Novo presidente da Câmara, Cunha prega “independência” em relação a Dilma, mas “sem confrontos, em harmonia”

  • Por Jovem Pan
  • 03/02/2015 11h53

Parlamentares comemoram eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) - centro - como presidente da Câmara dos Deputados Federais

Pedro Ladeira/Folhapress Parlamentares comemoram eleição de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como presidente da Câmara dos Deputados Federais

Duas posturas que nem sempre combinam policamente, “independência” e “harmonia”, estão na mesma frase da proposta que o novo presidente da Câmara dos Deputados Federais, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), sugere para os dois anos que terá à frente da casa legislativa, em entrevista exclusiva à Jovem Pan nesta terça-feira. Cunha afirma que “não será oposição, nem submisso” aos interesses do governo Dilma.

“Nós vamos fazer do exercício da presidência da Câmara a afirmação da independência do Poder Legislativo sem confrontos, em harmonia. Porque não adianta falar que não vai haver harmonia. O confronto diário também não interessa ao país. A instabilidade política também não interessa ao País”, avalia o deputado que pautará os projetos da Câmara. “Nós vamos ter uma atitude cotidiana de independência, o que não vai significar que o governo, com suas propostas, com suas medidas, necessárias para sua governabilidade, não vai ter o direito de exercer sua maioria para exercitar sua governabilidade”, prevê.

Cunha considera seu comportamento “previsível”: “não haverá da minha parte nenhum ato de submissão”. Porém aposta em uma relação cordial com o Planalto: “Sou uma pessoa educada, gentil por natureza; jamais partirei a qualquer tipo de agressão e espero também dos meus interlocutores o respeito”, disse. “Isso não quer dizer que a gente vá sucumbir, que a gente vá ser submisso.”

Oposição dentro da situação

Questionado pela jornalista Rachel Sheherazade sobre sua atuação parlamentar nos últimos meses (quando ainda não era presidente da Câmara), em desacordo com algumas propostas do governo apesar de seu partido, o PMDB, formar a base de apoio de Dilma, Cunha não vê contradição. O deputado foi contra propostas de regulação da mídia e de criação de conselhos populares para auxiliar o governo, pautas caras ao Planalto, mas se diz a favor da criação de uma nova CPMI para apurar os desvios na Petrobras, sendo que em 2014 o governo tentou derrubar a comissão parlamentar mista.

“Isso não quer dizer que você seja contra o governo, ou que você seja oposição. Isso são temas de naturezas políticas, ideológicas, programáticas ou partidárias que não têm a ver com a governabilidade. Você ser contra o aumento de tributos, você ser a favor da investigação plena, você ser contrário à proposta de regulação de mídia, que é a proposta de conteúdo programático de um partido, isso não significa que você seja oposição aos princípios e à governabilidade que pode ser feita através de matérias importantes. Como sempre, quando foi importante, o meu partido e eu, como líder, caminhei dessa forma favorável ao governo”, argumentou o político.

“Sustento, sim, sou contra qualquer tipo de regulação de mídia, seja ela de natureza econômica, seja ela de conteúdo; serei um adversário frontal de qualquer proposta dessa natureza”, reforçou Cunha.

“Sou favorável, sim, à instauração de uma CPMI (da Petrobras); eu acho que a CPMI foi, de uma certa forma, interrompida pelas delações de cujo conteúdos não se tinha conhecimento”, avaliou.

Projetos prioritários

O novo presidente da Câmara avalia a reforma política e o pacto federativo (que, segundo ele, impulsionará a reforma tributária) como os dois principais e mais urgentes projetos do legislativo atualmente.

Como as próximas eleições são em 2016, “qualquer mudança na legislação eleitoral tem que ser apreciada até 30 de setembro deste ano, depois de Câmara, Senado e o Poder Executivo sancionarem as disposições que nós votarmos”, explica. “Então tem que ser urgente o início dessa apreciação”, estimula.

Sobre as mudanças na arrecadação de impostos, Cunha entende que “mais importante do que a reforma tributária, é a discussão do pacto federativo em geral”, que seria “muito mais amplo, muito mais complexo”, envolvendo a distribuição de obrigações e as relações entre os entes federados (estados e municípios). “Isso precisa ser debatido com muita seneridade, mas também com muita celeridade”, cobrou.

