Ian Paisley, um homem de Estado de passado agitador

  • Por Agencia EFE
  • 12/09/2014 12h09

Javier Aja.

Dublin, 12 set (EFE).- O reverendo protestante Ian Paisley, que morreu nesta sexta-feira aos 88 anos, deixa para trás uma dilatada carreira sem a qual seria impossível entender quase quatro décadas de conflito na Irlanda do Norte, desde suas origens até sua resolução.

Ele foi acusado de incendiar a província no final da década dos anos 60 com suas “chamas” anticatólicas e, ao mesmo tempo, foi elogiado por protagonizar nos últimos anos uma das transformações políticas mais surpreendentes na história deste país.

Sua morte marca o fim de uma época, mas será a história que o julgará como o homem que contribuiu para a derrota do Exército Republicano Irlandês (IRA, na sigla em inglês) ou como o traidor que aceitou formar governo com um “partido de terroristas”, o Sinn Féin de Gerry Adams, segundo os unionistas mais extremos.

Do “levarei ao túmulo minhas convicções” ou o “nunca, nunca, nunca”, o reverendo passou a se sentar finalmente em 2007 em um Governo de poder compartilhado com seus antigos inimigos, o braço político do já inativo IRA.

Ainda mais chamativo foi, sobretudo para seus correligionários mais tradicionais, a estreita e até cálida relação que chegou a manter com seu adjunto no governo, o ex-comandante do IRA Martin McGuinness, o que lhes valeu o apelido de “Os Irmãos Risadinhas” (“The Chuckle Brothers”).

Para muitos de seus seguidores, o octogenário dirigente protestante, apelidado “Doc” ou “The Big Man”, não só havia partido sua palavra, também tinha caído no ridículo com as exibições públicas de camaradagem.

Nascido em 6 de abril de 1926 no seio de uma família escocesa que emigrou no século XVII para o norte da Irlanda, Paisley orientou toda sua vida rumo a uma cruzada contra os católicos irlandeses empenhados na unificação da ilha.

O papa João Paulo II foi qualificado por ele como “anticristo” e ultimamente atacou os sacerdotes irlandeses pedófilos, quando protestou contra a visita do papa Bento XVI ao Reino Unido.

Ordenado sacerdote em 1946, fundou pouco depois a Igreja Presbiteriana Livre do Ulster, da qual foi nomeado moderador em 1951, e 20 anos mais tarde criou o Partido Democrático Unionista (DUP, em inglês).

Ambas as organizações serviram tanto a ele para defender a união com o Reino Unido como para atacar, por exemplo, os homossexuais, a quem quis criminalizar com a campanha “Salvar o Ulster da Sodomia”.

Em 1970 foi eleito deputado do Parlamento de Belfast, do qual foi expulso por desacato e, posteriormente, passou também a ocupar uma cadeira na Câmara dos Comuns britânica, da qual foi também expulso em 1981 por “mau comportamento”.

Em 1979 conseguiu uma cadeira no parlamento Europeu, que conservou até 2003, e nos pleitos autônomos de 1998, que puseram fim a 26 anos de governo direto de Londres, se tornou o candidato mais votado e o DUP a terceira força política, um território desconhecido para ele.

Paisley passou quase toda sua carreira nos bancos da oposição, articulando pontos de vista reacionários e sem oferecer firmes alternativas ao sangrento conflito norte-irlandês.

Também foi acusado de criar em 1986 a “Resistência do Ulster”, um “Exército de cidadãos” comprometidos com a defesa da fé protestante e da união com a Coroa britânica por todos os meios possíveis, incluindo a luta armada.

Ironicamente, Paisley atingiu seu apogeu político ao mesmo tempo que seu arqui-inimigo, o Sinn Féin, ambos agora garantidos como os principais representantes de suas respectivas comunidades.

No final de sua carreira o reverendo demonstrou estar à altura das circunstâncias e o pacto de governo com o Sinn Féin parece ter posto o ponto final ao conflito.

O reverendo deixou em 2008 o posto de primeiro-ministro norte-irlandês no Executivo de poder compartilhado, mas continuou vinculado à política desde seu posto de deputado no Parlamento de Londres até as eleições britânicas de maio de 2010.

Paisley, que se casou com Eileen Cassells em 13 de outubro de 1956, tinha cinco filhos: Sharon, Rhonda, Cherith e os gêmeos Kyle e Ian. EFE

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