Mulher de Eduardo Cunha vira ré na Lava Jato por lavagem de dinheiro
A jornalista Claudia Cruz, mulher do deputado afastado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), se tornou ré na Operação Lava Jato. A denúncia foi aceita pelo juiz federal Sérgio Moro.
Cláudia Cruz se torna ré por lavagem de dinheiro de mais de US$ 1 milhão provenientes de crimes praticados por Eduardo Cunha.
A denúncia foi proposta, nesta semana, pela Força Tarefa da Lava Jato e se tornou pública, nesta quinta-feira (9), com seu recebimento. Além da esposa do deputado afastado, outras três pessoas são acusadas.
Investigações apontaram que a jornalista tinha plena consciência dos crimes que praticava e é a única controladora da conta em nome da offshore Köpek, na Suíça, por meio da qual pagou despesas de cartão de crédito no exterior em montante superior a US$ 1 milhão num prazo de sete anos (2008 a 2014), valor totalmente incompatível com os salários e o patrimônio lícito de seu marido. Quase a totalidade ds verba depositada na Köpek (99,7%) teve origem nas contas Triumph-SP (US$ 1.050.000,00), Netherton (US$ 165 mil) e Orion SP (US$ 60 mil), todas pertencentes a Eduardo Cunha.
As contas do parlamentar escondidas no exterior eram utilizadas para, em segredo e a fim de garantir sua impunidade, receber e movimentar propinas, produtos de crimes contra a administração pública praticados pelo político. Por meio da mesma conta, a acusada também se favoreceu de parte de valores de uma propina de cerca de US$ 1,5 milhão que seu marido recebeu para “viabilizar” a aquisição, pela Petrobras, de 50% do bloco 4 de um campo de exploração de petróleo na costa do Benin, na África ocidental, em 2011.
Os recursos que aportaram na conta de Cláudia Cruz foram utilizados, por exemplo, para pagar compras de luxo feitas com cartões de crédito no exterior. Parte dos gastos dos cartões, que totalizaram US$ 854.387,31, foram utilizados, dentre outras coisas, para aquisição de artigos de grife como bolsas, sapatos e roupas femininas. Outra parte dos recursos foi destinada para despesas pessoais diversas da família de Cunha, entre elas o pagamento de instituições educacionais responsáveis pelos estudos dos filhos do deputado afastado, como a Malvern College (Inglaterra) e a IMG Academies LLP (Estados Unidos).
Cláudia ainda manteve depósitos não declarados às repartições federais na offshore em montante superior a US$ 100 mil entre os anos de 2009 e 2014, o que constitui crime contra o sistema financeiro nacional.
Mais denunciados
Também são acusados na denúncia Jorge Luiz Zelada, ex-diretor da Área Internacional da estatal petrolífera, pelo crime de corrupção passiva, João Augusto Rezende Henriques, operador que representava os interesses do PMDB no esquema, por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, e Idalecio Oliveira, empresário português proprietário da CBH (Companie Beninoise des Hydrocarbures Sarl), pelos crimes de corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
Procuradores comprovaram, a partir de documentos enviados pelo Ministério Público da Suíça ao Brasil, informações obtidas por meio das quebras de sigilo bancário e fiscal e depoimentos de colaborações premiadas, o pagamento de propina atingindo a cifra dos US$ 10 milhões (cerca de R$ 36 milhões) para que a aquisição do campo de petróleo na África fosse concretizada. O negócio foi fechado em US$ 34,5 milhões, o que significa que quase um terço do valor total foi destinado a pagamento de vantagem indevida.
Entre os beneficiários do repasse estão o próprio Cunha, que tinha participação direta na indicação e manutenção de cargos na Diretoria Internacional da estatal, atuoando de modo consistente para que o trâmite fosse fechado. Para que o pagamento fosse efetuado sem deixar lastros, foi estruturado um esquema para que a propina passasse por diversas contas em nome de “laranjas” (empresas offshores sediadas em paraísos fiscais) antes de chegar nos destinatários finais e de ser convertido em bens.
