Deputados estaduais acolhem políticos e servidores condenados

  • Por Estadão Conteúdo
  • 10/07/2016 12h55
  • BlueSky
Divulgação Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo - ALESP

Gabinetes de deputados estaduais da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) abriram as portas para empregar ex-prefeitos, ex-vereadores e servidores públicos que têm condenações na Justiça por crimes de improbidade administrativa, corrupção e até homicídio. Contratados, na maioria das vezes, como assessores parlamentares, recebem em média R$ 15 mil mensais líquidos.

O repórter Luiz Vassalo apurou dez casos envolvendo funcionários que ocupam cargos de confiança comissionados e também concursados com base nas informações do Poder Judiciário de São Paulo e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O servidor comissionado André Pinto Nogueira, por exemplo, foi condenado pela Justiça por ter recebido, com outros empresários e de forma antecipada, R$ 858 mil pelo fornecimento de capacetes e escudos à 11.ª Brigada de Infantaria Leve, em Campinas, e não entregar os equipamentos, em 2004.

Há 11 anos na Assembleia, ele está na liderança do DEM, e é apadrinhado pelo segundo-secretário da Casa, Edmir Chedid, com salário de R$ 14.976,95. A sentença determina pagamento de multa equivalente ao valor do dano e proibição de ser contratado pelo poder público. Nogueira é considerado influente entre os funcionários da Casa, que o consideram o “95.º deputado”. Ele também é investigado pelo Ministério Público por suspeita de cobrar pedágio de servidores e repassá-lo aos deputados do DEM Aldo Demarchi e Chedid.

Chedid

Marília

Por determinação da Justiça, o deputado Abelardo Camarinha (PSB) foi condenado em primeira instância a ressarcir o município de Marília em R$ 112.568,77 e está proibido de ser contratado pelo poder público como pessoa jurídica. Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), em 2000, quando ainda era prefeito, Camarinha alugou, sem licitação, um imóvel para acomodá-lo e a seus secretários quando viajassem à capital, por R$ 2.700. O imóvel pertence a Walter Miosi, marido da então funcionária de confiança da prefeitura de Marília Marildes Lavigne da Silva Miosi. Segundo a sentença proferida pelo TJ-SP, a locação do imóvel fere os princípios da moralidade e da impessoalidade. Marildes está lotada na liderança do PSB, partido de Abelardo Camarinha, desde 2012.

Camarinha

Os dois, ao lado do funcionário Carlos Umberto Garrossino, também são investigados por receber pelo menos R$ 600 mil em uma suposta “Máfia da Merenda” instaurada na cidade durante a gestão do político na prefeitura. O esquema atingiu outros municípios vizinhos, segundo as investigações.

Outro funcionário de Camarinha com antecedentes criminais é Bruno Gaudêncio Coercio, condenado pelo incêndio do edifício da Central Marília de Notícias, em 2005. Ele ficou preso por três anos e a pena foi extinta em 2012. O ataque foi motivado porque o acusado teria se ofendido com as reportagens envolvendo seus familiares que eram noticiadas pela imprensa.

Merenda

Já o servidor José Merivaldo dos Santos é investigado na atual Máfia da Merenda descoberta pela Polícia Civil durante a Operação Alba Branca. Com salário de R$ 16.140,30, ele foi flagrado em escutas telefônicas cobrando propina de R$ 58 mil de um lobista envolvido no esquema criminoso, segundo as investigações.

Giovani Favieri, empresário contratado como prestador de serviços da TV Assembleia, foi citado em depoimento de José Carlos Bumlai, investigado na Operação Lava Jato, como recebedor de parte do empréstimo fraudulento de R$ 12 milhões do Banco Schain. Favieri é um dos maiores prestadores de serviços da Alesp. Só neste ano, foram pagos R$ 3.925.102,41 à empresa dele em contratos.

