Avanço dos curdos impede maioria absoluta de partido de Erdogan na Turquia

  • Por Agencia EFE
  • 07/06/2015 18h05

Ancara, 7 jun (EFE).- O partido islamita Justiça e Desenvolvimento (AKP), fundado pelo presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, perdeu a maioria absoluta do parlamento mantida desde 2002, quando chegou ao poder, nas eleições gerais realizadas neste domingo no país.

Com 40,8% dos votos, o AKP seguirá com ampla vantagem como o partido mais forte do país, mas não contará com o poder absoluto dos últimos 13 anos, quando já chegou controlar quase 60% das cadeiras.

Além da perda de oito pontos percentuais se comparado ao último pleito, o fator que explica a queda do AKP é o sucesso do Partido Democrático dos Povos (HDP), de orientação esquerdista e pró-curda, que superou a barreira de 10% dos votos e entra pela primeira vez no parlamento como partido com lista única. Até então, o HDP só tinha representação política através de candidatos independentes.

Com 99,4% dos votos apurados, os sociais-democratas do Partido Republicano do Povo (CHP) ficaram com 25,2% da preferência dos eleitores, seguido pelos direitistas da Ação Nacional (MHP), com 16,4%.

O HDP alcançou um resultado histórico de 12,8% dos votos, graças não só ao apoio em massa da população curda do sudeste do país, mas também pelo respaldo importante da esquerda em toda a Turquia.

O segundo grande perdedor da noite, atrás do AKP, é o CHP, que registrou uma queda de 0,8 pontos percentuais em relação ao último pleito, com menos votos em praticamente todas as províncias do país.

Enquanto isso, o MHP subiu 3,5 pontos percentuais, alta menor do que a conquistada pelo HDP, que obteve 6,2 pontos percentuais a mais do que a soma de seus candidatos independentes em 2011.

A participação eleitoral foi de 86,3% dos 54 milhões de turcos aptos a votar, índice similar ao registrado no último pleito.

Com a apuração praticamente concluída, o AKP controlará 258 cadeiras no parlamento, seguido do CHP com 138, do MHP com 82 e do HDP com 78, segundo projeção feita pela agência oficial “Anadolu”.

Esse resultado deixa o AKP a 18 cadeiras da maioria absoluta e é considerado por analistas como um grande fracasso do partido, fundado pelo atual presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, que esperava obter mais de 330 deputados.

Um controle superior a 60% do parlamento teria permitido ao AKP aprovar o plebiscito para uma reforma constitucional que pretendia ampliar os poderes do presidente.

“Erdogan agora deve se esquecer do sistema presidencialista”, afirmou o analista político Seyfettin Gürsel à emissora “CNNTÜRK”.

Em vez de se manter neutro na campanha eleitoral, como exige a Constituição turca, o presidente atacou várias vezes o HDP e pediu quase abertamente o voto para o AKP, partido fundado por ele e 2001.

O primeiro-ministro, Ahmet Davutoglu, fez uma breve declaração antes de retornar de sua cidade natal, Konya, a Ancara, onde deve fazer um discurso mais longo sobre o resultado eleitoral.

“Não se preocupem. A decisão do povo é a decisão mais correta”, disse Davutoglu, quando já estava claro que seu partido tinha perdido a maioria absoluta do parlamento.

Vários veículos turcos lembram agora declarações do primeiro-ministro dadas em maio: “Se não formos o partido mais votado, se não pudermos formar um governo sozinho, vou renunciar”.

Apesar de o AKP seguir com uma grande distância em relação aos seus rivais, um governo de minoria é considerado como um caminho difícil. Uma coalizão é avaliada como ainda mais complicada por causa do intenso conflito com todas as demais siglas durante a campanha eleitoral.

O chefe do Instituto Demográfico Konda, Adil Gür, indicou hoje que essa situação pode exigir eleições antecipadas em poucos meses.

Os três partidos opositores poderiam formar uma maioria, mas a inimizade aberta entre os pró-curdos HDP e os nacionalistas do MHP tornam uma cooperação tripartidária em algo improvável.

Alguns analistas preveem o AKP vai apostar em um governo de minoria para depois convocar uma eleição antecipada quando for conveniente. Em todo o caso, as urnas elevam ao status político de Selahattin Demirtas, o jovem e carismático líder do HDP, que soube tirar o partido dos tradicionais redutos curdos e transformá-lo em uma opção aceitável para grande parte da esquerda turca.

Além de sua capacidade de atrair novos apoios, Demirtas teve atuação crucial para acalmar os simpatizantes do HDP e evitar que eles revidassem ataques sofridos nos últimos dias da campanha.

Essa disciplina foi especialmente importante após o atentado cometido na sexta-feira em Diyarbakir contra um comício do HDP, que deixou dois mortos e mais de 100 feridos, muitos deles em estado grave, mas que não resultou em uma resposta aos agressores.

Os analistas afirmam que muitos turcos progressistas votaram no HDP, apesar da distância do movimento curdo, já que consideram que só a entrada do partido no parlamento poderia roubar cadeiras do AKP e impedir a manutenção da maioria absoluta. EFE

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