Gavrilo Princip, herói ou terrorista?

  • Por Agencia EFE
  • 26/06/2014 19h29

Snezana Stanojevic.

Belgrado, 26 jun (EFE).- Um lutador pela liberdade ou terrorista? Jovem idealista ou ultranacionalista? A figura de Gavrilo Princip continua gerando debate cem anos depois de, ao assassinar o herdeiro ao trono austro-húngaro, ter causado o início da Primeira Guerra Mundial.

Segundo a época e o país, a imagem do autor do magnicídio do arquiduque Francisco Ferdinando em 28 de junho de 1914 em Sarajevo foi apresentada, e inclusive utilizada, de diferentes maneiras.

“A interpretação de Princip era diferente entre um sistema político e outro. De herói nacional nos tempos da Iugoslávia a anarquista e esquerdista durante socialismo, até a atual imagem de um sérvio valente”, disse à Agência Efe Dubravka Stojanovic, professora da Faculdade de História em Belgrado.

Uma perspectiva que muda também segundo o país, já que, como lembra esta renomada especialista, “para a opinião pública austríaca, Princip é um terrorista e assassino”.

Mas Stojanovic analisa este jovem com outros olhos e o vê também como uma vítima.

Ele tinha apenas 19 anos quando cometeu o atentado, sendo “usado” por grupos de oficiais conspiradores no exército sérvio, todos eles opositores ao poder civil e decididos a unificar todos os sérvios em um único Estado por meio da violência.

A historiadora se refere a “Crna ruka”, a chamada “Mão Negra”, uma sociedade secreta que armou e treinou o “comando” de seis jovens que deveriam assassinar o arquiduque austríaco.

“O atentado de Sarajevo foi em seu próprio interesse, não em interesse do Estado sérvio”, afirmou Stojanovic.

Ela lembrou que a Sérvia era então um estado frágil que não buscava novos conflitos após as guerras balcânicas de 1912/13 e a retirada do Império Otomano da região.

Quando a Justiça austro-húngara o julgou por magnicídio, Princip afirmou ser um nacionalista iugoslavo, não sérvio, e que o objetivo do atentado era a união dos eslavos do Sul.

“Sou um nacionalista iugoslavo e busco a unificação de todos os iugoslavos em qualquer forma de Estado e que sejam libertados da Áustria”, declarou ele durante o processo.

Segundo a lei austro-húngara, por não ter ainda completado 20 anos de idade, Princip não podia ser condenado a uma pena superior a duas décadas de prisão.

Ele não chegou a cumprir essa condenação: morreu de tuberculose em 1918 em uma penitenciária em Terezin, hoje República Tcheca.

Princip era membro da organização “Mlada Bosna” (Jovem Bósnia), formada por sérvios, muçulmanos e croatas, as três grandes comunidades do país, que então estava sob o domínio de Viena.

Após a guerra civil bósnia (1992 a 1995), o “herói” Princip passou a ser visto por muitos croatas e muçulmanos como um símbolo do expansionismo sérvio, e considerado por isso um terrorista.

“Todos abusam da história e intercalam nela o que querem mandar como mensagem (político)”, afirmou Stojanovic.

Em 1992, quando as tropas servo-bósnias começaram o cerco a Sarajevo, foram apagados todos os rastros de homenagem ao antigo herói, como as marcas no asfalto da rua onde Princip fez o disparo, seu nome em uma placa em uma ponte e a placa em sua memória em um museu.

Para muitos sérvios, no entanto, Princip continua sendo um herói, e a Sérvia planeja construir um monumento em sua homenagem em Belgrado, em lembrança dos 100 anos do começo da Grande Guerra.

Inclusive há uma tendência nos setores mais nacionalistas a reivindicar que Princip foi um lutador pela “Grande Sérvia”, uma interpretação que Stojanovic considera “errônea e mal-intencionada”.

A historiadora reconhece que a Primeira Guerra Mundial é ideal para a “mitologização”. Isso porque a Sérvia esteve no lado vencedor, obteve vitórias militares, mas sofreu enormes perdas humanas, o que junto com a figura de Princip são os ingredientes perfeitos para “abusar” de uma visão nacionalista da história, concluiu Stojanovic. EFE

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