Renan “pediu expressamente” para ver se empresa poderia contribuir, diz delator

  • Por Estadão Conteúdo
  • 10/12/2016 16h13
Brasília - Presidente do Senado, Renan Calheiros na votação da PEC que inclui a mulher vítima de violência entre os beneficiários da política de assistência social prevista pela Constituição (Wilson Dias/Agência Brasil) Wilson Dias/Agência Brasil Renan Calheiros - Agência Brasil

A proposta de delação do ex-executivo da Odebrecht Cláudio Melo Filho alcança as presidências das duas casas do Congresso Nacional. O deputado Rodrigo Maia e o senador Renan Calheiros, respectivamente, presidente da Câmara e do Senado, são citados no anexo da proposta de delação encaminhada à procuradoria-geral da República. Calheiros seria um dos interlocutores da empresa no Senado e teria recebido para legislar a favor da Odebrecht na aprovação do projeto de resolução 72/2010 e nas Mps 579,613 e 627.

As citações estão no anexo de 82 páginas entregue por Cláudio Melo Filho a procuradoria-geral da República no âmbito das tratativas do acordo de delação. O Estado teve acesso a uma cópia do documento. O executivo já assinou o acordo, mas ainda irá prestar os depoimentos que posteriormente serão encaminhados para homologação do ministro Teori Zavascki.

Apelidado de Justiça no departamento de propina da Odebrecht, Calheiros é dono de um capítulo específico no anexo de Cláudio Filho. O executivo narra ter conhecido o peemedebista em maio de 2005 quando foi solicitar uma reunião com o presidente de Angola em uma audiência. Além de relatar pagamentos diretos ao senador, o executivo conta como os negócios com o senador eram intermediados por Romero Jucá, que centralizada as tratativas entre os alguns senadores do PMDB e a empresa. “Nos temas afetos aos atos legislativos de que relatei anteriormente, no relato referente ao meu relacionamento com o Senador Romero Jucá, o Senador Renan Calheiros me afirmou que os pleitos levados a Romero Jucá estavam, também, alinhados com ele, Renan Calheiros. Interpretei a sua resposta como a confirmação da parceria que já havia identificado entre Renan Calheiros e Romero Jucá”, explica o delator.

Cláudio Filho explica que, em 2010, houve uma primeira contribuição financeira para Calheiros efetuadas, segundo uma planilha entregue pela empresa, em duas parcelas de R$ 250 mil em agosto e setembro daquele ano. Em outra ocasião, no ano de 2014, conta o executivo, em um reunião entre ele e Calheiros, em um determinado momento, o senador disse que seu filho seira candidato ao governo de Alagoas e “pediu que verificasse se a empresa poderia contribuir”.

Para o delator, o pedido deu-se em momento de edição da MP 677/15 e “esses pagamentos, caso não fossem realizados, poderiam vir a prejudicar a empresa de alguma forma.” Após relatar o receio em não efetuar os pagamentos, o executivo elenca os repasses da Braskem de R$ 320 mil e de R$ 1,2 milhão da Construtora Norberto Odebrecht para a campanha de Renan Filho (PMDB). Segundo eles, os pagamentos estariam atrelados à atuação do senador na aprovação das medidas provisórias.

“A Odebrecht sempre ajudou Renan Calheiros, de forma indireta, através de Romero Jucá. Como será relatado em anexos específicos abaixo, participei da realização de pagamentos de campanha ao grupo político do Senador Renan Calheiros que giram em torno de R$ 22 milhões de reais. Em todas essas ocasiões que envolveram a atuação de Romero Jucá em defesa de pleitos da empresa, o Senador Renan Calheiros também atuou no mesmo sentido “, completou o delator.

Veja o que diz Cláudio Filho sobre seu relacionamento com Renan Calheiros:

Conheci Renan Calheiros, atual presidente do Senado Federal, em maio de 2005. A primeira vez que estive com ele foi para solicitar que o Congresso Nacional recebesse o Presidente de Angola, que iria fazer uma viagem ao Brasil. Solicitei audiência com Renan Calheiros, em meu nome, via telefone, por meio de minha secretária. Renan concordou com a ideia de promover a visita, até porque Angola já estava em Paz. Em razão de minha solicitação, o Presidente de Angola foi recebido oficialmente por Renan Calheiros e José Sarney, juntamente com Marcelo Odebrecht e outros executivos.

Ao longo dos anos tratei de diversos assuntos diretamente com Renan Calheiros, especialmente sobre a indústria eletrointensiva, como no caso da MP 579/12 que será relatada adiante, no Anexo n. 3.5. Minha relação com ele sempre foi boa e sempre tive acesso para ser recebido pelo Senador quando precisava. Exemplo disso foi a visita de cortesia que Marcelo Odebrecht me solicitou logo após a sua posse como Presidente do Senado. Solicitei via gabinete e foi marcada nos primeiros meses de seu mandato.

O Senador Renan Calheiros nos recebeu em uma sala de reunião grande, com cadeiras antigas, localizada dentro do próprio gabinete da presidência do Senado Federal. Nos temas afetos aos atos legislativos de que relatei anteriormente, no relato referente ao meu relacionamento com o Senador Romero Jucá, o Senador Renan Calheiros me afirmou que os pleitos levados a Romero Jucá estavam, também, alinhados com ele, Renan Calheiros. Interpretei a sua resposta como a confirmação da parceria que já havia identificado entre Renan Calheiros e Romero Jucá.

