Denúncias de estupro não se traduzem em queda de casos de agressão na Índia

  • Por Agencia EFE
  • 28/08/2015 20h40
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Luis Reglero

Nova Délhi, 28 ago (EFE).- O aumento das denúncias por estupro não se traduz em uma queda das agressões sexuais na Índia, um país no qual 86% dos agressores são conhecidos das vítimas.

Os dados da Agência Nacional de Registro de Crimes do país asiático (NCRB, em sua sigla em inglês) refletem que as denúncias de agressões contra mulheres cresceram 18,3% durante 2014 e 31,6% no caso dos estupros.

Apesar deste aumento, “ainda muitas agressões seguem sem ser denunciadas precisamente porque os autores são conhecidos, por uma questão cultural, de estigma social, algo absurdo”, indicou à Agência Efe a diretora para o Sul da Ásia da ONG americano Human Rights Watch (HRW), Meenakshi Ganguly.

Dos 37.413 casos de estupro denunciados no ano passado na Índia, 32.187 foram cometidos por conhecidos das vítimas, de acordo com estes dados.

Ganguly sustenta que os agressores “se aproveitam da confiança de mulheres que conhecem, o que as tornam mais vulneráveis. A Índia não é precisamente um país seguro para elas”.

O caso de uma universitária abusada e torturada por seis homens em um ônibus em Nova Délhi em 2012, e que faleceu depois devido à gravidade dos ferimentos, gerou múltiplos protestos e abriu um debate sem precedentes sobre a situação da mulher no país asiático, que teve seus ecos.

“O caso da agressão brutal em Délhi teve repercussão inclusive no exterior”, ressaltou.

Na opinião da ativista, este tipo de notícias mostra o problema “inclusive desde fora do país, mas na prática não há uma pressão social suficiente para acabar com ele, que radica no entorno próximo” da vítima.

Parentes de primeiro grau foram os agressores em 674 casos dos estupros denunciados em 2014; outros parentes em 3.183; vizinhos em 8.344; companheiros de trabalho em 618; outros conhecidos em outros 19.368 casos registrados.

Khadijah Faruqui, advogada e ativista da ONG Jagori de ajuda às vítimas, indicou à Agência Efe que isso mesmo ocorre neste tipo de delitos em outros países.

No entanto, na Índia “existe uma relação de poder, na qual familiares e inclusive vizinhos estão acima da mulher, que ocupa os níveis sociais mais baixos, e também no âmbito econômico, no trabalho”, indicou.

“É uma questão de educação, consciência e justiça social”, considerou Faruqi.

Trisha Shetty, fundadora e diretora da site “shesays.in” de ajuda a mulheres que sofrem agressões sexuais, declarou à Efe que os estupros por parte de conhecidos “ocorrem especialmente no meio rural e não estão sendo tomadas as medidas necessárias”.

Shetty, de 24 anos, criou o site após comprovar que na internet é possível encontrar todos os tipos de informação, mas quase não sobre o que fazer caso seja uma vítima de agressão sexual na Índia.

“Não há suficiente informação para as vítimas e nem suficiente conscientização social. É uma sociedade na qual muitos homens e também muitas mulheres acreditam que o homem tem o controle sobre a mulher. E isso cria um ambiente agressivo”, lamentou.

Esta jovem considera que certos casos com ampla repercussão midiática “deixam uma sensação de que não corresponde com a realidade”.

Em dezembro, um taxista da companhia Uber em Nova Délhi, que possuía antecedentes penais, foi detido acusado de estuprar uma jovem que adormeuceu, em um fato que desencadeou de novo protestos pela falta de segurança para as mulheres que viajam sozinhas.

“A questão não é o perigo ao viajar, que não é tal, mas o ambiente social que rodeia estes casos. Para mudar a mentalidade, as autoridades não fazem o suficiente”, indica Shetty.

Na sua opinião, o governo indiano não está tomando as medidas adequadas e “não há castigo suficiente”, sobretudo em um sistema no qual demora-se seis anos em julgar um agressor.

“Na Índia é preciso reformar o sistema criminal e o educativo para que todas as agressões sejam denunciadas e os responsáveis castigados”, disse Ganguly. EFE

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