Ainda há muitos crimes em andamento e Lava Jato não tem previsão de fim, diz procurador
A Operação Lava Jato começou em 17 de março de 2014 e há quatro anos tem sacudido o País. Se depender, porém, da força-tarefa do Ministério Público Federal em Curitiba, onde tudo começou, a Lava Jato não deve terminar tão cedo.
Em entrevista exclusiva à Jovem Pan, o procurador Roberson Pozzobon garantiu que as trilhas a serem percorridas pela megaoperação ainda são “variadas, diversas e longas”.
“É comum que haja uma curiosidade sobre quando as operações da Lava Jato chegariam ao fim, mas essa é uma resposta que ainda não podemos dar, haja vista o grande volume de informações ainda sendo processadas, de linhas investigativas novas. Existem ainda muitos fatos criminosos relevantes a serem investigados”, disse Pozzobon.
O procurador assegura também que o fato de 2018 ser um ano eleitoral não vai fazer as investigações recuarem.
Pelo contrário, Pozzobon espera que, com o financiamento empresarial proibido e doleiros e operadores de propina preso, a disputa nas urnas neste ano seja “interessante” para as apurações.
“Sabemos que os desvios ainda não cessaram. Existe uma série de fatos criminosos ainda em andamento e provavelmente uma parte desses venha a tangenciar eleições”, declarou o procurador. “Mas é algo que não afeta o trabalho da Operação Lava Jato. A Operação Lava Jato continua. Ainda há muito o que se fazer. Há diversas trilhas investigativas a se percorrer, conclusões a serem formadas e ações a serem julgadas”, afirmou.
Novas “Lavas Jatos”
O procurador Roberson Pozzobon é otimista e acredita que a Lava Jato conseguiu mudar a cultura de combate à corrupção no Brasil. Ele projeta que novas forças-tarefas serão instauradas para combater o desvio de dinheiro público em todo o País.
“A estrutura que permitiu que a Lava Jato se desenvolvesse em Curitiba é hoje replicada em diversos outros Estados, não apenas no âmbito do MPF e Justiça Federal como nos âmbitos dos Ministério Públicos Estaduais e justiças estaduais”, garante Pozzobon, destacando este como um “efeito colateral positivo” da operação em quatro anos.
“Se havia uma crença na impunidade desses agentes poderosos e grandes crimes de corrupção praticados por empresas que possuem orçamento muitas vezes maiores que muitos países, essa crença da impunidade hoje já não existe mais”, disse. “Vejo como uma possibilidade, sim, em caso de distribuições de casos relevantes, que novas estruturas como a da Lava Jato em Curitiba, no Rio de Janeiro, em Brasília possam ser firmadas e estruturadas por todo o país”, avaliou Pozzobon.
Ele cita como argumento as “centenas de fatos criminosos” revelados pela delação da Odebrecht e que foram distribuídas “no País todo” e “estão ganhando corpo”.
O Jornal da Manhã desta sexta (16) também conversou com Pozzobon, que reiterou que, enquanto tiver material para ser analisado, as investigações prosseguem.
“Há algumas semanas solicitei à Polícia Federal cópia de material eletrônico apreendido em uma das fases e o delegado disse que iria fornecer, mas precisaria de 37 HDs (hard drive) de 1 terabyte pra fazer as cópias. O universo de informações é muito grande”, ilustrou
Ele também apontou a ameaça do fim da permissão da prisão após condenação em segunda instância como uma das principais ameaças à Operação:
“Teorias conspiratórias” de Lula
Apenas em Curitiba, a Lava Jato já prendeu vários empresários e sete ex-parlamentares, como o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha. No Rio, o grande nome que o braço da operação alcançou foi o do ex-governador Sérgio Cabral. Mas sem dúvida o maior “trunfo” da Lava Jato foi a condenação em duas instâncias do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a partir de propina no caso do tríplex do Guarujá.
Pozzobon, que assina a denúncia que ensejou a condenação do petista, garante que não houve tratamento especial para Lula
“O ex-presidente Lula, assim como todos os demais réus, ele responde num processo, na verdade no caso dele a diversas ações penais e a nossa atuação no caso dele e de diversos réus da Lava Jato é a mesma”, disse.
O procurador também rebateu a acusação feita nesta semana pelo ex-presidente Lula, de que os membros da operação agiriam “a mando de interesses estrangeiros”.
“No que diz respeito a teorias conspiratórias, a gente já viu diversos réus querendo justificar, muitas vezes, delitos que cometeram buscando arranjar motivos manifestamente inverossímeis”, retrucou o procurador de Curitiba.
“O Ministério Público não denuncia qualquer pessoa, denuncia apenas quando tem fundadas provas da materialidade e da autoria do crime. Então, teorias conspiratórias de perseguição, teorias como essa não passam de fantasia”, classificou Pozzobon.
Foro e condução coercitiva
O procurador também comentou duas questões jurídicas atuais que podem afetar o futuro da Lava Jato.
Pozzobon é otimista e comemora o fato de o Supremo Tribunal Federal ter formado maioria para restringir o foro privilegiado apenas para crimes praticados no exercício do mandato, embora o caso esteja paralisado por vista do ministro Dias Toffoli.
“É impossível que o Supremo, com seus 11 ministros e toda a pauta que lhe são inerente, de pacificar o entendimento do Brasil todo em questões constitucionais, possa instruir, processar e julgar centenas de ações penais contra as centenas de agentes políticos que têm foro privilegiado. É algo que não funciona”, disse.
Pozzebon avalia também que a proibição vigente de se realizarem conduções coercitivas, imposta pelo ministro Gilmar Mendes, é mais prejudicial aos réus do que à operação Lava Jato em si.
“A condução coercitiva é uma medida menos gravosa para os próprios réus. Na maioria dos casos em que solicitamos que fosse deferida pelo juiz a condução coercitiva do investigado, seria cabível a prisão temporária do investigado”, explicou.
“A (proibição da) condução coercitiva não prejudica a Operação Lava Jato. Ela na verdade prejudica mais os réus, que foram cerceados de terem uma medida menos gravosa”, disse Pozzobon.
Ouça a entrevista completa com o procurador Roberson Henrique Pozzobon:
Números
A Jovem Pan somou os dados oficiais dos diferentes locais de atuação da Lava Jato e compilou números gerais obtidos pela maior operação de combate à corrupção até agora.
Somando os dados do Paraná, Rio de Janeiro e Supremo Tribunal Federal (STF), foram até agora decretadas 219 condenações com penas que somam de 2296 anos de prisão.
Foram apresentadas 139 denúncias envolvendo mais de 500 e ao menos 12 crimes: fraude em licitação, corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa, evasão de divisas, cartel, embaraço à Justiça, crime contra o sistema financeiro, tráfico de influência, tráfico internacional de drogas, entre outros.
A Lava Jato emitiu 103 mandados de prisões preventivas, 118 de prisões temporárias, 395 pedidos de cooperação internacional e foram celebrados 163 acordos de colaboração (delação premiada) com pessoas físicas. As multas compensatórias gerados pelos acordos somam quase R$ 12 bilhões, dentro dos cerca de R$ 40 bilhões de ressarcimento de danos solicitados pela Operação.
Veja, por instância de atuação, os números obtidos pela Operação até agora:
PARANÁ
RIO
STF
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