Em 2010, como consta da planilha entregue pela minha empresa ao Ministério Público, ocorreu uma contribuição financeira a Renan Calheiros, com codinome “justiça”. Apesar de me recordar desse fato e de o meu nome constar na referida planilha, não fui eu quem tratou com o Senador desta contribuição específica. Na planilha consta como responsável pelo pagamento Ariel Parente, tendo sido aprovada pelo DS João Pacífico. O valor que consta é de R$ 500.000,00, realizado da seguinte forma:

No ano de 2014, em oportunidade que estava reunido com o Senador Renan Calheiros, na residência oficial do senado, em reunião agendada por Milton Pradines, da equipe de RI da Braskem, tratamos especificamente do tema de renovação dos contratos de fornecimento de energia para empresas eletrointensivas do Nordeste para as plantas industriais. Nessa reunião, fomos recebidos pelo staff da residência oficial que nos direcionou para a sala de visitas.

Na entrada tínhamos que dar o nome de todas as pessoas que estavam no carro e que iam participar da reunião, sendo verificada a pertinência da entrada. O Senador, que chegou logo depois, ficou sentado em uma cadeira ao lado das demais pessoas, que ficaram em um sofá encostado na parede. Em determinado momento da conversa, ele me disse que seu filho seria candidato ao governo de Alagoas e me pediu expressamente, que eu verificasse se a empresa poderia contribuir.

Acredito que o pedido de pagamento de campanha a seu filho ao governo do Estado de Alagoas, justamente no momento em que se apresentavam os aspectos técnicos relevantes, era uma contrapartida para o forte apoio dado à renovação dos contratos de energia, inclusive publicamente, e que culminou na edição da MP n. 677/15. Entendi, na oportunidade, que esses pagamentos, caso não fossem realizados, poderiam vir a prejudicar a empresa de alguma forma.

Durante o trâmite da Medida Provisória, estive mais uma vez com o Senador para reforçar a importância do tema para a empresa. O encontro também se deu na residência oficial, em que fomos recebidos pelo staff e encaminhados para uma sala logo na entrada, ao lado direito da porta principal, que parece a um escritório. Depois de uns 20 minutos o Senador apareceu. Soube posteriormente que foram doados oficialmente R$ 320 mil a pretexto de campanha, sendo R$ 200 mil para a candidatura direta e R$ 120 mil através do diretório estadual do PMDB/AL e depois repassado para a campanha da candidatura.

No mesmo período, falei também diretamente com João Pacífico que me disse que este assunto já estaria resolvido, pois ele teria interesse direto por ter a obra do canal do sertão alagoano, naquele estado. Depois eu fui informado que haviam sido doados R$ 1,2 milhão a título de campanha.

Minha ação foi de transmitir e apoiar internamente o pedido feito pelo Senador Renan Calheiros, porque era do meu interesse atendê-lo, tendo em vista que a minha empresa tinha agenda institucional permanente no Senado Federal. Além disso, a Odebrecht sempre ajudou Renan Calheiros, de forma indireta, através de Romero Jucá. Como será relatado em anexos específicos abaixo, participei da realização de pagamentos de campanha ao grupo político do Senador Renan Calheiros que giram em torno de R$ 22 milhões de reais.

Em todas essas ocasiões que envolveram a atuação de Romero Jucá em defesa de pleitos da empresa, o Senador Renan Calheiros também atuou no mesmo sentido. Deixarei isso bastante claro adiante. As reuniões, quando solicitadas por mim, eram marcadas através de minha secretária Diva Souza, que tratava com Dilene, no telefone (61) 3303-2018 e (61) 9309-4966. Como anteriormente dito, sempre utilizava o carro da empresa (Toyota Corolla cinza – Placas dos carros da empresa: JIZ 0228, PAZ 4158 e PAZ 4159) para os deslocamentos, que era conduzido por meu motorista Carlos Eduardo

Defesa de Renan Calheiros 

Em nota, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que “a chance de se encontrar irregularidades em suas contas pessoais ou eleitorais é zero”. A declaração foi feita em resposta ao vazamento do acordo de delação premiada do ex-vice-presidente de Relações Institucionais da Odebrecht Cláudio Melo Filho à força-tarefa da Operação Lava Jato.

Renan defenda anda que “jamais autorizou ou consentiu que terceiros falassem em seu nome em qualquer circunstância”. “O senador ressalta ainda que suas contas já são investigadas há nove anos. Em quase uma década não se produziu uma década contra o senador”, diz o texto divulgado pela assessoria de imprensa da presidência do Senado.

Em depoimento à Lava Jato, Melo Filho afirmou que parte de um valor prometido pela construtora ao PMDB na campanha eleitoral de 2014 foi entregue em dinheiro vivo no escritório de advocacia de José Yunes, amigo e assessor do presidente Michel Temer. Outros caciques do PMDB também foram criados na delação, como Romero Jucá (RR) e Eunício Oliveira (CE), que também negam irregularidades.

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