Medo de furtos domina São Paulo; especialista diz que situação ‘não reflete quadro geral da segurança’

Segundo Bruno Paes Manso, pesquisador da USP, a cidade possui um dos melhores resultados do país no quesito; número de roubos e furtos cresceram em relação a 2021, mas caíram na comparação com 2020

  • Por Pedro Jordão
  • 08/05/2022 10h00 - Atualizado em 25/05/2022 20h47
Banco de imagens/Pexels Avenida Paulista Movimento intenso de pessoas na Avenida Paulista, no centro de São Paulo, maior cidade do Brasil

Com uma população estimada em mais de 12 milhões de pessoas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cidade de São Paulo, a maior do Brasil, possui diversos problemas que se repetem em outros contextos e regiões do país. A nossa equipe de reportagem dá início com este texto a uma série de matérias para discutir e analisar alguns deles, como o aumento do lixo, o crescimento do número de pessoas em situação de rua, dificuldades na segurança e no trânsito. Após os piores momentos da pandemia da Covid-19 e enfrentando uma grande crise econômica nacional, os moradores da capital paulista se sentem cada vez mais amedrontados pelo aumento da insegurança. Segundo o pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da Universidade de São Paulo (USP) Bruno Paes Manso, a sensação é consequência principalmente da elevação no número de furtos no centro da cidade. Apesar disso, Paes Manso defende que o medo não reflete um quadro geral, no qual a capital paulista estaria bem ranqueada na segurança pública.

O jovem João Pedro Mundim, de 28 anos, afirma ter medo de andar na cidade de São Paulo. Profissional do marketing de influência, ele precisa trabalhar constantemente com o celular em público e conta que teve o aparelho furtado em novembro do ano passado no bairro da Santa Cecília: “Levaram o celular da minha mão em uma via pública. Tenho medo de andar no centro sempre, sozinho ou acompanhado, e mais ainda à noite”, relata. Para ele, a situação do aumento da criminalidade na capital paulista é consequência de várias questões, como o crescente número de moradores de rua. “É perceptível o aumento de pessoas em situação de rua como também o aumento da ocorrência de crimes”, diz.

Além de Mundim, outros moradores da capital paulista também relatam a crescente sensação de insegurança. Entretanto, para o especialista da USP, o contexto geral pode ser considerado alarmista. “A sensação de insegurança vem aumentando principalmente no centro de São Paulo por causa do crescimento do número de furtos de celulares. O centro de São Paulo é um lugar de passagem, onde circulam pessoas de todas as regiões. O que acaba tendo resultados e consequências para um sentimento de toda a cidade. Além disso, diante da crise econômica, houve um grande problema de aumento das populações de rua, que se concentram em alguns lugares como a praça Princesa Isabel, e que acabam fazendo com que a sensação de insegurança também seja, de alguma forma, abalada em decorrência disso”, observa. “É importante lembrar que São Paulo hoje é uma das cidades com bons resultados na área de segurança pública, principalmente nos homicídios. É a capital brasileira proporcionalmente com menos homicídios do Brasil entre as 27 unidades da federação”, completa Paes Manso.

De acordo com os dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), quando comparados os três primeiros meses de 2022 com os de 2021, houve um aumento de quase 10% nos casos de roubo (de mais de 31 mil para quase 35 mil) e de mais de 36% nos furtos (de quase 39 mil para mais de 53 mil) na cidade de São Paulo. Porém, quando os números de furtos e roubos dos três primeiros meses de 2022 são comparados com os dados do mesmo período de 2020, época pré-pandemia da Covid-19, a conclusão sobre o aumento da violência na cidade de São Paulo corrobora a análise do especialista em segurança pública. Na comparação, tem-se objetivamente que houve uma redução de 21,5% dos casos de roubo (de pouco mais de 40 mil para quase 31,5 mil) e de quase 9% dos casos de furto (de mais de 58 mil para pouco mais de 53 mil).

“Há uma forte disputa política em torno do medo, muita gente acaba ganhando com a disseminação do medo, aproveitam certos aspectos mais isolados que causam o medo naturalmente da população, ninguém quer ter o celular furtado, mas a partir desses casos tenta-se dar uma conotação de desordem, como se o caos estivesse imperando”, analisa Paes Manso. “É sempre muito importante ficar atento a discursos alarmistas, que não observam o todo”, declara. Para ele, a alta da criminalidade em 2022 é provocada pelo aumento nas oportunidades para os criminosos agirem diante do retorno de uma maior circulação de pessoas nas ruas, fazendo os números retomarem os patamares de 2020. Ao mesmo tempo, ele diz acreditar que redes de solidariedade e benefícios de renda aprovados pelo Congresso Nacional, como o Auxílio Emergencial, foram responsáveis por uma redução do número de crimes nos primeiros meses de 2021.

Para combater os crimes, Bruno Paes Manso defende que “não tem outro segredo a não ser trabalhar com inteligência”. Segundo o especialista em segurança pública da USP, é necessário investir mais em investigação e na Polícia Civil, que não basta apenas colocar agentes da Polícia Militar nas ruas sem desarticular a cadeia de crimes da capital. “Não adianta simplesmente ficar colocando centenas de policiais na rua para evitar furtos e roubos de celulares se não houver um trabalho de inteligência que identifique, por exemplo, os receptadores, quem comercializa esses produtos. É necessário entender o funcionamento de toda a cadeia produtiva, que faz esse roubo circular e que encomenda esses roubos”, afirma o pesquisador.

“Por isso, mais do que o trabalho ostensivo, que também é importante, é fundamental investigação. E, muitas vezes, as polícias investigativas, civis, são deixadas de lado. O trabalho de inteligência e investigação da polícia civil é fundamental, assim como o compartilhamento de informações, ações operacionais que identifiquem as principais quadrilhas, os principais receptadores. Tudo isso faz parte de um trabalho de segurança que ainda deixa muito a desejar”, complementa.

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