Ex-funcionários do BB dizem que doleiros movimentavam até R$ 1 milhão por dia
Dois ex-funcionários do Banco do Brasil (BB) disseram nesta terça-feira (18), em depoimento à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Petrobras, que doleiros ligados a Alberto Youssef, o principal delator da Operação Lava Jato, movimentavam quantias que variavam de R$ 800 mil a R$ 1 milhão na agência Campos Elísios, em São Paulo (SP), durante o ano de 2014. A Lava Jato investiga a corrupção bilionária na Petrobras
Os depósitos eram feitos nas contas de empresas abertas pela doleira Nelma Kodama e pela Districash Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários, do doleiro Raul Srour, dono da corretora TOV.
O ex-bancário Rinaldo Gonçalves de Carvalho, demitido do Banco do Brasil por ter sido acusado de envolvimento em operações ilegais de câmbio, disse que Nelma Kodama chegou a movimentar R$ 1 milhão por dia na agência.
Já o ex-gerente-geral da agência, José Aparecido Augusto Eiras, disse que o volume girava em torno de R$ 800 mil, o que fez o Banco do Brasil dar um tratamento diferenciado à Districash, que passou a ter direito de enviar um malote com montante em espécie, lacrado, dinheiro que era contado e depositado nas contas de Srour internamente – no lugar do caixa.
R$ 275 milhões
Segundo Relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), a Districash teria movimentado entre janeiro e agosto de 2013 cerca de R$ 275 milhões em sua conta no Banco do Brasil.
O ex-funcionário disse que os depósitos feitos pelas empresas de Kodama eram depois transferidos para a empresa de Srour.
Kodama foi condenada a 18 anos de prisão por evasão de divisas e lavagem de dinheiro. O depoimento de Nelma Kodama à CPI, em maio, fez a comissão focar suas investigações na atuação de operadores de câmbio e bancos.
Kodama, dentro do esquema atribuído a Alberto Youssef, comandava um grupo responsável por abrir empresas de fachada e enviar dinheiro para o exterior por meio de operações fictícias de importação. Na última quinta-feira (13), um operador ligado a Kodama, Lucas Pacce Jr., confirmou à CPI a existência de brechas legais e de falhas na fiscalização da atividade dos doleiros.
Pacce disse que o Banco Central facilitou as irregularidades ao permitir que as corretoras atuassem como bancos no mercado de câmbio a partir de 2006. Kodama operava junto com a TOV.
Recebeu dinheiro
Rinaldo Gonçalves de Carvalho admitiu que recebeu dinheiro de Kodama para gerenciar contas. “Foram empréstimos”, disse, ao responder pergunta do relator da CPI, deputado Luiz Sérgio (PT-RJ). “Mas o senhor pagou o empréstimo?”, perguntou o deputado. “Não”, respondeu o ex-bancário.
O ex-bancário disse que não sabia que as contas que gerenciava tinham relação com operações ilegais do doleiro Alberto Youssef e atribuiu responsabilidade aos gerentes do Banco do Brasil.
Sócia de doleiro
O ex-gerente geral da agência dele, José Aparecido Augusto Eiras, foi acusado por Kodama de ser sócio de Srour. Ele negou, mas admitiu à CPI que sua cunhada, Vanessa, foi sócia do doleiro na empresa de cobranças CRG Serviços, Assessoria de Crédito e Cobranças Ltda.
O ex-gerente admitiu a ligação comercial da cunhada com o doleiro ao responder pergunta do deputado Altineu Côrtes (PR-RJ), um dos sub-relatores da CPI.
“O Raul (Srour) me perguntou se eu conhecia algum contador que tivesse alguma empresa para vender, alegando que precisava ter uma empresa para usar em caso de algum problema de capital de giro. Como a empresa dele era sólida, e eu não tinha motivos para desconfiar de irregularidades, me lembrei que minha mulher tinha uma empresa, a CRG, que estava inativa. Ela a vendeu, e ele precisava de uma sócia para ficar com 1% do capital. Indicamos a Vanessa, que era estudante e precisava bancar a faculdade”, admitiu.
Negou irregularidades
O ex-gerente negou participação em irregularidade e justificou, perante a CPI, as movimentações da Districash, de Srour, na agência onde trabalhava.
“Ele tinha grande movimentação em espécie porque depositava em dinheiro a comissão que recebia pela compra e venda de moedas em várias lojas que possuía em São Paulo”, disse. Segundo o ex-gerente, que pediu aposentadoria do banco assim que teve o nome envolvido em suspeitas de irregularidades, ele e outros funcionários verificaram pessoalmente a empresa de Srour para que o doleiro pudesse movimentar grandes somas de dinheiro na agência.
Eiras negou irregularidades e disse que todas as movimentações da Districash foram comunicadas ao Banco Central e que o tratamento diferenciado dado à empresa foi por motivo de segurança, em razão da grande soma de dinheiro movimentada.
Contradições
“Existem muitas contradições nos depoimentos deles”, disse Altineu Côrtes. Já o relator da CPI, deputado Luiz Sérgio, considerou os depoimentos importantes para que a comissão aponte mudanças na legislação relativa a operações de câmbio. “Uma saída possível é tirar das operadoras a liberdade que tem hoje para atuar nas operações com dólar”, disse.
Novos depoimentos
Na próxima quinta-feira, a CPI vai ouvir o doleiro Raul Srour e Fernando Heller, diretor da corretora TOV. Também estão marcados os depoimentos de dois operadores que não tem relação direta com as irregularidades na Petrobras:
* Paulo Pires de Almeida, um dos titulares de uma conta secreta aberta em Luxemburgo e apontada pela polícia alemã como fonte de pagamento para agentes públicos de São Paulo que teriam recebido propina da empresa Siemens em troca do contrato de construção do metrô; e
* Marco Ernst Matalon, investigado pela Operação Satiagraha.
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.