Delegado da PF receia política instável e promete reação caso haja interferência

  • Por Agência Estado
  • 20/04/2016 09h24
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São Paulo - Polícia Federal chega a construtora Odebrecht na 23ª fase da Operação Lava Jato( Rovena Rosa/Agência Brasil) Rovena Rosa/Agência Brasil Polícia Federal chega à sede da Construtora Odebrecht

O presidente da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal, Carlos Eduardo Sobral, afirma que a categoria não vai aceitar interferência nos seus trabalhos se houver mudança de governo caso o Senado ratifique o impeachment da presidente Dilma Rousseff. “Se houver qualquer tentativa de intimidação e interferência nós vamos resistir e chamar a população para o lado da Polícia Federal”, disse Sobral em entrevista.

A provável mudança de governo ameaça a atuação da Polícia Federal?

Infelizmente a Polícia Federal ainda não tem a sua autonomia prevista na Constituição da República. O nosso diretor-geral não tem mandato, pode ser demitido a qualquer tempo. A saída do diretor-geral implica mudança de mais de 200 delegados que exercem função de chefia, de coordenação. Então uma mudança de governo traz um risco, primeiro pela possibilidade de paralisação do órgão em caso de troca na chefia. Depois esse componente político, porque há vários membros do poder político investigados pela PF, e evidentemente quem vai nomear o corpo diretivo da Polícia Federal passa por esse filtro político.

Os delegados estão com receio?

Estamos sim, há um clima de receio por falta dessa força institucional, de não termos a autonomia garantida na Constituição. Temos receio sim, se falarmos que não é mentira, e o cenário político é de intensa instabilidade.

Receio de um eventual governo Temer?

Não especificamente de um governo Temer, da pessoa, mas (do que pode acontecer) em um cenário de instabilidade política no qual há uma investigação policial de grande envergadura (Lava Jato) que acaba por ter como envolvidos políticos. Evidente que neste cenário causa grande apreensão. Não fazemos essa avaliação em relação a partido A, B ou C. Nós temos um contexto de que políticos e pessoas com poder econômico sendo investigados e que esta fragilidade pode ser que haja ações pra interferir nas investigações.

O sr. ou outros representantes da categoria têm sido procurados por políticos ou aliados do grupo de Temer?

Não. Nós somos meros espectadores da decisão política e vamos continuar com as investigações. Nosso trabalho é técnico e evidente que vamos reagir se houver alguma interferência. Não houve procura e se houvesse procura ela não teria resposta do nosso lado.

Para os delegados, Leandro Daiello deve permanecer no cargo com a eventual mudança na Presidência?

O que nós defendemos é que o diretor-geral da PF tenha mandato. Com o prazo de mandato o risco de interferência é muito menor. Na ausência de mandato, a substituição de um diretor da PF, caso ocorra, tem que ser muito bem pensada porque causa um atraso, isso é fato. Diante de um cenário com a Lava Jato em que não podemos ter atraso, não é recomendável uma mudança neste momento

A Lava Jato está sob ameaça? Como os delegados lidam com essa expectativa?

Como nós não temos garantias, toda instituição esta sob ameaça. Temos uma dificuldade orçamentária hoje que é tremenda. Nossos investimentos são decrescentes e as dificuldades para fazer investigações são indecentes, temos que pagar diárias do próprio bolso. Além disso, temos atualmente 500 cargos vagos de delegados, e a previsão é de outros 400 se aposentando em dois ou três anos, ou seja, podemos acabar ficando com metade do efetivo no futuro. Em relação à operação, evidentemente que, em caso de mudança (nos quadros da PF), isso colocaria um risco à continuidade da investigação.

Em que fase se encontra a tramitação da PEC 412, que estabelece autonomia financeira e administrativa da Polícia Federal?

Atualmente a PEC está na Comissão de Constituição e Justiça, ainda em fase inicial. Ela foi proposta em 2009 e ainda não avançou. Acreditamos que a CCJ deve aprovar, e a Câmara e depois o Senado para demonstrar que a autonomia da PF investigar, que foi uma conquista recente, tem que permanecer.

A que período o sr. se refere quando fala na independência como “conquista recente”?

De 2002 até 2008 a Polícia Federal cresceu muito, do final do governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB) até o primeiro governo Lula (PT). Depois passamos a sofrer restrições orçamentárias muito rígidas, e mesmo assim conseguimos realizar investigações. Nosso receio agora é que o mundo político interprete que errou ao apoiar a construção de uma Polícia Federal forte e que haja um retrocesso. Como nossa força não está prevista na Constituição, o risco de haver retrocesso é concreto. Vira e mexe ouvimos que determinada autoridade política “permitiu” que se investigasse, e isso é muito ruim porque e se uma outra autoridade que assumir decidir que não quer permitir a investigação e prejudicar a Polícia Federal?

Os presidentes da Câmara e do Senado estão entre os investigados da Lava Jato e o próprio Temer também foi citado em delações. Qual o recado dos delegados sobre estes casos?

O nosso recado é de que independentemente do poder político, do poder econômico, da pessoa suspeita de participar de atos ilícitos, a Polícia Federal vai investigar. Se houver qualquer tentativa de intimidação e interferência nós vamos resistir e chamar a população para o lado da Polícia Federal para evitar que essa instituição sucumba por interesses políticos.

Em relação a uma eventual mudança de ministro da Justiça, os delegados têm algum preferido?

Não, mas é evidente que o ministro que respeitar a autonomia investigativa e não interferir politicamente na Polícia Federal terá o nosso apoio. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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