Um ano após 7 a 1, Fla x Flu político atinge a democracia, dizem especialistas

  • Por João Guimarães/Jovem Pan
  • 08/07/2015 05h31
Vista geral durante a partida entre Brasil e Alemanha, jogo válido pelas semifinais da Copa do Mundo FIFA Brasil 2014, no Estádio do Mineirão, em Belo Horizonte (MG). A Alemanha venceu por 7x1. (Belo Horizonte, MG, 08.07.2014. Foto: Thiago Calil/Photo Press/Folhapress) Thiago Calil/Photo Press/Folhapress Mineiraço e a política brasileira

Segundo uma teoria do antropólogo Roberto da Matta, o futebol tem o papel de dramatizar a sociedade, ou seja, ele coloca diversas questões sociais no palco e torna isso explícito.

Com a semifinal da Copa do Mundo de 2014 entre Brasil e Alemanha não foi diferente. Era um jogo, mas podia ser uma peça de teatro: “O Mineiraço”. Entre os protagonistas: David Luiz, Thiago Silva, Oscar e Fred. Os vilões: Müller, Klose, Kroos, Khedira e Schürrle. Abrem-se as cortinas e a humilhação acontece em dois atos de 45 minutos.

De um lado, o jogo exemplifica toda a falta de estrutura organizacional do futebol brasileiro dos últimos anos. Do outro, a partida é parte integrante da mudança do cenário político brasileiro.

Para o coordenador do Ludens (Núcleo Interdisciplinar de Pesquisas sobre Futebol e Modalidades Lúdicas) da USP, Flávio de Campos, essa mudança política começa com os protestos de junho de 2013, que antecedem a Copa das Confederações. “As Jornadas de Junho começaram com o Movimento Passe Livre e logo depois incorporaram a questão da crítica à organização da Copa do Mundo e dos desvios do dinheiro público”, afirma.

Ou seja, é a partir do futebol e das críticas à Copa, que a questão política vem à tona. É possível exemplificar essa mudança com os índices de popularidade da presidente Dilma Rousseff. Antes dos protestos, os números batiam recordes positivos, agora, batem recordes negativos “As manifestações colocam na superfície algo que sociedade brasileira ainda não queria olhar, que é o esgotamento do presidencialismo de coalizão”, explica.

O problema, na visão do especialista, é que dentro desse cenário instaurou-se um “Fla x Flu” político. Seja entre os apoiadores do governo ou seus opositores, não é mais possível negociar de uma forma em que os ânimos não sejam acirrados. Exemplos não faltam, basta acessar as redes sociais para se deparar com um verdadeiro ringue de agressões.

Existe solução?

Para o cientista político da USP Jairo Pimentel, todas as sociedades do mundo convivem com o dissenso, ele faz parte da natureza humana. “A democracia é uma forma de lidar com os conflitos, você institucionaliza isso por meio da disputa eleitoral”, afirma.

Já para Flávio de Campos, é preciso a gestão de uma coisa que talvez não se consiga controlar mais. “O que está acontecendo é uma gestação dos ovos da serpente”, diz. Segundo ele, em primeiro lugar é necessário combater a intolerância que está sendo inoculada no brasileiro. “Se não combater a prática da desqualificação do oponente, do insulto, da injúria e da não aceitação, a gente corre o risco de perder algumas das características mais interessantes da sociedade brasileira, que é esse espaço que nós temos para a diversidade”, aponta.

Na visão de Pimentel, o que tem que ser fator de união é o respeito pelo dissenso. “Trata-se da liberdade em discordar do outro sem que isso afete as relações”, diz. “Só com o respeito à democracia que a sociedade conseguirá viver dignamente”.

E no futebol? Segundo o comentarista esportivo Wanderley Nogueira, ainda levará tempo para a Seleção resgatar seu prestígio. “Será um processo demorado, tem que mudar o comando do futebol brasileiro, colocar pessoas com boas ideias”, afirma. “Pra gente poder voltar a suspirar pelo time vai demorar o mesmo tempo em que a gente forma um grande campeão olímpico. E não se forma um campeão olímpico em menos de 12 anos de muito trabalho”, finaliza.

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