Caminho
O caminho do dinheiro começa no pagamento da Petrobras à petroleira CBH, que controlava o campo de petróleo de Benin. Em 3 de maio de 2011, a estatal brasileira transferiu US$ 34,5 milhões (R$ 138.345.000,00) para a empresa e, na mesma data, houve a transferência de US$ 31 milhões da CBH para Lusitania Petroleum, uma holding de propriedade de Idalecio de Oliveira que abrange, entre outras empresas, a própria CBH.
No dia 5 do mesmo mês, a Lusitania depositou, em favor da offshore Acona, de propriedade de João Augusto Rezende Henriques, operador do PMDB no esquema da Petrobras, US$ 10 milhões, que já haviam sido combinados como pagamento de vantagem indevida. Da offshore Acona, 1.311.700,00 de francos suíços foi depositado na conta Orion SP, de propriedade de Cunha, por meio de cinco transferências bancárias, entre os dias 30 de maio e 23 de junho de 2011.
Para dar continuidade ao estratagema criminoso e dificultar a identificação dos recursos ilícitos por parte das autoridades, em 11 de abril de 2014, a offshore Orion SP repassou para a conta Netherton, cujo beneficiário final também era o peemedebista, 970 261,34 mil francos suíços e 22.608,37 (euros). Na sequência, em agosto do mesmo ano, houve a transferência de US$ 165 mil da conta Netherton para a offshore Köpek, em nome de Cláudia Cruz.
A conta Köpek, que, desde 2008, já era abastecida por recursos de vantagens indevidas provenientes de outras contas secretas titularizadas por Cunha, realizou pagamentos das faturas de cartão de crédito da American Express, entre 2008 e 2012, e da Corner Card, entre 2012 e 2015. Todos os pagamentos são objeto da peça de acusação.
Segundo as investigações, o restante do valor pago pela CBH para fechar as negociações com a Petrobras (algo em torno de US$ 8,5 milhões) e que foi depositado na conta Acona, de João Augusto Rezende Henriques, foi distribuído para diversas outras offshores cujos beneficiários ainda não foram identificados, havendo suspeitas de que outros agentes públicos receberam quantias nessa operação.
Corrupção sistêmica
Os procuradores da Força Tarefa ressaltam que “as provas que embasaram as acusações indicam a existência de um quadro de corrupção sistêmica encravado em praticamente todos os contratos da Diretoria Internacional da estatal, sendo que o pagamento de cifras era a verdadeira “regra do jogo”. A corrupção foi a um nível em que as provas indicam que um terço do valor do negócio foi reservado para pagar propinas. Isso mostra a necessidade de uma resposta institucional com reformas e, dentre as quais, a política, além de as 10 medidas contra a corrupção”.
Para a Força Tarefa, “as provas mostram que os denunciados desviaram dinheiro dos cofres da companhia petrolífera, os quais têm sido objeto de aportes feitos a partir dos cofres da União. Em última análise, há evidências de que Eduardo Cunha e Cláudia Cruz se beneficiaram de recursos públicos que foram convertidos em bolsas de luxo, sapatos de grife e outros bens de uso privado.”
Os procuradores ainda acreditam que as instituições devem dar uma resposta, cada uma em sua esfera de ação, para os graves fatos noticiados, pois o poder e a confiança depositados pelo povo e pelo Congresso sobre Eduardo Cunha foram por ele desviados de sua finalidade pública para enriquecimento privado. Em virtude da cisão do caso e da necessidade de analisar as provas dos crimes antecedentes praticados pelo parlamentar, a fim de que fosse possível formular juízo de acusação sobre Cláudia Cruz, foi possível afirmar, na denúncia, que há fortes provas de corrupção e lavagem por meio de contas no exterior cujos verdadeiros proprietários eram, segundo evidências muito consistentes, Eduardo Cunha e Cláudia Cruz.
No texto, a força-tarefa da Lava Jato ainda pede nova prisão preventiva de João Augusto Rezende Henriques e a fixação do montante mínimo para reparação dos danos causados em US$ 10 milhões (R$ 36 milhões). As apurações prosseguirão em relação a Daniele Ditz, filha de Eduardo Cunha, e a outros investigados, Jorge Reggiardo e Luis Pittaluga, que atuaram como operadores para abertura da conta Netherton.
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