Inflação dos importados surpreende e sobe acima do esperado apesar da queda do dólar
Enquanto a moeda norte-americana acumula queda de 16% em 12 meses, produtos vindos do exterior somam aumentos acima da média da inflação; alívio inflacionário só deve vir no início de 2023
A despeito da recente desvalorização do dólar em relação ao real, a inflação de bens importados surpreendeu o mercado ao ficar acima do esperado no acumulado de um ano até março. Analistas apontam que os efeitos da recente queda da moeda norte-americana, que perdeu 16,3% do seu valor em 12 meses, não se traduziram em arrefecimento de preços por não conseguir superar os entraves da desorganização das cadeias de produção durante a pandemia da Covid-19. A eclosão do conflito no Leste Europeu também gerou uma onda que deve jogar para cima os índices da inflação em escala global, impactando diretamente no encarecimento de produtos comprados no exterior. Nessa esteira, os eletrodomésticos já estão 20% mais caros no acumulado de 12 meses, enquanto a farinha de trigo subiu 18% e os eletrônicos, 14%. A inflação oficial do Brasil, medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), registrou alta de 1,62% em março, a maior variação para o mês em 28 anos. No acumulado de 12 meses, o aumento de preços foi a 11,3%. A alta foi puxada pelos combustíveis e pelos alimentos, grupos que o Brasil é destino de exportações.
O governo federal anunciou em 22 de março a isenção total de impostos de importação do etanol e de seis produtos da cesta básica (café, margarina, queijo, macarrão, açúcar e óleo de soja). A medida visava justamente aumentar a oferta desses itens no mercado doméstico para combater a inflação. Porém, os efeitos da ação do governo e a queda do câmbio não estão sendo fortes o suficiente para vencer as resistências negativas, segundo André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre). “Há gargalos na produção causados pela Covid-19, piorados com a guerra na Ucrânia, que podem não permitir a queda nos preços dos importados“, explica. “Não é como se a cadeia de produção estivesse parada, mas ela foi deslocada por causa da questão geopolítica, e isso torna a logística mais cara.”
Para o empresário e presidente da Associação Brasileira de Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba), Adilson Carvalhal Junior, o IPCA acima de 11% surpreendeu negativamente. Na análise da entidade, a variação de preços deveria estar abaixo de 10%. “Ficou muito acima do esperado, principalmente pela falta de matéria-prima. Os produtores estrangeiros, principalmente na Europa, tiveram grande aumento do custo de insumos e de energia elétrica, e isso acaba contaminando toda a cadeia”, explica. A inflação na Zona do Euro foi a 7,5% no acumulado de 12 meses até março e renovou a máxima histórica. O índice deve continuar pressionado com as recentes restrições econômicas do bloco à Rússia, principalmente sobre itens energéticos, como carvão e gás. E o alívio inflacionário só deve vir no início de 2023. “Os fornecedores afirmam que a situação não deve melhorar até setembro, e, como há uma defasagem de até quatro meses com os produtos que importamos, o reflexo dessa queda lá na Europa só deve chegar ao Brasil no início do ano que vem”, afirma.
Entre os grupos de produtos importados que mais tiveram aumento de preços, estão os combustíveis de veículos, que subiram 27,9% em 12 meses. O principal vetor de alta é a volatilidade no preço do barril do petróleo em meio às incertezas geradas pela guerra na Ucrânia, que chegou a levar a cotação para próximo de US$ 140, o maior valor desde 2008. A elevação, porém, já era observada desde o ano passado com a retomada das economias no pós-pandemia. A alta dos combustíveis explica parte do encarecimento dos alimentos e bebidas, já que a maior parte da produção é transportada em rodovias. O aumento dos preços também tem relação com quebras nas lavouras por questões climáticas, como as fortes tempestades que atingiram a região sudeste no início do ano. Os artigos de residência também são destaques pelo encarecimento de 20,4% de aparelhos eletrônicos, pressionados pelos aumentos dos custos de produção devido à falta de componentes. A escassez é resultado da paralisação dos parques fabris, principalmente na China, por causa das medidas de restrições impostas para frear a disseminação da Covid-19. Confira abaixo os produtos importados que mais tiveram impactos na cesta de itens importados:
Combustíveis | 27,9% |
Eletrodomésticos | 20,4% |
Automóvel novo | 18,2% |
Farinha de trigo | 18% |
Motocicleta | 17% |
Sardinha em conserva | 15,9% |
Video game | 15,9% |
Aparelhos eletrônicos | 14,3% |
Macarrão | 13,4% |
Azeite de oliva | 11,3% |
Salmão | 8,1% |
Aparelhos de informática | 8% |
Bacalhau | 7,8% |
Telefone | 5,3% |
Vinho | 2,5% |
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