CPMI aprova relatório final com pedido de investigação de Janot e de mudanças na delação
Após dois dias de discussões, a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) da JBS aprovou nesta quinta-feira (14) 0 relatório final do deputado Carlos Marun (PMDB-MS). Marun assumirá o ministério da Secretaria de Governo do presidente Michel Temer. A posse seria ainda nesta quinta, mas foi adiada já que Temer segue internado após cirurgia no sistema urinário.
Focando em críticas ao Ministério Público e no acordo de delação com a JBS e visto como uma resposta política à Lava Jato, o relatório pede investigação do ex-procurador-geral Rodrigo Janot, o indiciamento dos irmãos Joesley e Wesley Batista, entre outros.
Marun pediu ainda que a Polícia Federal investigue uma suposta atuação da JBS na indicação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, atual relator na Lava Jato, em 2015.
O relatório foi aprovado pela comissão de maioria governista, em sessão esvaziada, com três votos contrários: dos deputados Delegado Francischini (SD-PR), Hugo Leal (PSB-RJ) e João Gualberto (PSDB-BA).
Marun disse que se sente “vitorioso” e que tentou “se aproximar o mais possível do pensamento médio do colegiado”. O parlamentar afirmou que sofreu “agressões desnecessárias” de alguns membros da CPMI e que “dependendo de onde vem, ofensas são elogios”. Marun acusou os críticos de sua relatoria de já terem recebido “decisões favoráveis, pode ser que justas”, da Procuradoria-Geral da República, principal alvo do texto final da Comissão.
O presidente da CPMI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO) disse que “dificilmente” Janot não sabia das irregularidades envolvendo o acordo de colaboração com a JBS. Nesta quinta (14), Ataídes pediu que a atual procuradora-geral Raquel Dodge dê prosseguimento às linhas de investigação levantadas pela comissão. Ele diz acreditar que a CPMI “rendeu bons frutos”. O senador defendeu mudanças na lei da delação premiada, um “aperfeiçoamento”, segundo ele, “que com certeza vai ser debatido nas duas Casa”.
O tucano negou que a comissão tenha sido pró-governo. “Essa CPMI nunca foi chapa branca”, disse Ataídes, bravo, citando a presença sub-relatores do PT e membros da comissão de partidos como PSC e PSB.
Negociação
Após dois dias de debates, houve um esforço de negociação para aprovação do texto final do relatório. Marun retirou do texto, a pedido do deputado Delegado Francischini (SD-PR), a defesa do projeto (PL 7596/17) que prevê o crime de abuso de autoridade por membros do Ministério Público e outras autoridades. “Esse projeto é destinado a punir policiais e membros do Ministério Público”, disse Francischini.
O relator retirou ainda trecho do sub-relatório apresentado pelo deputado Wadih Damous que pedia a investigação das denúncias feitas à CPMI pelo advogado Rodrigo Tacla Durán. O advogado questionou provas usadas pelo Ministério Público para embasar denúncias feitas pela Operação Lava Jato e disse que há direcionamento de delações contra determinados alvos. Durán disse ainda ter recebido a proposta de redução de multa, feita por um advogado de Curitiba que seria amigo do juiz Sergio Moro, em troca do pagamento de RS 5 milhões.
Indiciamentos e investigações
O relatório de Marun pede uma investigação “profunda” sobre o ex-procurador-geral Rodrigo Janot, que apresentou duas denúncias criminais contra o presidente Michel Temer a partir da delação da JBS.
Ambas as acusações contra Temer (por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça) foram barradas pela maioria da Câmara, embora tenham fragilizado o governo e paralisado a pauta de votações do Congresso em 2017.
Indícios posteriores apontaram que a gravação de Joesley Batista do presidente Temer no Palácio do Jaburu, uma das provas contra o peemedebista, foi orientada por membros do Ministério Público, o que se configuraria uma ação controlada, ilegal sem a aprovação do Supremo Tribunal Federal contra um presidente da República.
A classe política reagiu e a CPMI foi vista pela oposição como uma tentativa de retaliação sobre os avanços e erros do Ministério Público na Lava Jato em Brasília.
No começo da semana, Marun solicitou o indiciamento de Janot e do procurador Eduardo Pelella, que também participou do acordo de delação da JBS. Nesta quarta (13), porém, o relator recuou e pediu apenas a investigação da dupla.
Foram mantidos, no entanto, os pedidos de indiciamento dos empresários da JBS Joesley Batista, Wesley Batista, Ricardo Saud e do ex-procurador Marcelo Miller, que atuou em escritório de advocacia ligado à JBS depois de deixar o MPF.
O relator sustenta que Miller, que fazia parte da equipe de Janot, orientou os donos da JBS antes de deixar o Ministério Público para atuar como advogado da própria JBS no processo de acordo de leniência.
