Americanas entra com pedido de recuperação judicial e diz ter dívidas de R$ 43 bi

Decisão vem após o banco BTG Pactual conseguir um mandado de segurança para garantir o bloqueio de R$ 1,2 bilhão da conta da varejista; crise foi desencadeada depois de anúncio de débitos de R$ 20 bilhões

  • Por Jovem Pan
  • 19/01/2023 14h16 - Atualizado em 19/01/2023 18h21
Mauro Pimentel/AFP americvanas Ações da companhia desvalorizaram mais de 80% nos últimos dias, chegando a menos de R$ 1,50

Como informado mais cedo pela Jovem Pan, a Americanas ajuizou em caráter de urgência pedido de recuperação judicial. Mais cedo a empresa informou que trabalhava com a possibilidade de dar entrada ‘nos próximos dias ou potencialmente nas próximas horas’. No pedido, a companhia atualizou o valor da sua dívida, agora sendo de R$ 43 bilhões. “Em resumo, o valor total da dívida das Requerentes é de, aproximadamente, R$ 43 bilhões. Requer, ainda, o prazo de 48 (quarenta e oito horas) para apresentação da lista de credores completa, a discriminação do passivo e eventuais documentos faltantes, para que reflita da forma mais fidedigna possível a realidade do endividamento do grupo”, informou a empresa. Anteriormente, a companhia havia anunciado uma dívida de R$ 20 bilhões. “A Americanas S.A. informa que deu entrada hoje em seu pedido de Recuperação Judicial na 4ª Vara Empresarial do Rio de Janeiro. Dado o pedido de Recuperação Judicial da empresa, a Administração da Americanas vem a público informar que seguirá operando normalmente dentro das novas regras da recuperação judicial, cujo um dos objetivos principais é a própria manutenção de empregos, pagamento de impostos e a boa relação com seus fornecedores e credores e investidores de forma geral. Para tanto, o grupo de acionistas de referência da empresa informou ao Presidente do Conselho de Administração que pretende manter a liquidez da companhia em patamares que permitam o bom funcionamento da operação de todas as lojas, do seu canal digital, Americanas.com, da AME e suas coligadas. Através deste comunicado, pedimos o engajamento de todos os colaboradores nesta nova fase e principalmente dos fornecedores com quem temos relações históricas. A história da Americanas segue com determinação rumo a uma nova fase, com o compromisso com a sociedade e disposta a construir soluções que possam vir atender aos credores da empresa”, declarou em nota. Segundo a companhia, caso o pedido não seja aceito, há o risco de “absoluto aniquilamento do fluxo de caixa do Grupo Americanas, o que impedirá o cumprimento de obrigações diárias indispensáveis ao exercício da atividade empresarial, tal como o pagamento de fornecedores e funcionários”.

No documento de pedido de recuperação judicial, a empresa cita a cobrança dos credores como um dos motivos para a solicitação. A varejista pede que todas as ações legais contra ela sejam suspensas. “O Grupo Americanas viu-se sem saída, precisando emendar, em 7 dias, a tutela cautelar, para que seja recebido este pedido de recuperação judicial, em requerimento realizado no próprio processo e por obra do juiz. Para confirmar integralmente a liminar concedida cautelarmente, de modo que, dentre outros, sejam suspensas todas as ações e execuções existentes contra as Requerentes, bem como a exigibilidade dos créditos concursais; seja confirmado o sobrestamento dos efeitos de toda e qualquer cláusula que imponha vencimento antecipado das dívidas das Requerentes, em decorrência do fato relevante publicado em 11.1.2023, inclusive como medida de isonomia para a coletividade de credores e respeito a par conditio creditorum; sejam suspensas qualquer ordem de arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição sobre os bens, oriundas de demandas judiciais ou extrajudiciais, o que deverá ser previamente submetido a esse MM. Juízo, sobretudo se puderem prejudicar ou inviabilizar o processo de recuperação judicial das Requerentes; e seja confirmada a proibição de compensação de quaisquer valores, com a imediata restituição de todo e qualquer valor que os credores eventualmente tiverem compensado – com relação especificamente ao Banco BTG Pactual S.A. (“BTG”) após ser reformada, como confiam as Requerentes, a teratológica decisão do Des. Flávio Horta Fernandes –, assim como dos valores eventualmente retidos e/ou apropriados por credores, em virtude do fato relevante veiculado ao mercado em 11.1.2023 e seus desdobramentos”, declarou.

