STF acaba com a farra dos processo penais sem fim e sem punição, por 6 votos a 5
O Supremo Tribunal Federal (STF) pôs fim, nesta quarta-feira, à farra dos processos penais intermináveis, que impediam que réus poderosos fossem para a cadeia usando e abusando de recursos. Por 6 votos a 5, o tribunal firmou o entendimento de que prender um criminoso depois da sentença condenatória de segunda instância, sem esperar a análise de outros recursos, não contraria a Constituição.
É uma tese de repercussão geral, ou seja, ela vai se aplicar a todos os casos em tramitação na Justiça e as instâncias inferiores do Judiciário não poderão se opor ao entendimento do Supremo. O julgamento havia sido interrompida em 1º de setembro, quando apenas o relator, o ministro Marco Aurélio Mello, havia proferido o seu voto.
Estavam em julgamento duas ações que pediam que se avaliasse a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, que diz:
Art. 283. Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.
Aqueles que eram contrários à ideia de permitir a punição depois da segunda instância diziam que o trânsito em julgado da sentença – ou seja, a impossibilidade de ela voltar a ser questionada por qualquer apelação – era uma condição incontornável para a prisão.
Diziam, além disso, que qualquer interpretação em contrário fere o artigo 5º da Constituição, que insititui a chamada “presunção de inocência” em seu incico LVII: “ninguém será culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.
O voto mais incisivo nesse sentido foi o do decano Celso de Melo, que disse temer um retrocesso na “agenda das liberdades” e na defesa do “princípio democrático”. Ele afirmou que não era possível ceder ao pragmatismo e atribuir “a sensação de impunidade no país à presunção de inocência”. E afirmou que o Brasil já dispunha de diversas modalidades de prisão cautelar, não sendo portanto necessário avançar na direção de uma prisão antecipada.
Os ministros vencedores recorreram a argumentos de todos os tipos, das estatísticas ao direito comparado, para mostrar que a prisão não fere a presunção de inocência. É inegável o impacto positivo que a decisão terá no combate à corrupção e à impunidade. Mas também é certo que o julgamento desta quarta-feira foi um daqueles em que o STF esteve próximo de legislar, interpretando a letra da lei de maneira, para dizer o mínimo, bastante contra-intuitiva.
Teori Zavascki rebateu o argumento de que a prisão antecipada agravaria o caos carcerário no Brasil. “Caos carcerário não tem a ver com o que estamos discutindo aqui”, destacou.
O ministro Luis Barroso afirmou que, no Brasil, o Direito Penal “não ameaça ninguém que ganhe mais de quatro salários mínimos”. Ele sugeriu então que o artigo 283 deveria ser interpretado de tal forma que a cadeia entecipada seria uma modalidade de prisão preventiva “para garantir a efetividade do Direito Penal”.
Gilmar Mendes fez longa preleção sobre o quadro de colapso do sistema prisional brasileiro. Ainda assim, argumentou que sistema penal já estabelece, do indiciamento ao trânsito em julgado, “uma progressiva erosão da presunção de inocência”, e lembrou que o Brasil era caso único de ordenamento jurídico que exigia o trânsito em julgado para o início do cumprimento da pena.
O voto decisivo foi o da atual presidente da corte, a ministra Carmen Lúcia. Ela disse que a Constituição impunha ao tribunal “o dever de garantir uma jurisdição efetiva”, ou seja, de impedir que alguns saíssem impunes enquanto outros, por serem mais pobres, eram punidos.
Ficaram vencidos os ministros Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Rosa Weber, Dias Toffoli e Celso de Melo.
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