Falta de sono noturno aumenta vulnerabilidade à Covid-19, diz estudo

Pesquisa da UFMG analisa relação da baixa imunidade com pouca qualidade de sono

  • Por Caroline Hardt
  • 27/06/2020 07h00
Pixabay mulher dormindo com relógio em primeiro plano Para os trabalhadores que mantém suas atividades no terceiro turno, Flavia intensifica a importância dos cuidados e a necessidade de ampliar as ações de prevenção contra a Covid-19

A falta de sono noturno pode tornar trabalhadores mais vulneráveis à Covid-19. É o que aponta uma pesquisa feita pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A partir da análise de 130 estudos e das alterações imunológicas demonstradas por pacientes infectados pelo coronavírus, os autores traçaram os impactos da ausência de descanso noturno na saúde.

No artigo, publicado na revista Chronobiology International, os pesquisadores enumeram motivos para o aumento da vulnerabilidade à doença. Entre eles , está a influência da ausência de sono noturno na produção de moléculas responsáveis pela defesa imunológica, a falta de adaptação dos “ritmos biológicos” e o “maior estado pró-inflamatório durante a noite”.

“A falta do sono noturno impedirá que parte dessas moléculas [de defesa] sejam produzidas de maneira suficiente. E, por isso, não dormir durante a noite piora a capacidade de defesa contra a Covid-19. A falta do sono noturno provoca uma redução em até 50% da defesa imunológica contra diversos tipos de vírus”, explica a principal autora do artigo, Dra. Flavia Rodrigues Silva, à Jovem Pan.

Segundo a pesquisadora, além de prejudicar a produção de moléculas de defesa, a falta de sono noturno também está associada com a gravidade das infecções pelo coronavírus. De acordo com ela, “a severidade da infecção [pela Covid-19] tem se mostrado relacionada com os ritmos circadianos, ou seja, os ritmos biológicos”, que se alteram sem o devido descanso noturno.

Sono diurno x sono noturno

Flavia Rodrigues conta que o sono diurno, do ponto de vista metabólico e imunológico, não substitui o sono noturno, já que determinadas fases da manutenção do sistema imunológico acontecem somente durante a noite. Além disso, a troca do período de descanso pode favorecer o aumento da gordura corporal e o déficit de memória, alterar as preferências alimentares e, até mesmo, ocasionar o surgimento de transtornos psiquiátricos.

A troca pode provocar ainda mais consequências, como o desenvolvimento da Diabetes Tipo 2 ainda na fase jovem. De acordo com a cientista, os adolescentes, por exemplo, que durante a pandemia acabam alterando os horários habituais de descanso, podem desenvolver a doença, o que não aconteceria se “mantivessem alimentação, atividades físicas e um sono adequado”.

“Independentemente da idade, quem troca o dia pela noite possui baixa eficiência no combate a qualquer tipo de infecção, principalmente as virais. Nesse momento de pandemia é fundamental que as pessoas mantenham horários fixos, todos os dias da semana, para dormir e acordar”, recomenda a pesquisadora.

Para os trabalhadores que mantém suas atividades no terceiro turno, como médicos, enfermeiros e socorristas, por exemplo, Flavia intensifica a importância dos cuidados e a necessidade de ampliar as ações de prevenção contra a Covid-19. Medidas como alimentação adequada; atividades físicas regulares; exposição a luz solar, respeitando os horários indicados, e períodos de descanso em ambientes escuros e “sem barulhos desnecessários” estão entre as recomendações.

“[Indicamos] que nos dias de folga eles tentem não ficar acordados durante a noite e que, ao menos uma hora antes de dormir, não assistam televisão ou usem telefone celular para facilitar a liberação de hormônios que vão favorecer a qualidade do sono. Além disso, é muito importante que as pessoas que trabalham a noite evitem situações de estresse, seja com seus familiares ou no ambiente social, para reduzir o estresse emocional, o que também favorece o agravamento de infecções virais.”

Impactos da falta de sono

Assinado pelos pesquisadores Flavia Rodrigues da Silva, Renato Carvalho Guerreiro, Henrique de Araújo Andrade, Eduardo Stieler, Andressa Silva e Marco Túlio de Mello, o estudo da UFMG aborda ainda os impactos da falta de sono na eficiência de vacinas, citando uma pesquisa que mostra que a redução do descanso noturno a menos de seis horas diárias está associada à diminuição da proteção da vacina contra a hepatite B.

Outra análise dos cientistas aponta que indivíduos que dormiam menos de 6 horas antes da exposição ao vírus influenza apresentaram quatro vezes mais chances de serem infectados do que aqueles que dormiram por mais de sete horas, demonstrando que essa variação também poderia acontecer em relação à Covid-19.

Ainda a respeito dos impactos da falta de sono na saúde, a pesquisadora Flavia Rodrigues destaca que embora diversos tratamentos tenham sido propostos para a Covid-19, muitos deles também têm seus resultados significativamente afetados diante a ausência de sono noturno.

“Buscamos com esse estudo alertar essa população de que a eficiência de alguns tratamentos é totalmente dependente do sono noturno e que esses tratamentos podem se tornar ineficazes em pessoas que não dormem a noite”, finaliza a pesquisadora.

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