Executivo corrupto terá de se afastar de empresa, diz governo

  • Por Estadão Conteúdo
  • 15/12/2016 13h47
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Palácio do Planalto "bateu picos de gastos com publicidade" e estas despesas aumentaram 65% de um ano para o outro Valter Campanato/Agência Brasil Palácio do Planalto - Ag. Brasil

O governo federal informou nesta quinta-feira (15) que exigirá o afastamento de executivos envolvidos em corrupção das empresas que firmarem acordos de leniência, entre elas as empreiteiras da Operação Lava Jato. O anúncio foi feito durante a apresentação de uma portaria interministerial que define novos procedimentos para a celebração dos termos. O documento foi assinado pelos ministros da Advocacia-Geral da União (AGU), Grace Mendonça, e da Transparência, Torquato Jardim.

Conforme antecipou o jornal “O Estado de S. Paulo” nesta quarta-feira, 14, para firmar os acordos, as empresas terão de cumprir “contratos de conduta controlada”, que, entre outras exigências, vão impor a montagem de programas internos de combate à corrupção (compliance), com mecanismos para receber denúncias contra funcionários envolvidos em ilicitudes, investigá-las e encaminhá-las aos órgãos competentes. O afastamento de dirigentes flagrados em ilegalidades também será uma imposição. 

“Uma das coisas é essa. Isso aí a gente avalia para todos os acordos. Como é que você vai dar efetividade a um programa de compliance, sendo que as mesmas pessoas envolvidas num caso de corrupção estão atuando?”, questionou o secretário-executivo do Ministério da Transparência, Wagner dos Santos Rosário.

Atualmente, estão sendo negociados com o governo 21 acordos de leniência, que são espécies de delações premiadas de pessoas jurídicas. O principal interesse das empresas é evitar a proibição de participar de licitações e de contratar com a administração pública. Nesse universo, ao menos 12 são investigadas na Operação Lava Jato, entre elas as maiores empreiteiras do País. Ao menos cinco casos, cujos detalhes não foram divulgados, estão em fase avançada de negociações. 

As tratativas para que a Odebrecht chegue a um termo com o governo, no entanto, estão suspensas, à espera do fim das investigações e das colaborações de executivos com a Lava Jato. “Estamos aguardando. Aliás, não somos só nós que estamos aguardando a Odebrecht”, afirmou Torquato. Por ora, a empresa já pactuou um acordo de leniência de R$ 6,7 bilhões, mas ele é exclusivo com o Ministério Público Federal (MPF) e órgãos de controle suíços e americanos. 

A portaria assinada nesta quinta é procedimental. Não altera, e nem poderia, os principais pré-requisitos para os acordos, que estão previstos na Lei Anticorrupção, em vigor desde 2014. Exige-se, por exemplo, o ressarcimento integral do dano ao erário. O governo, contudo, dá uma interpretação mais flexível que o MPF num dos pontos mais polêmicos da legislação. 

Num dos artigos, a lei diz que o acordo só será celebrado se a pessoa jurídica for “a primeira a se manifestar sobre seu interesse em cooperar para a apuração do ato ilícito”. Isso significa que duas empresas não podem receber os benefícios da lei, como redução do valor de multas, caso delatem os mesmos fatos. Os procuradores da Lava Jato costumam não aceitar uma nova colaboração se ela trata, por exemplo, de um esquema de corrupção já revelado, relativo a um mesmo contrato. Para o Ministério da Transparência, isso é admissível se surgirem, por exemplo, nomes de novos envolvidos nas ilegalidades ou outras nuances desconhecidas. “Você tem que vincular não é à obra”, pontuou Rosário. 

A portaria recém-assinada diz que a companhia proponente tem de ser a primeira a manifestar interesse em cooperar para apuração de ato lesivo “específico”. A palavra específico não consta da Lei Anticorrupção. “A compreensão (da lei, sobre ser só a primeira), na leitura gramatical, está correta. Mas, na prática, na compreensão do sistema, a compreensão é outra”, ressaltou Torquato. 

Do ponto de vista operacional, a principal mudança da portaria é incluir a AGU como integrante das comissões que discutem os acordos com as empresas. Isso significa que o órgão, agora, participará das tratativas desde o início. O objetivo é dar mais celeridade e segurança jurídica aos processos, evitando-se entraves depois que tudo é negociado.

Como a norma é do Executivo, órgãos de outros poderes não são incluídos. Mas a ministra Grace Mendonça explicou que tanto o MPF quanto o Tribunal de Contas da União (TCU) podem participar dos acordos. A corte de contas, inclusive, tem designado auditores para acompanhar os casos em andamento.

O governo sustenta que, com o decreto, servidores vão fiscalizar os “contratos de conduta controlada” assinados com as empresas signatárias dos acordos. Em caso de descumprimento, elas ficarão proibidas de celebrar novos termos por três anos e os benefícios pactuados serão cancelados. Com isso, pagarão as multas previstas em lei integralmente e sem parcelamento, além de valores relativos aos prejuízos causados ao erário e ao enriquecimento ilícito de funcionários. 

Ficam também sujeitas a medidas judiciais mais duras, que podem impor, por exemplo, a dissolução da pessoa jurídica. 

A Lava Jato começou em março de 2014 e até agora o governo não concluiu nenhum acordo. A maioria das empresas investigadas também não foi punida e continua recebendo recursos públicos, apesar dos desvios praticados. O MPF tem criticado setores do governo por suposta inércia na condução dos processos e, em alguns casos, de tentar anistiar os grandes grupos empresariais implicados nas investigações, todos patrocinadores de campanhas políticas.

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