Petrolão

Questionado se atuará para a perda de mandatos de parlamentares cujos nomes estiverem envolvidos no escândalo da Petrobras investigado pela Operação Lava Jato (o inquérito deve ser entregue ao STF ainda em fevereiro), Cunha avalia que “não cabe ao presidente da Câmara atuar” e argumenta que “para haver qualquer tipo de consequência (para políticos envolvidos), deverá haver inicialmente uma representação partidária”.

Ele explica que possíveis processos de cassação devem passar pelo Conselho de Etica, que designa um relator, verifica se o pedido é admissível, abre-se então o espaço para o contraditório, até que se chega a um parecer. “O que o regimento prevê é o que nós vamos cumprir”, garantiu.

Impeachment

Caso o nome da presidente da República Dilma Rousseff apareça entre os envolvidos na Operação Lava Jato (Dilma foi presidente do Conselho Administrativo da Petrobras de 2003 a 2010), Cunha não acredita que ela perderia o cargo para o qual foi reeleita ano passado. “Não acho que é cabível qualquer tipo de solicitação de impeachment”, afirmou.

“Mesmo que porventura seja qualquer tipo de situações que tenham ocorrido, ela se deu no mandato anterior (sic). Esse mandato terminou em 31 de dezembro do ano passado. Nós estamos em um novo mandato desde 1º de janeiro. E ninguém pode ser punido em um mandato atual por ato que foi contraído ou supostamente feito em um mandato anterior”, acrescentou.

Nesse caso hipotético, Cunha acredita em soluções alternativas legais ao impeachment, mas não cita quais. “A legislação, a constituição tem previsões de punições ou de apreciação que independem do processo político do pedido de cassação”, disse. “Essa história vira quase uma forçada de barra para poder se discutir todo dia esse tema, e eu não entendo que é o tema que deve ser colocado na pauta do parlamento”

Impostos

“Eu não vejo no parlamento muita facilidade para o aumento de carga tributária”, disse Cunha. O governo estabeleceu no começo o ano um pacote de aumento de impostos para melhorar a arrecadação do governo. Cunha defende o equilíbrio financeiro, mas entende que as taxas cobradas atualmente já são altas demais.

O presidente da Câmara entende que “o governo pode convencer sua maioria (a aumentar impostos)”, mas considera que “aumento de tributos é muito difícil de ter guarita no parlamento de hoje”.

Nem aqui, nem ali

Eduardo Cunha comentou ainda uma resposta que deu em entrevista à Folha de S. Paulo na a repórter questionou: “Você é um inimigo íntimo de Dilma”, ao qual ele respondeu: “Por que íntimo? (risos). “Eu não sou nem inimigo e nem íntimo”, explicou-se. “Foi quase que cuma brincadeira de final de entrevista e não um fato político.”

Pressões na eleição

Sobre as interferências de ministros de Dilma que tentaram alavancar a candidatura do petista Arlindo Chinaglia para a presidência da Câmara, o vencedor da disputa reclama: “Eu recebia vários relatos de pressões vindas principalmente por meio do ministro Pepe Vargas (Relações Institucionais), que pressionou parlamentares e ministros”.

Cunha questiona se essa era uma ação isolada do ministro ou se era ordem direta do Executivo. “Essas ações acabaram se revertendo a favor da minha própria candidatura, uma vez que o Parlamento não quer esse tipo de interferência”, comemorou. “A proposta que venceu é justamente aquela da Casa”, em contraposição a candidaturas do governo e da oposição que se levantaram, disse.

Temer e os novos partidos

Cunha disse ainda aprovar a iniciativa que será encabeçada pelo PMDB, pelo seu presidente Michel Temer (que também é vice-presidente da República), de entrar na justiça contra a criação de novos partidso por interesses que o deputado considera fraudulentos, como “criar partidos fictícios prevendo a fusão na sequência”.

Ele também questiona “a forma como os partidos são criados, com assinaturas colhidas nas ruas, sem identificar se são ou não eleitores”.

“Não é compatível defender reforma política e, ao mesmo tempo, aceitar com passividade a criação de partidos fictícios”, alegou. “É preciso que a gente enfrente esse problema, sim, e eu acho que o Michel está certo”.

Se surgirem mais partidos, como o PL que o ministro das Cidades Gilberto Kassab pretende criar, as maiores siglas serão prejudicadas. “Nós não temos dúvidas de que o alvo não é só o PMDB, são todos os partidos que têm parlamentares e estarão suscetíveis à cooptação”.

Ouça a entrevista completa de Eduardo Cunha no áudio do começo do texto.

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