Estudo reforça chance de transmissão sexual do vírus zika

  • Por Agência Estado
  • 05/04/2016 21h59
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Cynthia Goldsmith / CDC Imagem de microscópio eletrônico do vírus da zika (pontos pretos) em tecido humano

Dois estudos publicados nesta terça-feira, 4, na revista científica Cell apresentam os últimos avanços nas pesquisas sobre o vírus zika. Um deles, liderado por cientistas da Universidade de Pittsburgh (Estados Unidos) revela que os trofoblastos – uma camada de células envolvida na formação da placenta humana – são resistentes à infecção pelo zika e possuem potente ação antiviral.

O outro estudo, feito em camundongos geneticamente modificados e liderado por cientistas da Universidade de Washington (Estados Unidos), rastreou os tecidos mais vulneráveis à infecção por zika e concluiu que os maiores níveis virais se concentram no cérebro, na medula e principalmente nos testículos dos animais infectados – o que reforça a possibilidade de transmissão sexual

A zika é suspeita de causar problemas neurológicos congênitos – como a microcefalia – e os cientistas cogitaram que o vírus alcançasse o feto em desenvolvimento passando através dos trofoblastos, uma camada de células placentárias que envolve e nutre o feto. Mas o novo estudo da Universidade de Pittsburgh descarta totalmente essa hipótese.

Ao estudar células isoladas a partir de placentas humanas, os pesquisadores descobriram que o zika não infecta os trofoblastos Os pesquisadores, no entanto, continuam sem saber como o vírus atravessa a placenta, mas descobriram que os trofoblastos têm uma ação antiviral potente.

“Os trofoblastos são a primeira linha de defesa do bebê contra qualquer coisa que venha do sangue materno, então era esperado que essas células de alguma maneira fossem resistentes a infecções virais”, dissse Yoel Sadovsky, da Universidade de Pittsburgh.

“Com base no nosso modelo, parece que os trofoblastos têm uma capacidade inerente de resistir à proliferação do vírus zika, embora ainda não tenhamos conseguido descobrir qual é o caminho do vírus para penetrar na cavidade fetal”, afirmou Sadovsky.

A equipe coordenada por Sadovsky revelou que os trofoblastos liberam a molécula conhecida como interferon 3, um potente antiviral que detém a replicação do vírus zika. No estudo, os cientistas utilizaram amostras de duas linhagens do vírus – uma proveniente da floresta Zika, em Uganda e outra isolada no Camboja.

“De fato sabemos escandalosamente pouco sobre como os vírus atravessam a placenta – não só o zika, mas também os vírus da rubéola, da herpes e outros que causam defeitos congênitos. O que torna nossa descoberta interessante é que os trofoblastos estão potencialmente em comunicação com as células maternas para protegê-las também contra infecções virais”, disse Carolyn Coyne, também da Universidade de Pittsburgh.

Os autores do artigo afirmam que os resultados são sólidos, já que os trofoblastos humanos por eles cultivados em laboratório são praticamente idênticos aos que são encontrados em placentas em desenvolvimento. Entretanto, os trofoblastos estudados foram extraídos de gestações no terceiro trimestre – o que significa que os trofoblastos poderiam ser vulneráveis à zika no início da gravidez.

Patologia

Os camundongos normais não desenvolvem a infecção por zika. Para estudá-la, cientistas da Universidade do Texas (Estados Unidos) desenvolveram – e descreveram em artigo publicado no dia 28 de março – animais transgênicos com uma deficiência na resposta imune que os deixa vulneráveis à infecção. O estudo da Universidade de Washington, que investigou quais são os tecidos mais vulneráveis à infecção por zika, é o primeiro a ser realizado com o novo modelo animal.

Michael Diamond, da Escola de Medicina da Universidade de Washington, autor principal do estudo, afirma que seu interesse pelo zika despertou em junho de 2015, depois de um encontro com cientistas brasileiros em um congresso dos Institutos Nacionais de Saúde (NIH, na sigla em inglês). Os brasileiros descreveram evidências de uma escalada de defeitos congênitos em bebês no Brasil coincidindo com a epidemia de zika e Diamond mobilizou sua equipe para estudar o zika.

De acordo com o estudo, o vírus se acumula em alta concentração no cérebro, na medula espinhal e nos testículos dos animais infectados. Os cientistas descobriram que, nos testículos, os níveis virais são maiores que em todos os outros tecidos. Segundo eles, essa descoberta reforça os dados clínicos que indicam a possibilidade de transmissão sexual.

“Nós procuramos evidência de zika nos testículos dos camundongos por causa da crescente evidência de que há transmissão sexual. Ficamos surpresos porque os níveis virais que vimos ali eram maiores que em qualquer outro tecido. Agora estamos fazendo mais testes para determinar por quanto tempo esses níveis virais se mantêm, o que poderia nos ajudar a estimar o intervalo de tempo em que o zika pode ser transmitido sexualmente”, afirmou Diamond

Segundo Diamond, nos camundongos transgênicos, o vírus se replica em grande número e se acumula nos lugares em que causa a doença em humanos. “Aparentemente, mulheres grávidas infectadas pelo zika podem passar o vírus para seus bebês no útero e os recém-nascidos também são suscetíveis à infecção. Além de crianças, não vemos casos severos da doença na maior parte das pessoas com zika – exceto uma pequena fração que desenvolve a síndrome de Guillain-Barré”, afirmou Diamond.

Para realizar a pesquisa, os cientistas produziram a infecção na pele dos camundongos vulneráveis, como forma de simular a inoculação do vírus pelo mosquito. No estudo, os cientistas usaram cinco linhagens de zika: a que circulou em Uganda em 1947, três que circularam no Senegal na década de 1980 e a da Polinésia Francesa, quase idêntica à que causa a atual epidemia no Brasil. Todas tiveram resultados semelhantes nos camundongos.

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