Guerra financeira dos EUA contra Al Shabab prejudica economia da Somália

  • Por Agencia EFE
  • 13/03/2015 10h34

Muktar Abdi e Alicia Alamillos.

Mogadíscio/Nairóbi, 13 mar (EFE).- Desde os atentados de 11 de setembro de 2001, o governo americano aumentou o controle sobre as transferências financeiras a países onde operam grupos terroristas para evitar seu financiamento, o que afeta consideravelmente a economia interna de nações como a Somália.

Em fevereiro, o banco Merchants – que computa cerca de 80% do volume de remessas dos EUA à Somália – fechou todas as contas de transferência ao país africano porque a atividade era “complexa demais” para ser submetida às regulações de segurança e identificar “possíveis violações da lei”.

O medo a fortes sanções fez com que todas as entidades financeiras americanas fechassem o fluxo de remessas à Somália, onde age o grupo jihadista Al Shabab, braço armado da Al Qaeda no Chifre da África e responsável pela morte de milhares de pessoas.

Como em todos os meses, Isho Ali Isak, um somali de 72 anos, deveria poder comparecer à sede de algum Operador de Transferências Monetárias (MTO, sigla em inglês) para sacar o dinheiro que seu filho, que mora nos EUA, envia para sua sobrevivência.

“Meu neto e eu dependemos do meu filho, que nos alimenta há 17 anos. Pedi empréstimo, mas não posso comprar os remédios”, conta Isho.

O Merchants Bank, da Califórnia, era o último grande banco a permitir que a comunidade somali dos EUA enviasse remessas, mas também as proibiu, o que gerou uma forte incerteza econômica entre a população do país.

Após a proibição, que bloqueia o último meio legal de envio de remessas à Somália dos EUA, a diáspora iniciou uma campanha no Twitter com a hashtag #IFundFoodNotTerror (Eu financio comida, não terror).

As remessas, que em 2013 chegaram a US$ 1,3 bilhão, representam de 25% a 40% do Produto Interno Bruto (PIB) somali, segundo o último relatório da Oxfam.

De acordo com a organização humanitária Adeso, com sede na Somália, as remessas são a maior fonte de renda no país, maior até que a ajuda internacional, de US$ 715 milhões. Mais de 40% dos somalis depende dessas transferências para sobreviver.

Mohamed Ibrahim Garas é órfão e mora em Mogadíscio. Dos Estados Unidos, seu tio envia o dinheiro para pagar as contas escolares, o aluguel e a comida. Sem outro fonte de renda alternativo, Mohammed não sabe como arcar com as despesas do próximo mês.

A falta de regulação e a alta corrupção política fizeram da Somália um país “perigoso demais” para empresas internacionais como a Western Union, que não conta com nenhum escritório no país africano.

A diáspora utiliza operadores menores, especializados em transferências para o Chifre da África.

Abdirisag Aamin, diretor de MTO em Mogadíscio, conta que todos os dias recebe ligações de clientes, para os quais não pode dar “nenhuma solução”.

Omar Ali, analista político somali, explicou à Agência Efe que o governo não foi capaz de construir um sistema financeiro seguro e que facilite as transferências monetárias da diáspora.

“O governo não preparou um Banco Central que possa assegurar a entrada de remessas no país. Por isso que, hoje dia, não há solução para a proibição dos bancos ocidentais”, criticou.

O ministro das Relações Exteriores somali, Abdisalam Omer, afirmou no início de março que a Somália passa por um cenário crítico: o terrorismo do Al Shabab e a recuperação econômica.

“Em breve, a diáspora não será capaz de enviar dinheiro, e um sistema perfeitamente legal se tornará ilegal e oculto”, disse Omer.

Em Mogadíscio já houve manifestações contra essas medidas e as pressões do Tesouro americano.

“Há famílias que não podem pagar suas contas ou os empréstimos que tiveram que pedir desde que as remessas foram canceladas”, declarou à Efe um dos manifestantes. Organizações humanitárias que operam na Somália, como Oxfam, Adeso e as Nações Unidas pediram que a proibição seja suspensa.

Os EUA não são o único país a encerrar as transferências de remessas, a mesma medida foi adotada por bancos britânicos e australianos. No entanto, o Reino Unido estuda a possibilidade de criar um “corredor seguro”, que evite tanto o financiamento da Al Shabab como a insegurança econômica dos somalis. EFE

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