Grupos conservadores tentam reeditar a “Marcha da Família” 50 anos depois

  • Por Agencia EFE
  • 21/03/2014 16h04

Brasília, 21 mar (EFE).- Grupos conservadores convocaram para este sábado uma passeata que tentará reeditar uma manifestação realizada em 1964, que preparou o terreno para o golpe militar que no dia 1º de abril desse mesmo ano derrubou o presidente João Goulart.

Esse levante militar instaurou uma ditadura que se prolongou até 1985 e teve como ante-sala a chamada “Marcha da Família com Deus Pela Liberdade”, que aconteceu no dia 19 de março de 1964 em São Paulo e reuniu, segundo diversas fontes, 100 mil pessoas que exigiam às Forças Armadas “deter o avanço do comunismo”.

A convocação para as passeatas que amanhã pretendem tomar as ruas de dezenas de cidades do país foi lançada por grupos de militares aposentados e setores conservadores que tacham de “comunista” o governo da presidente Dilma Rousseff, vinculada durante sua juventude a grupos que pegaram em armas para combater a ditadura.

O ministro da Defesa, Celso Amorim, assegurou na semana passada a correspondentes estrangeiros que “nenhum militar da ativa participa dessa convocação” e garantiu o compromisso das Forças Armadas com a democracia.

O suposto avanço do “comunismo” alegado hoje por esses grupos foi a desculpa para o golpe de 1964, que afundou o Brasil durante 21 anos em um clima de violenta repressão e censura; que deixou milhares de mortos, 400 desaparecidos e levou aos milhares ao exílio.

Goulart, derrubado em 1º de abril de 1964, tinha sido eleito vice-presidente em 1960, como companheiro de chapa de Jânio Quadros, que renunciou a seu mandato em agosto de 1961.

Dias antes de sua renúncia, Quadros tinha recebido e condecorado o argentino-cubano Ernesto Che Guevara, então ministro da Indústria de Cuba e símbolo da revolução liderada por Fidel Castro.

Após a renúncia de Quadros, Goulart assumiu a presidência e inquietou os setores conservadores, que desconfiavam de seus conhecidos vínculos com China e Cuba, com o Partido Comunista e com o social-democrata Leonel Brizola, que era um de seus padrinhos políticos e também seu cunhado.

Goulart imprimiu a seu governo um forte caráter progressista e se comprometeu a promover um programa de “reformas de base”, que em plena Guerra Fria alertaram os Estados Unidos e os setores mais conservadores da sociedade brasileira.

O então presidente anunciou essas reformas em um grande ato realizado no Rio de Janeiro em 13 de março de 1964, que, segundo muitos analistas, motivou a reação conservadora, que já conspirava contra o regime democrático junto com os militares.

Documentos confidenciais da época e divulgados pelos Estados Unidos nos últimos anos revelaram que a Casa Branca e o Pentágono também encorajaram o movimento que finalmente derrubou Goulart durante a madrugada de 1º de abril de 1964.

Goulart morreu no exílio, na cidade argentina de Mercedes em 1976. Oficialmente a causa da morte foi um ataque cardíaco, mas ainda se investiga se foi envenenado em uma operação que teria sido parte do Plano Condor, articulado pelas ditaduras que imperavam na época no Cone Sul.

O governo de Dilma não se pronunciou sobre a convocação para amanhã, que também inclui uma firme rejeição à Comissão da Verdade instalada pela presidente para estabelecer a “verdade histórica” sobre a repressão durante a ditadura.

Essa comissão tem, no entanto, limites legais marcados por uma anistia ditada em 1979 pela própria ditadura, ainda em vigor e que beneficiou tanto os guerrilheiros como os repressores do regime.

A anistia foi contestada em 2010 por movimentos sociais que pediram sua nulidade perante o Supremo Tribunal Federal, mas a corte se pronunciou em favor de sua “constitucionalidade”, com o que segue em vigor e impede julgar os acusados de crime contra a humanidade registrados entre 1964 e 1985. EFE

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