junta militar liderada pelo primeiro-ministro Prayuth Chan-ocha.

A convocação representa a maior reunião com os profissionais dos meios de informação organizada pelos militares que compõem a junta desde que tomaram o poder através de um golpe de Estado em maio de 2014.

No entanto, organizações pró-direitos humanos garantem que o verdadeiro objetivo da reunião é “intimidar” a imprensa para “forçá-la” a se aproximar da versão oficial dos eventos.

“Se você combina as declarações hostis de Prayuth contra a imprensa e as recentes ações do Ministério das Relações Exteriores de negar o credenciamento a jornalistas estrangeiros, parece que começou uma caça contra os repórteres que a Tailândia considera críticos ao governo militar”, disse à Efe Phil Robertson, subdiretor para a Ásia da ONG Human Rights Watch.

A tensa relação entre Prayuth e outros membros do governo com os repórteres se mostrou em várias ocasiões ao longo destes 13 meses de ditadura militar.

O irascível primeiro-ministro chegou a ameaçar em um suposto tom jocoso de “executar” os jornalistas que “não informassem a verdade”.

Prayuth, a quem a organização Repórteres Sem Fronteiras se refere como um “predador da liberdade de expressão”, recriminou uma pergunta feita por uma jornalista local sobre a proibição de um debate político.

“Como tailandês, você pensa que é apropriado (a realização do debate) ou não? Se pensa que não, não deveria perguntar isso. Se pensa que sim é apropriado, você não é tailandês”, alfinetou o chefe do governo.

Em várias ocasiões, o ex-comandante das Forças Armadas focou seu discurso nas “más práticas” da imprensa que “prejudicam” a reputação do país sem assumir “responsabilidades” e que só reivindica mais “direitos e liberdades”.

“Vocês continuam perguntando porque querem briga. Não estou irritado com vocês repórteres, sei que obedecem ordens. Se escrevem coisas boas, suas histórias não são publicadas. Se escrevem coisas ruins, terão seus salários (…) Só na Tailândia se fala de coisas sem sentido. Só criam mais conflitos”, ressaltou Prayuth após uma visita a Mianmar.

O analista político Kan Yuenyong, diretor do instituto Siyam Intelligence, considerou em declarações à Efe que a Tailândia está imersa em problemas econômicos, sociais e políticos, por isso o governo pretende enviar um sinal de “alerta” à imprensa como “guardiã” da informação.

A animosidade de Prayuth, visto por Kan como um “militar da velha-guarda”, não é um caso isolado entre os membros do governo.

O general Tanasak Patimapragorn, vice-primeiro-ministro e ministro das Relações Exteriores, rebateu um correspondente estrangeiro com a pergunta: “Você já esteve na selva?”, ao perguntar por que as autoridades tailandesas desconheciam os acampamentos utilizados para tráfico humano no sul do país.

“Este é um governo de pistoleiros. O abuso sobre os meios vai piorar se os jornalistas concordarem com a grosseira intimidação para controlar suas perguntas”, afirmou o representante da HRW ao pedir aos profissionais para rejeitar as exigências e se unir perante um eventual castigo contra membros da comunidade jornalística.

A Repórteres Sem Fronteiras alertou em abril passado sobre o “dramático retrocesso” sofrido na Tailândia em termos de liberdade de expressão “pelo constante assédio” dos militares contra os meios de comunicação.

Desde que assumiu o poder, a junta militar cancelou dezenas de conferências e simpósios de temática política e agiu de forma drástica contra qualquer manifestação dissidente. EFE

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