Crise de refugiados ainda desestabiliza política na União Europeia
A crise de refugiados desequilibrou a União Europeia. Enquanto a Alemanha da chanceler Angela Merkel tem se mostrado bastante receptiva aos migrantes que chegam diariamente ao país, outros países anunciam medidas de confisco de bens e controle de fronteiras, além de uma sociedade que não demonstra boas perspectivas de convívio com os requerentes de asilo. A falta de uma política comum teria causado uma divisão entre os membros da UE.
Segundo o professor de ciências políticas da Universidade de Frankfurt, Jens Borchert, a falha em pactuar uma resposta da UE e a insistência dos refugiados em escolher os países em que querem morar ocasionou essa divisão. “Como a União Europeia não conseguiu uma solução para o crescimento do número de refugiados, cada membro teve de reagir individualmente, até porque cada um é afetado em grau diferente”, explica.
Mas, para conseguir apoio dos demais membros europeus à sua política de recepção aos refugiados, a chanceler alemã terá de fazer concessões. “Ela não entendeu que abriu um precedente perigoso ao aceitar incondicionalmente os refugiados, além de não conseguir perceber a falta de vontade dos outros países em recebê-los”, afirma Werner J. Patzelt, professor de ciências políticas da Universidade Tecnológica de Dresden, região do leste da Alemanha conhecida pelas posições mais conservadoras. “Ela não conseguirá conciliar os interesses dela e da UE, pois outros membros não aceitarão a imigração não regulamentada.”
Em 2015, a Alemanha recebeu mais de 1 milhão de refugiados. A maioria estava fugindo da guerra civil na Síria e dos ataques do grupo terrorista Estado Islâmico. “A cultura de boas-vindas da Alemanha foi usada excessivamente no ano passado, assim como sua capacidade de administração e acomodação”, diz Patzelt.
Popularidade
A Alemanha tem sido dominante no bloco ultimamente, mas isso não tornou o país mais popular entre os membros da UE. “Os países sabem que foi a Alemanha que chefiou a Convenção de Dublin, deixando o problema dos refugiados principalmente com os países do sul da Europa”, explica Borchert. A Convenção prevê que os refugiados devem apresentar seu pedido de asilo no país de ingresso. Geralmente, são os do sul, que ficam na região do Mar Mediterrâneo, onde mais de 700 mil imigrantes navegaram no ano passado.
Para Patzelt, nem mesmo o papel importante que a Alemanha desempenhou durante a crise da Grécia poderia fazer com os que os países aceitassem as decisões de Merkel em relação à crise de refugiados. “Gratidão não é categoria política e nenhum país da UE achará boas razões para compensar a ajuda financeira alemã aceitando refugiados”, ressalta.
O pesquisador de ciências políticas da Universidade de Mainz, Jürgen Falter, também é pessimista quanto a essa retribuição. “Há uma expectativa de solidariedade de nossos parceiros europeus, mas não acho que esse sentimento vá se sobrepor aos interesses nacionais dos países-membros”, afirma.
Apenas este ano, dezenas de homens mascarados atacaram imigrantes na Suécia, a Dinamarca aprovou uma lei que permite confiscar bens de refugiados para pagar a estada e a alimentação deles enquanto o pedido de asilo é julgado e a Grã-Bretanha causou irritação ao identificar refugiados com pulseiras e pintar a porta de seus abrigos de vermelho. Além disso, imigrantes iraquianos decidiram ir embora da Bélgica após se decepcionarem com a vida que levariam no país.
Resquícios da guerra
Segundo o professor de História Contemporânea da Universidade Livre de Berlim, Paul Nolte, a chegada dos refugiados é um desafio para toda a Europa e não há razão para posicionar os interesses dos países em lados opostos. “A União Europeia tem de desenvolver uma solução de meio-termo entre controle de fronteiras e compromisso com ajuda humanitária”, afirma Nolte.
Patzelt acredita que Merkel seja tão receptiva com os refugiados em razão da imagem que a Alemanha deixou na 2ª Guerra. “Os alemães querem ser os melhores em tudo, na ciência ou na tecnologia, na crueldade ou ao praticar a humanidade”, afirma. “O rescaldo será quase tão amargo como em 1945”, diz. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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