‘Jogo de planilhas’ é comum em todas as obras do Dersa, afirma engenheiro

  • Por Estadão Conteúdo
  • 11/08/2018 10h35
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Eduardo Saraiva/A2IMG Eduardo Saraiva/A2IMG Benedito Trida disse à PF que ‘nunca recebeu vantagem indevida (propina) para praticar, retardar ou deixar de praticar ato de seu ofício e não conhece nenhum caso de pagamento de propina no Dersa’

O engenheiro Benedito Trida, ligado ao Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A), afirmou em depoimento à Polícia Federal, que ‘jogo de planilhas é comum em todas as obras’ da estatal paulista. O ‘jogo de planilhas’ foi citado na denúncia do Ministério Público Federal contra Benedito Trida e outros 13 investigados da Operação Pedra no Caminho por organização criminosa e fraude à licitação nas obras do Rodoanel Norte.

A força-tarefa da Lava Jato, em São Paulo, afirma que o esquema operou fraudes no Rodoanel entre outubro de 2014 até a deflagração da operação, em junho passado. Segundo os investigadores, o superfaturamento de contratos ligados à obra era disfarçado pelo ‘jogo de planilhas’.

Benedito Trida prestou depoimento à PF em 21 de junho, dia em que a Pedra no Caminho foi deflagrada. O executivo disse à PF que ‘nunca recebeu vantagem indevida (propina) para praticar, retardar ou deixar de praticar ato de seu ofício e não conhece nenhum caso de pagamento de propina no Dersa’.

Naquele dia, o engenheiro disse aos investigadores estava na companhia desde 2003 e exercia ‘a função de engenheiro fiscal do contrato 4.349/13, referente ao Lote 2 do Rodoanel – trecho Norte, desde o ano de 2013’. Na prática, segundo o engenheiro, ele permanecia na obra, ‘fiscalizando a qualidade do serviço e apurando, mediante medições mensais, a quantidade do serviço’.

“Está acumulando a função de fiscal de obra do lote 3 também, desde final do ano de 2017; que acredita que já tenham existido cerca de treze termos aditivos implementados no contrato da OAS S/A, no âmbito do Rodoanel – Trecho Norte, Lote 2; que desses treze aditivos, cerca de nove foram referente a alteração de preço ou inclusão de novos serviços”, afirmou.

À PF, Benedito Trida confirmou ‘o fato de que, por ocasião do 1° e 3° Termo Aditivos ao contrato do Lote 2 da OAS das obras do Rodoanel – Trecho Norte, ocorreu redução de quantitativos de outros serviços, para compensar os acréscimos efetuados nos Termos Aditivo’. O engenheiro citou um ex-gestor do empreendimento Pedro Paulo Dantas Amaral.

“Esse jogo de planilhas é comum em todas as obras do Dersa e seguiu orientação da gerência, sr. Pedro Paulo”, declarou.

“A ideia era alterar o quantitativo de alguns itens, para permitir o pagamento maior previsto no aditivo para outros itens, de forma que a soma total dos gastos permanecesse o mesmo, para evitar o “estouro financeiro”; que posteriormente, quando for autorizado um financeiro maior, providencia-se a elevação, novamente, dos itens reduzidos; que confirma não ser possível a conclusão da obra com a redução de quantitativos operada nesses aditivos 1 e 3.”

De acordo com o engenheiro, ’em algum momento seria necessário recompor o que foi reduzido’. Trida confirmou ‘ter determinado essa alteração de quantitativos de serviços da planilha orçamentária do Lote 02, para evitar o estouro financeiro’.

Trida apontou o nome do técnico que ‘efetivamente lançou essas alterações no sistema’. Disse ainda que o técnico o fez ’em obediência a uma ordem’ sua.

“Não recebeu solicitação ou determinação de superiores do Dersa S/A para efetuar essa adequação de quantidades da planilha orçamentária, de modo a resultar em impactos nulos do 1° e do 3° TAM do Lote 02. Porém, essas alterações eram de conhecimento de Pedro Paulo, chefe do declarante; que o declarante não agiria assim sem a aprovação de Pedro Paulo”, declarou.

Segundo a acusação do Ministério Público Federal, um aditivo ligado ao contrato do Lote 2 previa a inclusão de serviços de remoção de matacões (rochas) a céu aberto e acabou estendido para os lotes 1, 3, 4 e 5 da obra. A Lava Jato afirma que os aditivos se baseavam na ‘presença inesperada’ de matacões que precisavam ser removidos. Os procuradores relataram que, desde o projeto básico do Rodoanel, já se sabia que o trecho norte passaria pela rochosa Serra da Cantareira e que tal questão geológica era prevista. A remoção dos matacões, portanto, seria um custo que compunha os preços previstos para cada lote.

No depoimento, Benedito Trida foi questionado sobre o aditivo ‘que acrescentou novos serviços relacionados à existência de matacões’. O engenheiro confirmou que encaminhou a solicitação da OAS ao gestor do contrato ‘sem tecer análise técnica sobre a plausibilidade do pedido, pois não cabe ao fiscal da obra opinar, mediante parecer técnico, sobre esse assunto’.

“Confirma ter feito uma observação, no sentido de que o serviço necessário não estava contemplado na planilha contratual para execução de remoção com ocorrência de blocos de rocha nas

frentes dos serviços de terraplanagem; que no entender do declarante, o quantitativo de rochas encontrado no local de execução da obra era em muito superior à quantidade prevista no contrato inicial e, de fato, demandava um gasto muito grande, não previsto inicialmente”, afirmou.

“O mesmo ocorreu quanto à composição de preços na qual houve o surgimento de matacões no emboque do túnel; que não recebeu solicitação ou determinação de superiores hierárquicos do Dersa S/A para propor a inclusão de referidas composições de preço.”

O engenheiro disse à PF que ‘tomou conhecimento que, posteriormente, houve um parecer do Instituto de Pesquisas Tecnológicas – IPT, concluindo que a presença de matacões naquele ambiente geológico era perfeitamente previsível’.

“Contudo, ao ler o parece do IPT, verificou que na área analisada por eles não havia a grande quantidade de matacões encontrada nas áreas em que o declarante acompanhou a obra; que indagado sobre o motivo de, mesmo após os resultados desse relatório do IPT, o Dersa ter continuado realizando pagamentos pelos serviços de pregagens e enfilagens na ocorrência de matacões, respondeu que os pagamento continuaram até o limite do que já havia sido incluído anteriormente na planilha da obra. Depois disso, não houve mais pagamentos”, declarou.

COM A PALAVRA, A DERSA

“A DERSA – Desenvolvimento Rodoviário S/A e o Governo do Estado de São Paulo são os grandes interessados acerca do andamento das investigações. Todas as obras realizadas pela Companhia foram licitadas obedecendo-se à legislação em vigor. Além disso, a obra foi iniciada somente com o projeto básico. Portanto, após a elaboração do projeto executivo, quando as medições são ajustadas, é possível que haja acertos.”

“A DERSA ressalta que se houve conduta ilícita com prejuízo aos cofres públicos, o Estado irá cobrar as devidas responsabilidades, como já agiu em outras ocasiões. A Companhia reforça seu compromisso com a transparência e se mantém, como sempre o faz, à disposição dos órgãos de controle para colaborar com o avanço das investigações.”

COM A PALAVRA, PEDRO PAULO DANTAS DO AMARAL

A reportagem tentou contato com a defesa. O espaço está aberto para manifestação.

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