PEC do teto de gastos é radical demais e teria outras alternativas; saiba quais

  • Por Marina Ogawa/Jovem Pan
  • 04/11/2016 11h18
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Marcos Santos/USP Imagens Marcos Santos/USP Imagens O índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é calculado pelo IBGE para medir a inflação oficial do Brasil

Muito tem se falado (e criticado) a respeito da PEC que limita os gastos públicos do Governo Federal pelo período de 20 anos. O Núcleo de Estudos e Pesquisas da Consultoria Legislativa do Senado Federal chegou a divulgar um estudo que diz que a PEC que limita os gastos públicos – a antiga PEC 241, nova PEC 55 – é inconstitucional

Até o momento, o Governo não se pronunciou a respeito do estudo e parece determinado a seguir com a proposta no Senado. Então a pergunta que não quer calar é: existiria outra alternativa? A resposta é sim, um Plano Plurianual. É isso que defendem os especialistas ouvidos pela reportagem. De quatro em quatro anos, o Governo eleito estabeleceria no PPA diretrizes e metas para as contas públicas. 

Segundo o pesquisador do Ipea e pesquisador associado do Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (IPC-IG, na sigla em inglês), Rodrigo Orair, a institucionalidade atual permite a regra de controle de despesas sem passar por uma emenda constitucional.

Mas por que implicamos tanto com a duração da PEC? Imagine que as contas fiquem “no azul” em sete anos, por exemplo. Para que a emenda seja revogada, ela deveria passar por novas votações no Congresso (exatamente como as que ocorrem agora), já que a PEC demanda uma vigência de 20 anos com possibilidade de revisão no 10º ano. Ou seja, de simples uma emenda constitucional não tem nada.

Com ela sendo uma regra no PPA, por exemplo, isso não precisaria ocorrer. Mas vale ressaltar: não pode virar bagunça.

Caso fosse parte do PPA, o teto de gastos deveria ter regras para dar certo, como destaca o coordenador-executivo do Fórum de Economia da FGV/EESP, Nelson Marconi. “Eu acho que poderia ter uma regra que dissesse que os gastos evoluem não de acordo com a inflação, mas com o PIB. Ou, quando chegar no limite você colocar regras que diriam os cortes a serem feitos. Regras do que acontece quando estoura o teto”, exemplifica.

Para Marconi, no PPA o Governo poderia prever qual seria a evolução das despesas: “o teto, da forma como é colocado, é muito rígido”. 

“Pode ser uma regra de despesa menos radical. Por que 10 anos? Por que uma taxa de crescimento real zero das despesas?”, questiona Rodrigo Orair. Um sistema semelhante ao do PPA existe em países desenvolvidos como França e Finlândia, segundo ele.

Mas existem outras alternativas? A resposta é, novamente, sim. O problema é que o Governo está determinado a conseguir a aprovação do texto no Senado da forma em que foi apresentado. Resumindo: um teto dos gastos públicos por 20 anos, com revisão no 10º ano de forma estável em termos reais apenas com a correção da inflação do ano anterior.

Mas vamos para as alternativas:

1. Carga tributária e taxação aos mais ricos

Um aumento de carga tributária mudaria a estrutura legislativa de impostos, taxas e outras contribuições vigentes no País. Com ela, o modo de tributação seria mais “equilibrado”, ou seja, quem tem mais dinheiro é mais taxado. 

A tributação dos lucros e dividendos, das grandes fortunas e de heranças também podem ser alternativas à PEC 241.  

Segundo o pesquisador do Ipea, reformar o imposto de renda e revisar o conjunto de desonerações com o intuito de ampliar a tributação sobre os mais ricos seria uma alternativa a ser colocada em discussão. “Seria uma boa alternativa uma reforma tributária sobre os mais ricos. Hoje a gente tributa demais os bens e serviços e tributa pouco a renda dos mais ricos. Ideal seria uma reforma tributária que mudasse isso”, diz Orair.

Já para o coordenador-executivo do Fórum de Economia da FGV/EESP, Nelson Marconi, a arrecadação obtida com os impostos sobre grandes fortunas “nem é tão grande”. 

“Se você tributa essa distribuição de dividendos, você taxa a parcela que ganha mais na sociedade e consegue financiar, por exemplo, a aposentadoria rural, que tem um rombo muito grande. Assim você aumenta a receita e chega ao ajuste de contas mais rápido”, explica Marconi. “Se você coloca um teto de gastos e não cria alternativas em termos de aumento de receita tributária, você vai ter que comprimir outras despesas”, completa.

2. Reforma da Previdência

“A lógica está invertida”, diz Nelson Marconi. Atualmente o Governo não economiza esforços para a aprovação da PEC 241, e espera conseguir o mesmo apoio para a reforma da Previdência. Mas, como ressalta o coordenador-executivo da FGV, era preciso reformar a Previdência antes da Proposta de Emenda Constitucional.

“O grande problema das contas vem da Previdência. Se o Governo ataca problemas da Previdência, o retorno até a situação ideal será muito mais rápido. O Governo deveria colocar prazo em quanto tempo ele demora para atingir resultado primário. Uma vez que fica positivo ele elimina essa regra e cria outra no lugar”, sugere Nelson Marconi.

3. Taxa de Crescimento das despesas ser maior que zero

A PEC visa controlar as despesas públicas dando taxa de crescimento real zero. O problema é que temos despesas que crescem mais que o PIB, como as despesas da Previdência. 

Rodrigo Orair então sugere: se a economia crescer 2,5%, por exemplo, que se aumente o equivalente no teto de gastos. O mesmo é defendido por Marconi: que a evolução das despesas seja de acordo com o PIB.

Não é o sonho do brasileiro, mas já é algo menos doloroso do que um crescimento zero contando apenas com a correção da inflação. Atualmente, se somarmos os gastos com Previdência, Saúde e Educação, obtemos cerca de 12% do PIB. “É pouco razoável diminuir isso”, destaca Orair. “A PEC é muito radical. Ela quer reduzir de 6% para zero. Não precisa ser zero”, pondera o pesquisador do Ipea.

E a Saúde e Educação?

O “lado bom” é que o Governo resolveu não mexer nos dois setores no primeiro ano – caso a PEC seja aprovada. Desta forma, Saúde e Educação não têm teto de gastos neste primeiro momento. Mas isso não dura para sempre, afinal, seriam 20 anos de vigência da emenda. E não são apenas as duas áreas que perdem com o teto.

“Vários setores perdem, mas a área mais fácil para o Governo fazer cortes são as despesas livres, que ele pode alterar o valor de acordo com seu desejo”, diz Nelson Marconi.

E é aí que entram as duas pastas mais a área social: “é provavelmente aí que o Governo vai apertar mais”. 

E, com isso, comprova-se o que os críticos da “PEC do Fim do Mundo” tanto criticam: as classes mais baixas podem sofrer mais, já que são elas que utilizam os serviços públicos de saúde, educação e transporte.

Em defesa da PEC

A Proposta de Emenda Constitucional tem, ao menos em sua aparência, a tentativa de conter os gastos do Governo e, com isso, equilibrar as contas públicas. Mas não basta sair cortando gastos em uma pasta e “privilegiando” outras. Ela deve ser muito mais que isso.

A longo prazo, a emenda constitucional conteria o rombo das contas públicas, o que ampliaria a confiança de agentes esconômicos. Com mais confiança, mais investimentos e um maior estímulo à arrecadação. 

No que diz respeito aos recursos destinados a cada setor, há (pelo menos utopicamente) a sabedoria por parte de cada pasta no investimento do dinheiro, o que, de certo modo, reduziria o desperdício em cada setor governamental.

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