Para advogados, veto a sátiras protege “quem já está no poder”

  • Por Estadão Conteúdo
  • 22/06/2018 13h09
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Ana Volpe/Senado Ana Volpe/Senado O consenso entre os integrantes da Corte é de que a lei, que restringe a atividade humorística nos três meses que antecedem as eleições, fere a liberdade de expressão e o direito à informação

A decisão do STF que derrubou, por unanimidade, trechos da reforma eleitoral de 2009 que impediam as emissoras de rádio e de TV de fazer trucagem, montagem ou sátiras durante o período eleitoral, foi acertada, na avaliação de advogados e especialistas em Direito eleitoral. Para eles, o veto a sátiras protege “quem já está no poder”.

“A decisão do STF foi correta. Afinal, a Constituição protege a liberdade de expressão e a manifestação artística. A proibição, por meio da lei eleitoral, era uma clara tentativa de afrontar a Constituição. E também uma tentativa de proteger quem já está no poder. A sátira faz parte do jogo democrático”, avaliou o advogado Daniel Falcão, professor do IDP e da USP, especialista em direito eleitoral e constitucional.

O julgamento de mérito da questão foi iniciado na quarta-feira, 20, quando cinco ministros do Supremo se manifestaram pela inconstitucionalidade dos dispositivos questionados pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert). Nesta quinta-feira, 21, votaram os ministros Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Cármen Lúcia.

O consenso entre os integrantes da Corte é de que a lei, que restringe a atividade humorística nos três meses que antecedem as eleições, fere a liberdade de expressão e o direito à informação. Presidente da Suprema Corte, Cármen Lúcia formou o 11º e último voto para derrubar os dispositivos.

Para a ministra, o que se pretendeu na lei foi impedir, a possibilidade de questionamentos ou contestações por meio do humor. “Aprendi que liberdade é expressão, o que não se pode expressar é carente de liberdade. Censura é a mordaça da liberdade, quem gosta de censura é ditador”, disse a ministra. “A crítica ácida mantém-nos alertas para as possibilidades de aperfeiçoamento”, continuou.

Em seu voto, o ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a liberdade de expressão deve ter posição preferencial, porque o Brasil tem em seu passado “uma história de desrespeito à liberdade de expressão” e porque a livre circulação de ideias, informações e opiniões é “pressuposto para o exercício de muitos outros direitos fundamentais”.

“A liberdade de expressão é um pressuposto da democracia, não é garantia de verdade, não é garantia de justiça. E também concordo com ministro Alexandre de Moraes: quem se dispõe a vir para espaço público tem que aceitar com uma certa resignação a crítica construtiva, destrutiva, bem informada, desinformada de democracia, de quem tem interesses bem afetados”, observou Barroso – que será vice-presidente do TSE durante as eleições deste ano.

Para o criminalista Daniel Gerber, professor de Direito Penal e Processual Penal, “é realmente incrível que em um país com sérios problemas estruturais, liberdade de expressão e com alegado excesso de trabalho por parte da Suprema Corte, argumento que até mesmo execução penal em segunda instância acabou por legitimar, esse tema seja objeto de debate”.

Marcellus Ferreira Pinto, do Nelson Wilians e Advogados Associados, especialista em direito eleitoral, considera que a decisão do Supremo “foi acertada”. “Os trechos declarados inconstitucionais já estavam suspensos desde agosto de 2010, ou seja, está consolidada no campo eleitoral a plena liberdade de expressão. É importante lembrar que a lei prevê as hipóteses nas quais é cabível o direito de resposta, ou seja, eventuais abusos poderão ser prontamente corrigidos.”

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