Chefe do PCC, André do Rap dizia ser agente de artistas e jogadores
Preso no último domingo (15) em uma mansão de luxo em Angra dos Reis, André do Rap levava uma vida de ostentação
Um dos principais nomes do Primeiro Comando da Capital (PCC), na Baixada Santista, em São Paulo, André de Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap, de 42 anos, é suspeito de ostentar um patrimônio de R$ 17 milhões e se apresentava como agente de artistas e jogadores de futebol para disfarçar o dinheiro do tráfico de drogas. Ele foi preso pela Polícia Civil neste fim de semana, em uma mansão em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro.
André do Rap era procurado desde 2014, sob acusação do Ministério Público Federal (MPF) de ser responsável por distribuir cocaína para diversos países, por meio do Porto de Santos. Entre as atribuições, ele articularia negócios entre o PCC e criminosos estrangeiros – incluindo a ‘Ndrangheta, grupo mafioso da Calábria, no sul da Itália, que recebia a droga para redistribuir na Europa.
Livre, o traficante levava uma vida de luxo e conforto: promovia festas, vivia em mansões e viajava de helicóptero para participar de reuniões de negócio. “Essa ostentação – embora, é claro que ele estivesse curtindo – era necessária para conseguir conquistar os clientes e fazer o comércio internacional de drogas”, afirma o delegado Fábio Pinheiro Lopes, do Departamento de Operações Policiais Estratégicas (Dope), responsável pela prisão.
De acordo com a investigação, André do Rap morava em Santos, mas passava os fins de semana em Angra dos Reis, no Rio de Janeiro. O traficante também fazia voos fretados com frequência para Jacarepaguá, na zona oeste carioca, onde tratava de outros negócios.
“Ele disse que era empresário de cantores de rap e que estava começando a empresariar jogador de futebol”, afirma Pinheiro Lopes. Para a polícia, a atividade seria “disfarce para lavar dinheiro do tráfico”.
A vida de Luxo de André do Rap
Em Angra, André do Rap é suspeito de comprar uma casa por R$ 4 milhões, além de alugar outra mansão, em um condomínio fechado, por R$ 20 mil ao mês, de acordo com os cálculos da Polícia Civil. Foi no imóvel alugado que ele foi capturado pelos agentes.
Os investigadores conseguiram chegar até o traficante após monitorar a compra de uma lancha Azimut, de 60 pés, avaliada em R$ 6 milhões. A aquisição teria sido feita por um “laranja”.
“A lancha estava no nome de uma empresa de pequeno porte e o proprietário tinha passagem por formação de quadrilha”, diz o delegado. De acordo com a polícia civil, o proprietário da lancha tinha apenas uma moto CG, avaliada R$ 2,5 mil, o que mostrava a incompatibilidade de patrimônio para a compra da lancha.
A embarcação estava sob cuidado de três marinheiros. O imóvel também contava com caseiro e uma série de empregados domésticos, segundo a polícia. Além de André do Rap, estavam na mansão sua ex-mulher, com quem tem uma filha, e três amigos – dois deles também eram procurados da Justiça e foram presos.
“Tinha muita cerveja no local, como se fosse uma festa”, diz o delegado. Lá, os agentes localizaram, ainda, dois helicópteros – um deles, alugado. Já o outro, com valor estimado de R$ 7 milhões, seria propriedade de André do Rap. A polícia afirma que vai pedir à Justiça o sequestro de todos os bens adquiridos por meio de atividade criminosa.
PCC
André do Rap tem três passagens por tráfico de drogas e ficou, ao todo, sete anos e meio no sistema prisional. Para sua captura, houve colaboração de agências internacionais de inteligência.
A consolidação do Porto de Santos, o maior do Brasil, no tráfico internacional de cocaína tem relação com Rogério Jeremias de Simone, o Gegê do Mangue, um dos líderes históricos do PCC. Ele e Fabiano Alves de Souza, o Paca, foram executados em fevereiro de 2018 após um racha na facção.
Segundo investigadores e especialistas que estudam o PCC, desde então o controle da Baixada Santista passou a ser feito por células da facção – e não mais centralizado em apenas uma figura.
Um dos grupos, por exemplo, tinha como liderança Wagner Ferreira da Silva, o Waguininho ou Cabelo Duro, que também foi assassinado a tiros de fuzil em fevereiro do ano passado. O ataque era uma possível retaliação às mortes de Gegê do Mangue e de Paca.
Em meio à briga do PCC, o setor de inteligência da polícia chegou a receber informação de que André do Rap também havia sido executado. “Ele chegou a ficar foragido porque seria morto pela própria facção, assim como foi Cabelo Duro”, diz o promotor do Ministério Público Estadual de São Paulo Lincoln Gakiya, que investiga o PCC desde 2005. “Só apareceu depois de ter sido perdoado.”
A polícia, contudo, sabe que André do Rap foi morar em Portugal e na Holanda, onde pode ter estreitado relações com traficantes internacionais. Ele é suspeito de ter comunicação direta com membros da ‘Ndrangheta, grupo mafioso italiano.
Em operação realizada em julho de 2018, a Polícia Federal prendeu, em Praia Grande, litoral de São Paulo, o homem apontado como correspondente do grupo mafioso na América Latina: Nicola Assisi, conhecido como Fantasma da Calábria. O filho dele, Patrick Assisi, foi preso na mesma ação.
Segundo Gakyia, as alianças acontecem porque o PCC não tem “expertise para distribuir, por si só, a droga na Europa”. Além dos italianos, a facção já fez negócio com integrantes de máfia da Nigéria e da antiga Iugoslávia, afirma o promotor.
Autor de livro sobre o PCC, o procurador de Justiça Marcio Sérgio Christino afirma que André do Rap atuaria como gerente no Brasil de Gilberto Aparecido dos Santos, o Fuminho, apontado como maior responsável por fazer a cocaína produzida na Bolívia e no Paraguai chegar ao Brasil. “O objetivo dessa rota é conseguir, depois, exportar para Europa, África e Oriente Médio”, diz.
Embora atue como uma espécie de autônomo no tráfico, Fuminho tem relação próxima com o líder máximo do PCC, Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola. Foragido da Justiça, ele chegou a ser apontado como o mandante dos crimes contra Gegê e Paca e foi jurado de morte pela facção. Ele também já teria sido perdoado, segundo os investigadores do caso.
Professora da Universidade Federal do ABC (UFABC) e uma das principais especialistas em estudos sobre crime organizado no Brasil, a socióloga Camila Nunes Dias diz que o impacto da prisão de André do Rap para a organização do PCC deve ser “pontual”. “Embora algumas pessoas tenham posição importante, os esquemas da facção para o tráfico envolvem muita gente”, afirma
“A gente pode entender o PCC como uma rede, cuja capacidade de reposição é muito rápida”, diz Camila. “O grupo tem como base de recrutamento o próprio sistema carcerário, então a prisão de pessoas específicas é parte de um ciclo que alimenta a própria rede.”
*Com informações do Estadão Conteúdo
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