A empresa citou o embate com o BTG Pactual  dentro do pedido. Durante a semana, o banco conseguiu um mandado de segurança para reverter a decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que acatava o pedido da Americanas para suspender vencimentos antecipados e efeitos de inadimplência, após o anúncio do rombo fiscal de R$ 20 bilhões. Na decisão, o desembargador Flávio Fernandes entendeu que o banco, sendo um dos credores da varejista, tem direito ao bloqueio de R$ 1,2 bilhão da conta da empresa. “Não fosse o bastante, mesmo tendo esse MM. Juízo determinado a devolução dos valores ilicitamente usurpados pelo BTG e pelo Banco Votorantim S.A. (“Votorantim”) sem base legal, essas instituições financeiras não deram cumprimento à ordem judicial. Essa decisão, repita-se, foi mantida pela eminente relatora do recurso interposto pelo BTG, mas, surpreendentemente, o eminente Desembargador Flávio Horta Fernandes, relator do mandado de segurança impetrado igualmente pelo BTG, deferiu a medida liminar para determinar que o montante compensado fique depositado em uma conta vinculada a esse banco, indisponível para as Requerentes. Com isso, a situação de caixa da companhia que já era sensível, foi drasticamente afetada. Ainda que esses valores tivessem sido compensados no melhor momento financeiro da Companhia, a sua operação já seria colocada à prova, mas o bloqueio indevido de quase R$ 1,5 bilhão em uma situação periclitante como a atual faz com que a manutenção dos negócios do Grupo Americanas seja impossível sem a proteção da recuperação judicial”, declara o pedido.

“Com relação ao endividamento bruto do Grupo Americanas, disponibilizado no ITR divulgado no mesmo período, sem contar as inconsistências que ainda estão sendo apuradas, o valor atingia cerca de R$ 20.791 bilhões, sendo 89% desse montante dívida de longo prazo, enquanto o restante correspondia a dívidas de curto prazo. Apesar disso, a posição de caixa estimada totalizava aproximadamente R$ 8 bilhões (isso considerando os valores bloqueados, no montante de R$ 1,4 bilhão, pelo BTG e Votorantim, e R$ 3 bilhões que a companhia esperava obter com operações de recebíveis de cartão de crédito), o que representaria 6,4 vezes o valor da dívida de curto prazo”, complementa o documento. A empresa defendeu que a medida é “instrumento capaz de levar à reestruturação de suas dívidas e à adequação de sua estrutura de capital, com absoluto respeito aos direitos e prioridades das diversas categorias de credores, de modo a permitir que possam continuar a exercer suas atividades, gerando, dessa forma, riqueza e empregos, com inegáveis benefícios à comunidade e ao país. A recuperação do Grupo Americanas, além de viável do ponto de vista econômico e financeiro, apresenta-se indispensável e imperativa. Diversos setores econômicos dependem da operação da Americanas, valendo destacar os empresários de pequeno e médio porte, que contam com a capilaridade da Companhia para distribuição e revenda de seus produtos on-line. Isso sem contar os diversos empregos que estariam ameaçados e o desmantelamento de uma rede de apoio social a comunidades carentes, caso a Americanas saia de operação. Todos esses setores estariam ameaçados, em maior ou menor grau, inclusive com a possibilidade de verdadeiro colapso, caso o Grupo Americanas não adote as medidas necessárias à sua recuperação”, argumentou.

Além disso, a varejista anunciou Eduardo Flores como membro externo do comitê independente que irá apurar as circunstâncias que levaram ao rombo fiscal. Eduardo substitui Pedro Mello. Segundo o comunicado da empresa, o novo membro é “Professor Doutor do Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA/USP. Consultor e Parecerista desde 2012 com experiência em Contabilidade e Finanças. Professor da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado de 2010 a 2013. Membro do Advisory Council of IFRS Foundation desde 2021. Membro do Comitê de Pronunciamentos Contábeis representando a CNI desde 2016. Coordenador Técnico do Comitê Brasileiro de Pronunciamentos de Sustentabilidade. Membro do Integrated Reporting Connectivity Council of IFRS Foundation desde 2022”, além de ter atuado como presidente do conselho fiscal de diversas instituições. Desde que foi divulgado o rombo fiscal de mais de R$ 20 bilhões nos balanços da Americanas, a companhia e o BTG Pactual tem travado um batalha judicial. No domingo, 15, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), negou o recurso apresentado pelo BTG Pactual contra a decisão do Juízo da 4ª Vara Empresarial da Comarca da Capital, que aceitou pedido da Americanas para suspender vencimentos antecipados e efeitos de inadimplência. Contudo, a medida foi decidida sobre a justificativa de que foi realizada em plantão judiciário e que o assunto cabia ao expediente normal.

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) anunciou na terça-feira, 17, a instauração de uma força-tarefa – com o apoio da Polícia Federal (PF) e do Ministério Público Federal (MPF) – com o objetivo de investigar a Americanas e supostas fraudes contábeis. No entanto, a ação da autarquia ocorre após um pedido do subprocurador-geral do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas da União (MPTCU), Lucas Rocha Furtado, que afirmou haver um possível esquema de fraude na gigante varejista. Em sua argumentação, o servidor se baseou no processo do banco BTG Pactual contra as Americanas. O BTG acusou os acionistas majoritários de serem os “3 homens mais ricos do Brasil” atuando como “semideuses do capitalismo mundial” que foram “pegos com a mão no caixa daquela que, desde 1982, é uma das principais companhias do trio”. A manifestação é uma referência aos empresários Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Carlos Alberto Sicupira, proprietários da 3G Capital. “São estes, pois, os responsáveis por controlar, há 40 anos (atualmente acionistas de referência), a companhia que simplesmente não percebeu um rombo contábil de R$ 20 bilhões”, acusou o BTG.

 

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