Até sexta-feira da semana passada, o ex-prefeito de Viradouro, no interior do Estado, Paulo Camilo Guiselini (PSDB) era lotado no gabinete do deputado Celso Giglio, do mesmo partido. Por ordem da Justiça, ele não pode se candidatar a cargos políticos nem contratar com o poder público, segundo o Conselho Nacional de Justiça, até 2023, após ser condenado por contratar empresas para o carnaval da cidade por R$ 79 mil, sem licitação, em 2012.

Paulo Camilo Guiselini (PSDB)

Quando era presidente da Câmara Municipal de Ilha Comprida, no litoral sul, Bruno Klimke foi condenado por abastecer indevidamente, sem licitação, os carros oficiais da Casa. A investigação apurou que os veículos levavam vereadores à capital para resolver questões pessoais e até para consultas médicas.

A Justiça determinou que Klimke perdesse os direitos políticos, entre maio de 2013 e maio de 2016. Hoje, ele trabalha no gabinete do deputado Milton Leite Filho (DEM) e ganha salário de quase R$ 5 mil líquidos.

Assassinato

Adriano Ruivo da Costa, funcionário comissionado na liderança do PR, foi condenado pelo assassinato de um homem, na zona sul da capital, em 1994. Na época, ele era amigo da vítima. O agente de segurança foi condenado a 6 anos em regime semiaberto. Atualmente, ele é agente de segurança e trabalha há cinco anos na Alesp. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Critérios

A presença de condenados por improbidade administrativa ou na esfera criminal no quadro de funcionários de confiança da Assembleia Legislativa levanta o debate a respeito da aplicação de uma “lei de ficha limpa” também aos servidores públicos. No caso da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, após a edição do Ato 12, de 2012, são verificadas as condições do servidor anteriormente à posse. Se, depois de lotado no cargo, o funcionário for condenado, a Casa fica obrigada a desligá-lo. Em caso de infração, sem condenação, a Alesp deve instaurar processo legal.

Ouvido pela Rádio Estadão, o cientista político do Insper Carlos Melo disse que os ex-prefeitos e ex-vereadores cassados no quadro de comissionados dos gabinetes “continuam tendo muito poder, muita influência sobre o partido”. Os políticos são abrigados por interesses, “como o domínio de informações” e pelo controle que exercem na máquina partidária.

O professor do Insper ainda afirma que os deputados devem ser questionados a respeito dos critérios usados nas contratações: “O sujeito está inelegível, mas pode ser contratado pelos deputados. Há, no mínimo, uma incoerência”.

Iguais

O cientista político da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Frederico Vasconcelos diz ser favorável que os critérios para a contratação de concursados sejam iguais para os comissionados. “O que não acho razoável é fazer exigências que vão além das regulares do serviço público. Também não acho razoável falar em condenação, caso a pessoa ainda tenha direito a recurso.”

Vasconcelos defende ainda o direito de reinserção dos condenados à sociedade. O professor da Unicamp pede cuidado para avaliar a situação de investigados. “Porque o investigado nem sequer tem uma condenação. É óbvio que, quando se trata de servidores de gabinetes, é preciso fazer um controle político da presença das pessoas ali. Uma cobrança moral e política sobre o deputado que o emprega”, disse. “Mesmo nesse caso, é preciso ter cuidado, porque as delações e a ‘publicização’ das grandes investigações no Brasil acabam criando um tribunal da opinião pública, em que as pessoas são condenadas”, afirma.

A coordenadora de pesquisas da ONG Transparência Brasil, Juliana Sakai, diz que a manutenção de servidores condenados nos gabinetes é incompatível com o exercício da função pública. A pesquisadora avalia que os investigados em grandes esquemas de corrupção poderiam ser, pelo menos, afastados. Ela afirma que deputados que empregam condenados e investigados por improbidade põem em xeque as próprias reputações. “Por que confiar neles para que tomem conta do orçamento público e tenham poderes para legislar, além de fiscalizar o Executivo?.” As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

Fotos: Divulgação/Facebook

  • BlueSky

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.