Budistas radicais: a face mais violenta da religião mais pacífica
José Luis Paniagua.
Colombo, 10 fev (EFE).- O budismo é uma religião que prega a paz e a harmonia ou pelo menos era assim até que no Sri Lanka um grupo radical optou por aquecer seu discurso, e com isso esquentar o clima nas ruas, ao falar da prevalência de sua fé, embora hoje estejam no olho do furacão e alguns relacionem o sucesso do novo governo ao seu fim.
O grupo Bodu Bala Sena (algo como Budistas Poder Força – BBS), uma formação ultranacionalista com roupas em tons de amarelo e alaranjado, estava descontrolado: essa foi uma das acusações que pesaram para que o anterior Executivo de Mahinda Rajapaksa ficasse sem o apoio das minorias religiosas e elas se alinhassem eleitoralmente com o novo presidente, Maithripala Sirisena.
O BBS se tornou conhecido há alguns meses quando a violência incendiou as ruas de duas cidades do sul da ilha, uma delas Aluthgama, com um saldo de quatro mortos e 16 feridos em enfrentamentos entre budistas e muçulmanos.
Hoje, o secretário-geral do BBS, o monge Galagoda Atthe Gnanasara, nega essas acusações e garante que é “tudo é culpa da imprensa local e internacional e dos grupos extremistas muçulmanos que expandiram esta propaganda errônea pelo mundo”.
Vestido com uma toga laranja que deixa descoberto o ombro, Gnanasara diz à Agência Efe que não têm problemas com os “muçulmanos moderados”, mas ressalta que “o extremismo fundamentalista está crescendo no seu país de forma secreta”.
Os números, no entanto, não dão lá muito a razão a ele. Atualmente, no Sri Lanka os budistas representam 70% da população, enquanto os hinduístas são 15%, os muçulmanos 11% e os cristãos – entre os que BBS também vê radicais – apenas 7%.
“Estão fazendo conversões forçadas, conversões não éticas. Estão se casando com nossas mulheres mediante o engano e isto não aconteceu uma ou duas vezes apenas”, afirma o monge.
Para ele, o Sri Lanka é um país enfraquecido após os quase 30 anos de guerra entre a guerrilha dos Tigres de Libertação da Pátria Tâmil (LTTE) e o governo, que acabou com ela em 2009. Além do mais, ressalta que os extremistas muçulmanos são uma ameaça não apenas para seu país, mas para o mundo todo, lembrando os atentados à revista francesa “Charlie Hebdo”.
“Quantos problemas encaramos hoje? Os budistas criaram esses problemas? Não. É um grupo pequeno que cria problemas nesses lugares para perturbar as mentes das maiorias”, declara.
Hoje, ele garante que sua ação se limita a denúncias públicas para conseguir a atenção das autoridades.
“Não temos outra forma. Não podemos pegar em armas nem podemos atuar indecentemente como outros grupos”, afirma ele, apesar de há alguns meses ter dito publicamente que se um muçulmano tocasse um monge isso representaria seria “seu fim”.
Para o diretor do Centro de Políticas Alternativas (CPA) do Sri Lanka, Paikiasothy Saravanamuttu, também dirigente do Centro de Monitoramento da Violência Eleitoral (CMEV), a existência do BBS está essencialmente ligada ao governo de Rajapaksa e particularmente ao ministro da Defesa, Gotabaya Rajapaksa, irmão do ex-presidente.
“O BBS era patrocinado pelo ministro da Defesa anterior. Gerava um conflito interno para, de alguma forma, tomar decisões em matéria religiosa e criar uma espécie de confronto com demais grupos religiosos para mobilizar o budismo ao redor do governo”, explica o diretor.
Nessa necessidade de “gerar a ideia de um inimigo” morava uma estratégia de deixar obrigatoriamente o grupo radical impune.
“Não acho que tenham futuro porque sua trajetória está ligada ao governo anterior e a impunidade está vinculada ao poder. Não acho que tenham qualquer tipo de apoio real”, justifica Paikiasothy Saravanamuttu, destacando que a continuidade deste grupo “depende do sucesso” que terá o governo que Sirisena lidera desde 9 de janeiro.
Na comunidade budista o BBS também não é muito apreciado. Suranimala Senaratne, um dos diretores do canal de TV “The Buddhist”, não hesita em criticar o grupo e afirma que sua leitura da religião é equivocada.
“É um grupo minoritário que tem algumas ideias extremas, mas a maioria dos budistas no Sri Lanka não concorda com as ideias expressadas por eles”, defende.
Ele diferencia que uma coisa é se preocupar com os problemas que a comunidade budista enfrenta em algumas regiões e outra é apresentá-lo “de forma equivocada e com ideias extremistas”.
“Isso não é o budismo. A filosofia budista é o treino da mente e de entender a si mesmo”, ressalta Suranimala Senaratne. EFE
Comentários
Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.