Lojistas ficam sem receber valores de pagamentos em cartão após nova regra do BC

  • Por Marina Ogawa/Jovem Pan
  • 23/11/2017 15h17 - Atualizado em 24/11/2017 09h04
Epitácio Pessoa/Estadão Conteúdo cartão de crédito Há alguns meses o BC criou uma nova regra e disse que a partir do último dia 20 todas as operações de pagamento envolvendo credenciadoras de cartão devem ser liquidadas pela CIP

Em plena semana da Black Friday, milhares de lojistas, taxistas e empresários que utilizam maquininhas de cartão como Cielo e REDE estão sem receber os valores de suas vendas.

O problema é consequência de uma nova regra implementada pelo Banco Central. Diversos estabelecimentos comerciais não estão recebendo os valores pagos por consumidores por conta da ausência de repasses. Enquanto isso, bancos e credenciadoras, se isentam da responsabilidade pelo problema.

A ausência dos repasses foi comunicada primeiramente pelo portal Brazil Journal.

De acordo com a nova regra do BC,  desde o último dia 20 de novembro, todas as operações de pagamento envolvendo credenciadoras de cartão (Cielo, REDE, Global, GetNet, Stone e outras) devem ser liquidadas pela Câmara Interbancária de Pagamentos (CIP). A intenção era de que se aumentasse a segurança no sistema e diminuísse a chance de que alguém ficasse sem receber os valores.

Para entender melhor o problema, imagine que você foi a um restaurante e pagou R$ 20. Usou um cartão do banco X, que foi capturado pela maquininha da Cielo, por exemplo. A Cielo, como credenciadora, deve retirar R$ 20 da sua conta e colocar R$ 20 na conta do restaurante. Para isso, ela manda um arquivo para a CIP com a informação de que deve depositar os R$ 20 na conta do restaurante referente a sua transação feita em determinado dia.

Antes da norma do BC, a Cielo poderia se comunicar diretamente com o banco X ou ainda via CIP com o banco X. Mas agora apenas via CIP.

Agora imagine que você é a Cielo e tem que fazer este mesmo crédito de R$ 20 para o restaurante que possui uma conta no Banco do Brasil ou Caixa Econômica Federal. Você, Cielo, envia o dinheiro do consumidor de forma correta ao banco via CIP, o dinheiro chega no BB ou CEF e o próprio banco não consegue colocar o valor na conta do restaurante.

Aí existe, ao que tudo indica, e segundo o que foi apurado, um problema de programação de sistema do banco. Ou seja, o código no programa está mal escrito.

O que alguns estabelecimentos comerciais, MEI ou taxistas estão reclamando nos últimos dias é que estão recebendo o dinheiro, mas no extrato não aparece a operação de entrada de crédito.

Há também os casos de bancos que receberam o dinheiro e dias depois não conseguiam colocá-lo na conta do cliente e, assim, devolveram para a credenciadora. Isso mesmo que você está pensando: o seu dinheiro ficou rodando antes de efetivamente cair na sua conta.

Somando a esses dois casos, existem ainda os que nem recebendo o dinheiro estão – e estes estão preocupados com contas a pagar, já que os valores não são recebidos e, alguns deles, sequer têm previsão de quando serão creditados.

Mas não existe uma outra forma de os bancos pagarem os valores? Existia. Antes da nova norma, o BC poderia realizar transações via TED (Transferência Eletrônica Disponível), quando os valores enviados por meio dele caem na conta do destinatário no mesmo dia da operação. A partir de agora isso não é mais possível.

Resumindo, são três etapas básicas: o consumidor paga ao estabelecimento, que manda para a credenciadora, esta, por sua vez, manda um arquivo via CIP para o banco. E o que não está funcionando é a plataforma do banco na hora de “conversar” com a CIP. E isso leva a que? À ausência do dinheiro na sua conta.

Prejudicados

Em entrevista à reportagem, a microempreendedora Adriana Mello, que vende marmitas em sua cidade, é MEI, contou que possui uma maquininha da Cielo e efetua suas vendas através dela, entretanto, a credenciadora não está repassando os valores.

