Ebola deixa rastro de tristeza e preconceito na Libéria

  • Por Agencia EFE
  • 19/04/2015 06h32
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Cada pessoa em cada cidade da Libéria tem muitas histórias para contar sobre como a epidemia do vírus ebola, que só neste país matou 4.500 pessoas em um ano, entrou em suas casas e destroçou comunidades inteiras, infectando pais, filhos e avôs.

Nesses lugares, cada família também tem uma história que só ela pode contar. Cada um vive as tragédias de forma diferente e, ao mesmo tempo, todas têm algo em comum: a tristeza pelos que se foram e o temor dos que sobreviveram à doença.

Os Wesseh, do subúrbio de Caldwell, nos arredores de Monróvia, eram uma típica família liberiana. Josiah, de 37 anos, e seu pai trabalhavam e ganhavam US$ 60 ao mês entre os dois, enquanto a mãe e outras duas irmãs se encarregavam das tarefas do lar.

Tudo mudou em maio de 2014, quando o pai se infectou com o vírus do ebola e morreu pouco depois. “Sua morte pôs toda a família à beira do abismo e nunca nos recuperamos totalmente de sua perda”, explicou Josiah.

Pouco depois, a epidemia se estendeu pela Monróvia e Josiah perdeu seu trabalho, e os Wesseh ficaram sem nenhuma fonte de renda.

Por causa disso Mary, uma das irmãs mais novas de Josiah, suspendeu seu sonho de ir para a universidade e buscou um emprego.

“(Mary) queria estudar economia, mas com a morte de nosso pai e meu desemprego suas chances de chegar à universidade ficaram muito limitadas”, desabafou Josiah.

Um dia, a sorte dos Wesseh mudou e Mary conseguiu um trabalho como higienista em uma Unidade de Tratamento de ebola (UTE) de Monróvia, o que deu um respiro para sua família.

Primeiro no Hospital Redenção e depois na Clínica Ilha, Mary esteve em contato direto com pacientes de ebola, já que seu trabalho consistia em alimentá-los e limpá-los. Sua grande contribuição para salvar sua cidade também foi sua perdição.

Josiah sempre teve medo que isso acabasse acontecendo e nunca se sentiu confortável sabendo que a comida que havia na mesa vinha de um trabalho tão arriscado e sacrificado, embora estivesse muito orgulhoso de sua irmã.

Dois meses após começar a trabalhar, Mary também se infectou e morreu. “Mary era a chefe da família. Chorei muito desde sua morte”, lembrou entre soluços. Josiah nem sabe onde sua irmã foi enterrada porque fizeram valas comuns e ninguém disse para onde levaram seu corpo.

Na Libéria, o vírus do ebola infectou mais de 10 mil pessoas, e quase a metade delas morreram, o que torna a história dos Wesseh algo comum. Mas não sofreram só os que perderam alguém.

Os que sobreviveram ao vírus, além de superar a doença, agora enfrentam os medos irracionais e o estigma dos que não se contagiaram e ainda temem entrar em contato com eles.

Siannie Beyan conseguiu se curar em uma das clínicas da ONG Médicos sem Fronteiras, mas ao deixar o hospital se chocou com uma dura realidade: seu marido a deixou e seus vizinhos a olham com receio.

“Perdi uma relação de dez anos por culpa do ebola. Ele me abandonou pouco depois de eu ser internada na clínica e meus dois filhos ficaram vários dias largados porque nem os vizinhos se atreviam a entrar em minha casa”, contou Siannie.

Sua avó materna se deu conta de que as crianças estavam sozinhas e passou a levar comida, mas não se atreveu a leva-los para sua casa porque tinha medo que a contaminassem.

Quando Siannie teve alta, sua alegria era imensa e só queria voltar para casa para ver seus filhos, mas não imaginava o que viveria.

“O dono da casa não quis me deixar entrar e tive que procurar outro lugar. Minha mãe quis me acolher, mas teve o mesmo problema com seu arrendatário”, lamentou.

Agora ela vive em uma nova casa onde ninguém sabe que teve ebola, mas passou a viver com medo de ser apontada pelas ruas da Monróvia.

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