Dólar a R$ 4,50? Alta dos juros e guerra na Ucrânia podem levar cotação para o patamar pré-pandemia

Divisa caiu a R$ 4,90 nesta terça-feira; aumento de instabilidade internacional, mudanças na política monetária dos EUA e eleições podem ser freios para queda mais acentuada

  • Por Jovem Pan
  • 22/03/2022 15h59
ROBERTO GARDINALLI/FUTURA PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO Mão segura notas de US$ 100 e R$ 100 Dólar mantém trajetória de queda ante o real pelo terceiro dia seguido

O atual cenário que trouxe o dólar para a casa de R$ 4,90 tem potencial para ampliar a desvalorização do câmbio ao nível visto antes da pandemia da Covid-19, quando a divisa era comercializada ao redor de R$ 4,50. Apesar de enxergarem o quadro como pouco plausível, analistas do mercado financeiro afirmam que existem elementos para uma possível queda mais acentuada da moeda caso a atual conjuntura de juros elevados no Brasil e commodities pressionadas no mercado internacional se mantenha. O freio para a retração do dólar pode ser justamente um dos fatores que forçam a cotação para baixo: a instabilidade global gerada pelo conflito no Leste Europeu. Se até agora a disparada das commodities em reflexo às incertezas da guerra trouxe mais capital estrangeiro ao país, um eventual clima prolongado de insegurança pode levar ao movimento inverso. “Um cenário de risco faz com que as pessoas corram para um porto-seguro, como o dólar, e isso valoriza a moeda frente as outras”, afirma o sócio da Valor Investimentos, Davi Lelis Ferreira. “A possibilidade de o dólar cair para R$ 4,50 existe, mas é muito pouco provável”.

Em fevereiro de 2020, considerado o último mês antes da disseminação da pandemia no Brasil, o dólar fechou cotado a R$ 5,479. Depois, em meio ao aumento das incertezas geradas pelas crises sanitária e econômica, o câmbio seguiu em trajetória de alta, chegando a tocar o teto de R$ 5,901 em 13 de maio daquele ano. A análise de gráficos da Necton Investimentos apontam que, após chegar a R$ 4,90, o próximo ponto de sustentação da moeda seria no patamar de R$ 4,65 — semelhante ao visto antes do novo coronavírus. “O câmbio disparou depois da pandemia, então passou a andar de lado”, diz o economista-chefe da casa, André Perfeito. Para ele, o cenário de R$ 4,65 também é pouco provável diante das pressões projetadas para os próximos meses.

Se a escalada da Selic torna a renda fixa mais atrativa e chama a atenção do investidor ao mercado brasileiro, um movimento semelhante, mas nos Estados Unidos, cria dificuldades para uma desvalorização mais acentuada. O Federal Reserve (Fed) elevou, na semana passada, os juros de uma média de 0% e 0,25% para algo entre 0,25% e 0,5%, no primeiro movimento para cima desde 2018. Membros do colegiado da autoridade monetária defendem que sejam feitas mais seis elevações ao longo dos próximos meses, o que aumentaria a taxa para algo em torno de 1,5%. A trajetória de alta tende a atrair dólares para o Tesouro norte-americano, considerado um dos ativos mais seguros pelos investidores, em detrimento de outros mercados, especialmente os emergentes.

No cenário doméstico, a maior pressão para o câmbio deve partir do noticiário político. Tradicionalmente, o dólar fica muito mais volátil nos meses que precedem as eleições. Para este ano, a polarização entre o atual mandatário, Jair Bolsonaro (PL), e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), pode gerar dose extra de incertezas, principalmente pelas pesquisas indicando a queda da distância entre os candidatos. Para analistas, o atual governo poderia ser mais flexível com as contas públicas na busca por ações que favoreçam a popularidade do presidente. O movimento iria aumentar a desconfiança dos mercados no comprometimento fiscal e refletiria na fuga de investidores — e dos dólares. Mas há quem enxergue no cenário de polarização uma margem menor para mudanças bruscas no câmbio. Para Ferreira, o mercado precificou que a disputa será entre os dois candidatos, que já possuem uma agenda econômica bastante definida e com poucos riscos de surpresas. “A terceira via não é levada em consideração, então o mercado já está preparado para o cenário com Lula ou Bolsonaro”, explica. Apesar da atual vantagem do petista, o economista chama a atenção para as mudanças em disputas anteriores às vésperas do pleito. “As pesquisas de agora podem mudar completamente nos próximos meses. Apesar de ser uma eleição bastante polarizada, ela já está bem precificada.”

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