Carne de porco na merenda escolar reabre debate sobre laicismo na França

  • Por Agencia EFE
  • 21/03/2015 06h30

Javier Albisu.

Paris, 21 mar (EFE).- Em plena campanha das eleições departamentais francesas, com pesquisas apontando uma vitória do partido ultradireitista Frente Nacional (FN), a convivência interreligiosa voltou a ser debatida após uma cidade decidir eliminar as merendas sem carne de porco dos refeitórios escolares.

Em prol do laicismo, um município com menos de 50 mil habitantes no leste da França chamado Chalon-sur-Saône determinou que as cantinas dos colégios públicos deixem de servir merendas sem carne suína a partir do próximo período letivo, pondo fim a 31 anos de almoços mistos nos centros educativos.

“A oferta de restauração não pode levar em conta as considerações religiosas. Propor um cardápio de substituição no lugar do porco é uma discriminação entre as crianças que não se aceita em uma república laica”, justifica a decisão o prefeito da cidade, Gilles Platret.

O partido de Platret, União por um Movimento Popular (UMP), presidido por Nicolas Sarkozy, parece a única força política capaz de vencer o FN de Marine le Pen nas eleições que serão realizadas nos dois próximos domingos.

“As cantinas precisam voltar a ser espaços de neutralidade, a discriminação começa com o cardápio duplo”, disse o prefeito através de um comunicado divulgado no site oficial da cidade.

A ministra da Educação, Najat Vallaud-Belkacem, afirmou que a iniciativa de Platret é permitida, mas pediu que os representantes políticos municipais ajam com sensatez.

“Um representante político deve garantir que nenhuma criança passe fome. Nada nos textos (legais) impõe a uma coletividade local adotar um ou outro cardápio, mas até agora sempre se decidiu com discernimento”, declarou a ministra ao canal “BFM TV”.

Junto ao formulário de inscrição do refeitório para o próximo período, que começa em setembro, o prefeito de Chalon-sur-Saône enviou uma notificação aos responsáveis dos 3.800 alunos escolarizados no município com o anúncio da nova medida.

Representantes de escolas de Chalon explicaram que o porco é colocado na merenda apenas uma ou duas vezes ao mês e se perguntaram por que é preciso preparar um prato alternativo para uma determinada comunidade e não para outras, como os vegetarianos.

Há quem desconfie que a decisão corresponda exclusivamente a uma ferrenha defesa do laicismo republicano, como o presidente do Observatório Nacional contra a Islamofobia, Abdallah Zekri.

“Compreendo muito bem que as eleições se aproximam e alguns tentam se basear nas ideias da Frente Nacional”, disse Zekri ao mesmo canal, para o qual classificou como “bobagem” a prática que Chalon-sur-Saône pretende impor.

O debate sobre que práticas culturais ou religiosas devem ser respeitadas no espaço público e quais devem ser submetidas à neutralidade do laicismo é habitual na França, onde as meninas não podem usar véu islâmico nas instituições de ensino públicas.

O véu é permitido nas universidades, embora também tenha começado um debate sobre algumas muçulmanas cobrirem a cabeça na sala de aula.

A burca é um capítulo à parte na França. A vestimenta é proibida em todos os espaços públicos do país desde 2010, quando o até então presidente Sarkozy a tirou dos espaços de convivência comum em nome da não discriminação das mulheres.

Vestir a peça, geralmente negra e que cobre quase totalmente o corpo e o rosto das mulheres, pode acarretar multas de até 150 euros no país. Já a punição para os que obrigarem as mulheres a usarem a vestimenta pode chegar a um ano de prisão e 15 mil euros. EFE

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