Já os irmãos Joesley e Wesley Batista são acusados de corrupção ativa, uso indevido de informação privilegiada e manipulação de mercado. Eles teriam lucrado com a informação sobre a própria delação no mercado de dólares e de ações da própria empresa. O pedido de indiciamento do executivo Ricardo Saud é por corrupção ativa.
Mudanças na lei da Delação
Marun acatou recomendação do sub-relator, deputado Wadih Damous (PT-RJ), que recomenda a “regulamentação” e alterações na lei das delações premiadas. Esse trecho foi incorporado ao relatório de Marun.
Após a fala de Marun, Damous deu detalhes sobre suas propostas de alteração regra que regulamenta as colaborações, base das investigações da Lava Jato. Ele quer colocar os benefícios da delação “taxativamente” explícitos na lei, e não “exemplificativamente”. “Fora disso (do que estiver previsto em lei) não pode haver promessas de paraíso para os delatores”, disse. O petista citou o doleiro Alberto Yousseff, que “hoje goza de sua fortuna e produtos auferidos por meio de sua atividade ilícita”.
“Onde há muito dinheiro envolvido, muito poder envolvido e pouca transparência, como é no processo de delação hoje em dia, muitas vezes ocorrem coisas não muito republicanas”, disse Marun, incorporando o relatório do petista na terça-feira (12).
Investigação sobre nomeação de Fachin
Sem citar diretamente o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin, relator da Lava Jato na Corte, Marun pediu que a suposta atuação do ex-diretor da JBS Ricardo Saud em sua indicação ao STF, em 2015, seja investigada pela Polícia Federal.
“Recomendo à Polícia Federal que investigue visitas de Ricardo Saud a senadores pleiteando apoio destes a pretendentes a ocupar a vaga de ministro do Supremo Tribunal Federal no período de 2014 a 2016”, disse Marun. Fachin foi o único membro do STF a assumir o cargo nesse período.
A solicitação tem relação com boatos de que o ministro Luiz Edson Fachin teria tido ajuda dos irmãos Batista para viabilizar sua indicação à Suprema Corte.
Luiz Edson Fachin foi indicado ao Supremo pela ex-presidente Dilma Rousseff em 2015. Ele passou por sabatina de mais de 11 horas no Senado antes de ser aprovado. No começo de 2017, Fachin assumiu a relatoria da Lava Jato no Supremo após a morte do ex-ministro Teori Zavascki em acidente aéreo.
Quarentena no MP
O presidente da CPMI, senador Ataídes Oliveira (PSDB-TO), pediu ao relator a inclusão no relatório do pedido de tramitação de projeto de lei dele mesmo que regulamenta a quarentena para ex-juízes e ex-promotores que atuem na advocacia privada.
Aprovado na CCJ do Senado, o PLS 341/2017 altera o Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/1994) para proibir a atuação profissional por ex-juízes e ex-promotores no prazo de três anos a partir de seu afastamento do respectivo cargo, por aposentadoria ou exoneração.
O impedimento valeria para o juízo ou tribunal do qual se afastaram, estendendo-se a qualquer atividade que caracterize conflito de interesse ou utilização de informação privilegiada.
O ex-procurador Marcelo Miller ajudou no acordo de colaboração da JBS e depois atuou em empresa que servia à empresa. Segundo Ataídes, “tudo isso poderia ter sido evitado” caso a lei que ele propõe já estivesse em vigor.
Retaliação?
De maioria governista, a CPMI é vista pela oposição como uma forma de retaliar Rodrigo Janot e a PGR por terem denunciado o presidente Michel Temer.
A delação da JBS embasou duas denúncias criminais contra o presidente Michel Temer, por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução da justiça. Além dele, o ex-assessor, Rodrigo Rocha Loures, gravado recebendo uma mala com R$ 500 mil de executivo da empresa, o senador e presidente licenciado do PSDB, Aécio Neves, que pediu R$ 2 milhões a Joesley, parte da cúpula do PMDB e outros políticos são investigados ou denunciados.
O Ministério Público Federal, MPs estaduais, Polícia Federal e polícias estaduais receberam cópias do relatório. A documentação obtida pela comissão e as reuniões secretas da CPMI foram encaminhadas ao MPF em sigilo e Marun pede o mesmo tratamento.
Veja o momento de aprovação do relatório em rápida sessão nesta quinta:
Relatório aponta que J&F se beneficiou de medida provisória e pede nova CPI
*Errata: o texto inicial informava que o relatório recomendava agilidade na tramitação do projeto de lei que regulamenta o abuso de autoridade de juízes e promotores. No entanto, esse trecho do relatório foi retirado em negociação dos parlamentares entre quarta (13) e quinta (14). O texto e o título foram corrigidos às 10h50.
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