Ditadura transformou UnB em lugar sombrio, diz ex-aluno

  • Por Agencia Brasil
  • 26/09/2014 17h49
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O golpe militar de 1964, que instituiu a ditadura no Brasil, afetou drasticamente a rotina no campus da Universidade de Brasília (UnB) – um dos principais palcos de resistência do movimento estudantil ao governo militar em Brasília – relembrou hoje (26), em depoimento à Comissão Anísio Teixeira de Memória e Verdade da UnB, o professor e jornalista Aylê Salassié Filgueiras Quintão.

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Para ele, que confeccionou panfletos, jornais, participou ativamente da resistência e chegou a ser preso pelo regime, a UnB passou a ter uma “atmosfera sombria” há 50 anos. “O campus foi invadido e houve debandada geral com a presença efetiva da polícia na UnB. Foram tempos sombrios, as aulas foram suspensas e o campus se tornou quase um território ocupado”, disse Salassié.

Em pouco mais de 20 minutos de depoimento, ele falou em lembranças de um momento da história que diz não acreditar ter participado. “Éramos ousados. O movimento estudantil foi uma escola. Aprendi mais nele do que na própria universidade”, resumiu. Salassié teve participação direta na Federação dos Estudantes da UnB e conviveu com Honestino Guimarães, um dos três estudantes da universidade mortos pela ditadura.

A socióloga Sônia Hypólito, hoje com 68 anos, também vivenciou a repressão militar ao movimento estudantil na UnB. Ela, que no auge da ditadura deixou Brasília para morar no Rio de Janeiro – onde ingressou na resistência armada ao golpe no grupo Ação de Libertação Nacional (ALI) – se emocionou ao lembrar da amiga Ieda Delgado, morta pelo regime, cujo corpo nunca foi localizado.

“Tinha uma grande amiga em Ieda Santos Delgado, e juntas fomos crescendo na militância. Nos separamos [quando fui para o Rio de Janeiro], cada uma seguiu sua militância. Ela foi brutalmente assassinada, já foi homenageada aqui [na UnB], mas não poderia deixar de falar dela. A mãe da Ieda passou a me responsabilizar pela morte dela, que foi eu que coloquei política para ela. Eu sei que não fui [a responsável pela morte], mas, no fundo, sei que fui. Quem matou a Ieda foi a ditadura militar”, disse Sônia, sem conter as lágrimas.

Com olhar distante, como se tentasse reconstruir na memória a realidade vivida há cinco décadas, Sônia, pediu desculpas algumas vezes aos membros da comissão por não recordar detalhes. “Era uma forma de nos proteger. Fazíamos encontros e pouco tempo depois apagávamos aquilo da memória, porque qualquer coisa que disséssemos [à polícia] poderia significar a vida de alguém”, disse.

Das lembranças, Sônia Hypólito relatou sobre uma das invasões do Exército à UnB. “A chegada à UnB era terrível. Caminhões do Exército na universidade, um regime de terror que em nada derrubava a nossa vontade, a obstinação de estar lutando contra aquilo”, recordou. “A gente fazia política em sua essência. Não era festa. Com todas as limitações, era política o que fazíamos”, acrescentou.

“São personagens importantes para a história da resistência à ditadura na Universidade de Brasília. Todo o depoimento que traga informações para a gente de como atuava a repressão e de como se organizava a resistência a essa repressão é muito importante. Acho que os depoimentos trouxeram várias informações que alimentam o nosso relatório”, disse à Agência Brasil o coordenador de pesquisa da comissão, José Otávio.

Professor do Departamento de História da UnB, ele disse que o relatório final da comissão será entregue em 21 de abril de 2015, dia em que a universidade completará 52 anos. “Queremos fazer uma reparação simbólica sobre as violações dos direitos humanos cometidos na UnB”, concluiu.

 

Editor: Stênio Ribeiro

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