Barricadas na Venezuela se estendem além das ruas
Alberto Andreo.
San Cristóbal (Venezuela) 14 mar (EFE).- As barricadas que há semanas tomaram o estado venezuelano de Táchira em protesto contra o governo vão além das ruas e se instalaram nas posturas dos atores políticos, confrontados e incapazes de colocar-se de acordo para tirar o país da crise.
Líderes de governo, oposição e estudantes fazem um apelo ao diálogo que não satisfaz nenhuma das partes enquanto o conflito ameaça provocar mais enfrentamentos, que em San Cristóbal, capital do estado, já custou duas vidas.
As Conferências de Paz impulsionadas pelo Executivo venezuelano – a primeira delas em nível regional se desenvolveu em Táchira até quarta-feira – nasceram limitadas pela recusa de setores de oposição e, sobretudo, pela ausência nelas dos movimentos estudantis que lideram os protestos.
“Não é mais que uma emboscada porque decidimos nos manifestar pacificamente e exercer nosso direito constitucional. Em matéria de direitos, nós não fazemos concessões”, disse à Agência Efe Leonardo Montilla, membro da Junta Patriótica Estudantil e Popular por Táchira.
A tentativa de assalto a uma estudante da Universidade de Los Andes (ULA) a caminho da salas de aula no último dia 4 de fevereiro foi o pavio que acendeu os protestos do setor universitário, cansado de pedir ao governador da entidade, o chavista José Vielma, reforços na segurança dos centros de estudo.
Vielma reiterou que, apesar dos esforços do governo, nunca conseguiram encontrar essa moça nem constatar o suposto assalto.
Nesse mesmo dia, um grupo de pessoas atacou sua residência oficial em San Cristóbal, fato pelo qual foram detidas cinco pessoas, e que fez com que os protestos aumentassem e que trouxe a reboque a aparição em vários setores da cidade de “guarimbas”, como se conhece na Venezuela os distúrbios com barricadas.
Dias depois, em 7 de fevereiro, o movimento estudantil ativou uma agenda de rua pela qual se somaram ao protesto nacional convocado junto com setores de oposição no dia 12, assim como ao de apoio ao dirigente antichavista Leopoldo López, no dia 18, quando se entregou voluntariamente às autoridades.
“Há um grupo de pessoas que utilizaram a roupagem de estudantes para desafiar o Estado de direito que existe na Venezuela”, defendeu o secretário de organização regional do governista Partido Para Todos (PPT) em Táchira, Juan Carlos Guevara.
Guevara apoiou assim a ideia defendida pelo ministro do Interior, Miguel Rodríguez, durante o fechamento da Conferência de Paz em Táchira na quarta-feira, quando assegurou que grupos criminosos organizados controlavam as áreas conflituosas de San Cristóbal.
Em sua opinião, a “guarimba” fracassou e amelhor maneira de solucionar a situação é mediante a aplicação da lei e do Estado de direito. “Com o diálogo, perfeito, mas que isso não possa ser traduzido em impunidade”, argumentou.
O deputado da Assembleia Nacional (AN) Orlando Zambrano, do governamental Partido Socialista (PSUV), disse à Efe que não se pode permitir que um “grupo de vândalos” atue de forma violenta contra infraestruturas e cidadãos.
Para o deputado, na Venezuela houve um “amplo debate” sobre a situação em Táchira que, afirmou, “deixou em evidência” o “setor violento da extrema-direita venezuelana” que decidiu não sentar-se à mesa de diálogo.
Táchira foi historicamente uma pedra no sapato do chavismo, uma circunstância que, segundo o deputado na AN pela Aliança Democrática, Walter Márquez, se deve, entre outras, a razões geopolíticas relacionadas com seu caráter fronteiriço.
Para o homem que foi professor de História da ULA por 35 anos a volta da paz à região tem que vir precedida da verdade e acompanhada de justiça.
Além disso, teria que existir um reconhecimento mútuo pelas duas partes que, assegurou, o presidente Nicolás Maduro não faz ao rotular continuamente a oposição de “fascista”.
Maduro afirmou ontem na capital Caracas que não aceitava condições para dialogar com a oposição, ao fazer referência à proposta de uma agenda de cinco pontos que esta considera necessários para poder sentar-se à mesa com o governo.
Enquanto isso, as barricadas mentais em Táchira se estendem além de seus limites estaduais enquanto o número de mortos pelos enfrentamentos derivados dos protestos subiu oficialmente para 28. EFE
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