“Tenho quase R$ 500 e eles não me pagam”, disse em uma reclamação formal pelo site Reclame Aqui. Em resposta, a empresa Cielo pediu três dias para que pudessem resolver seu problema, e ela, portanto, aguarda a data para verificar se será necessário tomar alguma outra atitude.

Ela afirmou que, em agosto, procurou a Cielo, e a partir de setembro, quando entravam valores no cartão, o repasse era de outro valor inferior ou nenhum. “Teve um sábdo que foi R$ 160 e não fizeram nenhuma transferência. Aí, durante a semana, se eu tinha R$ 30 ou R$ 40, eu recebia R$ 10, R$ 15. Achei que era desconto do aluguel da máquina. Eles diziam que era incompatibilidade da conta corrente”.

Após reclamações, muitos dias úteis depois, Adriana resolveu formalizar a reclamação pelo site Reclame Aqui: “coloquei ontem minha reclamação e hoje de manhã uma moça me ligou e me deu muita atenção, ouviu o que eu falei. Ela disse que vai cuidar do processo até o final e me pediu 3 dias. Vamos aguardar”.

Outra reclamação no mesmo site é de problemas com a REDE, que afirma que o problema está na CIP. Desde o dia 13 de novembro, até o dia 22, ele ainda não havia recebido o crédito na sua conta das vendas efetivadas.

Uma outra reclamação dá conta de uma queixa contra a credenciadora Stone. O cliente reclamou com a empresa, mas esta informou que se tratava de problema de processamento por parte da Caixa Econômica Federal.

O que dizem os bancos

Por meio de sua assessoria de imprensa, o BC enviou nota à reportagem e afirmou que a liquidação centralizada foi implantada conforme estabelecido na regulamentação e o resultado está dentro do previsto.

Confira a nota na íntegra:

“A liquidação centralizada foi implantada conforme estabelecido na regulamentação e o resultado está dentro do previsto.

Os problemas relatados, contudo, não dizem respeito a liquidação centralizada propriamente e refletem dificuldades pontuais de algumas poucas instituições financeiras. Vários dos problemas ocorreram na semana passada, durante período de contingência (a regulamentação estabelece a vigência da nova sistemática a partir de 20 de novembro), e foram, na sua maioria, sanadas. As instituições estão trabalhando para sanar os problemas pontuais remanescentes. A área de supervisão do Banco Central tem cobrado dessas instituições solução tempestiva para as dificuldades relatadas.

Deve se ressaltar que a nova sistemática de pagamentos elimina as ineficiências trazidas pela existência de múltiplos prestadores de serviço de compensação e de liquidação para um mesmo arranjo de pagamento, com potencial para reduzir custos na indústria”.

A FEBRABAN (Federação Brasileira de Bancos) destaca que o novo sistema de Grade Centralizada de Arranjos de Pagamento tem por objetivo trazer maior segurança para os pagamentos das transações em cartões, ao reduzir o trânsito de recursos financeiros entre os participantes, diminuir os riscos operacionais e garantir a liquidação dos recursos com maior controle pelo sistema de cartões. A liquidação centralizada possibilita condições concorrenciais idênticas aos participantes da indústria de cartões, o que resulta em benefícios para o consumidor.

O novo processo, embora simplifique o trânsito de recursos, é de implementação complexa, uma vez que estão envolvidos 48 Instituições Domicílios de Estabelecimentos Comerciais e 21 credenciadores e subcredenciadores, com aproximadamente 220 milhões de pagamentos a cada mês.

O Banco do Brasil informa que houve uma instabilidade em seus sistemas após a implementação da nova regra, o que impediu o processamento de créditos a alguns estabelecimentos. As medidas para regularização já foram adotadas e os créditos já estão sendo efetuados, com previsão para conclusão de todos os acertos até 27/11

A CAIXA esclarece que houve uma instabilidade em seus sistemas nos dias 20 e 21 de novembro, mas informa que a intercorrência já foi sanada e que tomou medidas para que nenhum cliente seja prejudicado. Para outras informações acerca do funcionamento do Sistema de Liquidação Centralizada (SLC), o banco recomenda contatar a Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito (ABECS).

 

 

Comentários

Conteúdo para assinantes. Assine JP Premium.