Banco Central surpreende e eleva a taxa Selic a 2,75%, o primeiro aumento em quase seis anos

Copom sobe os juros em meio à escalada da inflação, impulsionada por combustíveis e dólar; última elevação da taxa havia sido feita em julho de 2015

  • Por Gabriel Bosa
  • 17/03/2021 18h47 - Atualizado em 17/03/2021 23h33
Adriano Machado/Reuters Homem em frente ao Banco Central Servidores do BC aprovaram paralisação em assembleia nesta segunda-feira

Pela primeira vez em quase seis anos, o Comitê de Política Monetária do Banco Central, o Copom, aumentou, nesta quarta-feira, 17, a taxa básica de juros da economia brasileira, passando a Selic de 2% para 2,75% ao ano. A mudança veio acima do 0,5 ponto percentual esperado pela maior parte dos analistas. O último reajuste para cima foi em julho de 2015, quando o índice passou de 13,75% para 14,25%, e desde então os juros brasileiros seguiram uma política de sucessivos cortes e congelamentos. A Selic chegou a 2% ao ano — o patamar mais baixo da história — em agosto de 2020, dando fim ao movimento de queda gradual iniciado em julho de 2019, com a redução de 6,5% para 6% ao ano. O consenso entre analistas é que a Selic mantenha o viés de alta nos próximos encontros do Copom e encerre 2021 a 4,5% ao ano, segundo o Boletim Focus divulgado nesta segunda-feira, 15.

A Selic ficou congelada em 2% ao ano nas últimas quatro reuniões da autoridade monetária nacional, seguindo a prescrição futura, também chamada de foward guidance, como foi batizada a política de juros baixo para o aquecimento da atividade econômica. A trava foi retirada na primeira reunião do colegiado em 2021, em janeiro, mas com o recado de que a queda não significava a subida imediada dos juros no encontro desta quarta-feira. O aumento da Selic ocorre em meio ao avanço da inflação, pressionada principalmente pelo encarecimento dos combustíveis e pela alta do dólar. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) foi a 5,2% nos últimos 12 meses encerrados em fevereiro e encostou no teto da meta de 5,25% perseguida pelo Banco Central, com centro de 3,75% e mínimo de 2,75%. O aumento do IPCA a partir do último trimestre de 2020 era visto como choque temporário e localizado, porém, a constância da escalada levou analistas a preverem o índice a 4,6% ao fim de 2021.

O aumento de 0,75 ponto percentual foi unanimidade entre os membros do colegiado. Em nota, o Copom afirma que o atual cenário econômico não exige políticas de estímulos, como a manutenção dos juros ao nível mais baixo da história, e que a recente elevação dos combustíveis justifica a mudança. “Apesar da pressão inflacionária de curto prazo se revelar mais forte e persistente que o esperado, o Comitê mantém o diagnóstico de que os choques atuais são temporários, mas segue atento à sua evolução”, afirmaram. “Os membros do Copom consideram que o cenário atual já não prescreve um grau de estímulo extraordinário. O PIB encerrou 2020 com crescimento forte na margem, recuperando a maior parte da queda observada no primeiro semestre, e as expectativas de inflação passaram a se situar acima da meta no horizonte relevante de política monetária. Adicionalmente, houve elevação das projeções de inflação para níveis próximos ao limite superior da meta em 2021.”

O Copom ainda aponta o aumento como o início de um processo de normalização parcial, indicando que no próximo encontro, marcado para os dias 4 e 5 de maio, deve ser feito novo aumento na casa de 0,75 ponto percentual. “Para a próxima reunião, a menos de uma mudança significativa nas projeções de inflação ou no balanço de riscos, o Comitê antevê a continuação do processo de normalização parcial do estímulo monetário com outro ajuste da mesma magnitude. O Copom ressalta que essa visão para a próxima reunião continuará dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos, e das projeções e expectativas de inflação.”

Pressão da inflação

O IPCA fechou 2020 com alta de 4,5%, acima do centro de 4% estimado para o BC e o maior valor desde 2016. Depois de passar por períodos de deflações com a queda brusca da atividade econômica no pico da pandemia da Covid-19, uma série de pressões está colocando a inflação acima da meta dos analistas. A problemática passa pela disparada das commodities no mercado internacional, em especial o barril do petróleo, além do desequilíbrio do consumo interno com a distribuição do auxílio emergencial e paralisação temporária da indústria por causa das medidas de isolamento social. A disparada do dólar no fim de 2020 e a permanência do câmbio nas alturas também explicam o avanço da inflação. As incertezas políticas, que vão desde a insegurança da capacidade do governo em manter as contas sob controle até a interferência do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na Petrobras, passando ainda pela falta de gestão no combate à pandemia, afugentam os investidores do país, e com eles os dólares. A PEC Emergencial, promulgada no Congresso nesta segunda-feira, 15, deve sinalizar ao mercado os esforço do país em seguir a responsabilidade fiscal, enquanto o início da distribuição do pacote de US$ 1,9 trilhão nos Estados Unidos deve aumentar a liquidez nos mercados internacionais, empurrando o câmbio para baixo. O cenário, porém, não é muito otimista. Após prever o dólar na casa de R$ 5 até o fim do ano, analistas ouvidos pelo BC já esperam que a moeda vire 2022 cotada a R$ 5,30.

O que é Copom

Comitê de Política Monetária (Copom) é um órgão constituído em 1996 no âmbito do Banco Central do Brasil com as finalidades de estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa básica de juros da economia brasileira. Tem, ainda, a competência específica de regular a liquidez da economia, por meio dos instrumentos de política monetária. O Copom se reúne a cada 45 dias. No primeiro dia do encontro, são feitas apresentações técnicas sobre a evolução e as perspectivas das economias brasileira e mundial e o comportamento do mercado financeiro. No segundo dia, os membros do colegiado, formado pela diretoria do BC, analisam as possibilidades e definem a Selic.

O que é Selic

Selic é a taxa básica de juros da economia brasileira. Os juros são usados pelo Banco Central como uma ferramenta para tentar controlar a inflação, pois a alta ou a queda dos juros influencia o consumo das famílias e a tomada de crédito no país. De modo geral, quando a inflação está alta, o BC sobe os juros para reduzir o consumo e forçar os preços a cair. Quando a inflação está baixa, o BC derruba os juros para estimular o consumo. A Selic tem influência em todas as taxas de juros do país, como a dos empréstimos, financiamentos e das aplicações financeiras. Quando o BC altera a meta da Selic para baixo, a rentabilidade dos títulos atrelados a ela cai e, com isso, o custo dos bancos também diminui. Assim, uma redução da Selic, por exemplo, deve fazer com que os juros cobrados pelas instituições financeiras em empréstimos também caiam. O contrário ocorre quando a Selic sobe: o custo dos bancos aumenta e eles passam a cobrar mais pelos empréstimos.

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