Empreiteiras foram obrigadas a participar de desvios na Petrobras e não devem pagar por danos morais, diz jurista

  • Por Jovem Pan
  • 20/02/2015 16h22
RIO DE JANEIRO,RJ,28.01.2015:PETROBRAS-RJ - Fachada da sede da Petrobras, no Rio de Janeiro (RJ), nesta quarta-feira (28). A Petrobras divulgou durante a madrugada o resultado da empresa no terceiro trimestre do ano passado. Sem considerar os prejuízos com a corrupção, a Petrobras teve um lucro de R$ 3,1 bilhões no período de julho a setembro do ano passado. Uma queda de 28% em relação ao mesmo período de 2013. . (Foto: Ale Silva/Futura Press/Folhapress) Ale Silva/Futura Press/Folhapress Fachada da sede da Petrobras

O jurista Ives Gandra Martins entende que a participação de empreiteiras no escândalo de corrupção na Petrobras investigada na Operação Lava Jato foi compulsória, e por isso, elas não deveriam ser multadas por “danos morais de caráter difuso e coletivo”, como pediu o Ministério Público (MPF) nesta sexta-feira. O MPF entrou com cinco ações de improbidade na Justiça Federal no qual pede cerca de R$ 4,5 bilhões de reais (precisamente R$ 4.475.808.527,24), sendo que a maior parte do valor, R$ 3,19 bilhões, é por “danos morais coletivos”. R$ 319 milhões são de ressarcimento e R$ 959 milhões, de pagamento de multa civil.

Os alvos dos processos são as empreiteiras Camargo Corrêa, Sanko, Mendes Júnior, OAS, Galvão Engenharia, Engevix, algumas das maiores do País, além de seus executivos. O pedido do MPF inclui também a proibição de contratar com o poder público, receber incentivos fiscais e incentivos de crédito.

O jurista entende que o poder público coage as empresas a participarem dos desvios, “senão elas ficariam fora do clube”. “É evidente que eles não estão corrompendo, eles estão sendo obrigados a entrar dentro do clube por má gestão daques que estavam à frente da Petrobras”, avalia Ives Gandra.

Para o especialista, “a empresa (que presta serviço à Petrobras) está toda montada para atender o poder público”, por isso não teria condições de recusar as propostas ilícitas. “Se dissessem que não iriam entrar no clube, não teria como pagar seus impostos, suas despesas”, considera. “O crime é muito mais de concussão (entenda mais abaixo), do que de corrupção; não foram eles que corromperam”, opina. “Foi uma montagem de dinheiro para desviar dinheiro da Petrobras para determinados projetos políticos”, afirmou o jurista.

Danos morais

Ives também não vê correta a indenização por danos morais. “Estão colocando direitos difusos como elementos para cobrir valores”, critica. “Eles (das empresas processadas) vão pagar para sustentar uma empresa que os obrigou a trabalhar dessa forma”, avaliou. Para Martins, danos morais acontecem apenas individualmente e não há como ser devolvido algo que feriu o “orgulho nacional”, termo muito genérico. Ele compara o caso com a goleada sofrida pelo Brasil na Copa Do Mundo diante da Alemanha, por 7×1, em que a CBF não foi processada por ferir o “orgulho nacional”. “Ressarcimento é outra coisa”, ressalta Ives, concordando com os pedidos deste tipo.

Além disso, o jurista entende que, se a Justiça aceitar a denúncia do Ministério Público e proibir novos contratos dessas principais empreiteiras, “vamos parar as obras no Brasil”. “Vamos ter uma paralisação dos serviços públicos, despedidas de funcionários e isso tem que ser considerado pelo juiz”. Isso porque as companhias acusadas são “as empresas mais capacitadas para fazer determinadas obras de infraestrutura do país” e não tê-las atuando poderia significar um “colapso nacional”.

Mesmo discordando do veredito jurídico, Gandra faz questão de elogiar o “excelente o trabalho da Polícia Federal” no ponto de vista da apuração.

Concussão x Corrupção

O jurista constitucionalista explica também, com exemplos, a diferência no âmbito legal entre corrupção e concussão, crime este no qual entende que as empreiteiras deveriam ser enquadradas.

Na concussão, “a pena é só do agente público que forçou” o ato ilícito. Ives Gandra exemplifica com um cidadão que precisa de fazer uma viagem e para isso tem que retirar um visto. Então, o agente público lhe exige uma quantia de dinheiro para dar o visto e ele é obrigado a pagar. É quando o poder público “não lhe dá outra alternativa para poder fazer o que você precisa fazer”.

“Corrupção é o contrário”, explicou. “Alguém da sociedade chega ao agente público, que normalmente é um cidadão honesto e o corrompe.”

“Na Petrobras, está evidente que não foram as empresas que corromperam, foi um esquema que saiu da Petrobras obrigando as empresas a atuarem dessa forma”, avaliou Ives.

Futuro

A respeito desses pedidos do MPF, Ives Gandra entende que não será o juiz federal do Paraná Sérgio Moro que dará o ultimato. Isso porque Moro é da vara penal e uma ação dessas impetrada pelo Ministério Público é de natureza civil.

O jurista entende, contudo, que o processo proveniente da Operação Lava Jato está longe de seu fim e projeta “pelo menos quatro instâncias” pelas quais subirá a ação do caso. “Eu tenho impressão de que essa é uma matéria que necessariamente vai terminar no Supremo Tribunal Federal”, aponta. O STF deve receber denúncia ainda neste fevereiro.

Ouça a entrevista completa de Ives Gandra Martins no áudio acima.

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