China mantém tortura e maus-tratos como prática habitual, aponta relatório
Tamara Gil
Pequim, 17 fev (EFE).- Os presos na China sofrem diversos tipos de torturas e agressões, como golpes com cassetetes elétricos, privação de água e comida, e até mesmo de advogado, diante da passividade das autoridades, que aprovaram leis para evitar situações como essas, mas que continuam sem fazer o que prometeram.
A grave situação evidencia o lado mais obscuro da atual segunda economia mundial, cujos detalhes foram expostos em um novo relatório divulgado nesta terça-feira pela organização Chinese Human Rights Defenders (CHRD).
No documento, a ONG constata que, nos últimos cinco anos, de 2009 a 2014, a China “não deu os passos correspondentes” para cumprir os compromissos da Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, estabelecida pelo país asiático em 1988.
“A tortura é um mal endêmico na China, em particular, contra defensores de direitos humanos e críticos com o governo. Pequim não deu novos passos para acabar com a tortura e a impunidade; por outro lado, promulgou leis que não implementa, permitindo que os torturadores fiquem livres e que as vítimas não tenham como reivindicar”, explicou Frances Eve, investigadora da CHRD.
A multiplicidade de exemplos no relatório mostra que o problema se estende por todos os poderes, o que colabora para que qualquer detido esteja submetido a constantes abusos.
Para começar, o período máximo que as autoridades podem reter uma pessoa sem libertá-la ou apresentar uma acusação formal (37 dias) costuma se exceder sem justificativas e, caso sejam defensores dos direitos humanos, é quase automático.
Os detidos, em geral, não têm acesso a advogados de sua escolha e inclusive, em algumas ocasiões, nem a tratamento médico.
A organização destaca o controverso caso da ativista Cao Shunli, que durante muito tempo teve a assistência médica negada sob detenção e morreu em 2014 em um hospital de Pequim, enquanto continuava detida.
“Privar os detidos de tratamento médico é uma forma comum de tortura na China, que contribui diretamente para que ocorram mortes sob custódia”, afirma Renee Xia, diretora internacional da CHRD, em referência a uma série de incidentes que se repetem e não são investigados.
Em casos “delicados” para o governo, há também a intimidação sofrida pelos advogados que representam os detidos, que correm o risco de terem suas licenças revogadas como represália.
“É cada vez mais complicado e arriscado trabalhar como advogado no país”, disse Teng Biao, um dos advogados chineses mais renomados e que teve a permissão para exercer a função cassada pelas autoridades em 2008.
A CHRD também expõe alguns avanços impulsionados pelo governo chinês, como o fechamento dos polêmicos campos de reeducação, onde era possível trancar pessoas sem julgamento por até quatro anos. No entanto, a ONG denuncia que muitos são reutilizados como centros de detenção onde ocorrem graves torturas não investigadas.
Na hora de protestar, as vítimas se deparam com tribunais que não aceitam julgar esse tipo de casos em conivência com governos locais e com a repressão do regime.
“Me prenderam a barras elétricas, tiraram a minha dignidade. Protesto há anos e a única coisa que consegui foi que me prendessem”, denuncia Jia, de 50 anos, uma cidadã que vai a Pequim para reivindicar em resposta a problemas não atendidos em sua cidade.
Pessoas como Jia são as que geralmente são levadas para as chamadas “prisões negras”, onde os maus-tratos ocorrem durante o dia inteiro, desde a privação de água, de comida ou da luz natural até os ataques físicos e sexuais, critica a CHRD.
As mulheres e as meninas são as mais prejudicadas nesse contexto, destaca a organização, que enviou o relatório ao Comitê contra a Tortura da ONU para uma análise que será feita da China em novembro.
Apesar de ter muito trabalho pela frente para acabar com a tortura, analistas e vítimas acreditam que a pressão internacional provocará mudanças no país.
“Nós não vamos cansar de lutar”, afirmou, enfático, o advogado Teng. EFE
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