Irã termina 2014 sem pacto nuclear e abertura, como prometido por presidente
Ana Cárdenes.
Teerã, 17 dez (EFE).- Após um ano e meio no poder, o moderado Hassan Rohani não conseguiu cumprir uma de seus principais promessas: fechar um acordo nuclear com a comunidade internacional em 2014 que ponha fim a mais de 12 anos de crise e sanções para restaurar a relação do Irã com o mundo.
Em 24 de novembro, data limite que as partes tinham estabelecido, foram encerrados sete dias de intensas negociações em Viena entre o Irã e o G51 (China, Rússia, EUA, Alemanha, França e o Reino Unido) com o decepcionante anúncio de uma nova prorrogação de sete meses diante da impossibilidade de chegarem a um acordo.
No Irã, a notícia foi um balde de água fria sobre as esperanças de milhões de pessoas impacientes pelo fim de sanções que asfixiam há anos a economia do país, especialmente desde que foram endurecidas em 2012, cortando o acesso ao sistema bancário internacional e reduzindo dramaticamente as exportações de gás e petróleo, principais produtos iranianos.
O governo vendeu a prorrogação como um sucesso que demonstrava que a República Islâmica não está disposta a aceitar um acordo ruim, nem renunciar aos seus direitos nucleares, argumento útil para enfrentarem os setores mais radicais, nada dispostos a fazer concessões no terreno nuclear, muito menos para os Estados Unidos.
“Na questão nuclear, EUA e os países coloniais europeus se uniram e puseram todo seu empenho em pôr a República Islâmica de joelhos, mas não conseguiram e nem poderão”, declarou o líder supremo, aiatolá Ali Khamenei.
Rohani qualificou as negociações como um “sucesso”, e prometeu que “as centrífugas (de urânio) não deixarão de funcionar”. Ele afirmou, satisfeito, que “hoje ninguém no mundo duvida que o Irã deve ter tecnologia nuclear, incluído o enriquecimento em seu próprio solo, e ninguém duvida que as sanções devem ser eliminadas”.
Apesar das reações triunfantes, a falta de resultados palpáveis é especialmente prejudicial para o presidente, que pôs todo seu capital político desde que chegou ao poder na questão nuclear e na promessa de melhorias econômicas que dificilmente chegarão se as sanções não forem suspendas.
De fato, a prioridade das negociações nucleares é o argumento que altos funcionários e diplomatas iranianos utilizam em privado para justificar a falta de avanços em outros setores nos quais Rohani prometeu mudanças, especialmente nas liberdades sociais e direitos humanos.
O governo não conseguiu antecipar sequer as promessas que poderiam parecer mais singelas de cumprir, como por exemplo a abertura do acesso à redes sociais como Facebook e Twitter, vetadas no país desde 2009 e que, no entanto, são utilizadas com ferramentas anti-filtros por amplos setores da população, incluídos vários ministros.
Também não conseguiu impedir que o Poder Judiciário e o Ministério de Inteligência e corpos de segurança, nas mãos dos setores mais radicais, continuem fechando meios de comunicação ou detendo jornalistas e defensores dos direitos humanos.
O número de execuções na forca, um dos grandes pontos obscuros do país, também não se reduziu desde que Rohani assumiu. O Irã continua a ser o segundo país com mais execuções depois da China e, segundo dados do Centro de Documentação de Direitos Humanos do Irã, no último ano enforcou mais de 600 pessoas.
As ativistas de direitos das mulheres também não veem avanços desde a mudança de governo.
Dois casos colocaram de novo a questão dos direitos das mulheres em pauta na última metade do ano: o enforcamento de Reyhaneh Jabbari, acusada de matar o homem que a estuprou e cujo julgamento a comunidade internacional considerou viciado, e a detenção durante meses e condenação de uma jovem britânico-iraniana que se manifestou pela abertura dos estádios de vôlei ao público feminino.
Além disso, uma série de ataques a mulheres com ácido na cidade de Isfahan, por não estarem corretamente corretas e ao mesmo tempo em que se debatia no parlamento uma lei para dar mais liberdade a quem se dedica a “corrigir a moralidade” em público, provocou protestos espontâneos que obrigaram o governo a colocar a tropa de choque nas ruas como não se via há cinco anos e forçaram às autoridades a condenar com dureza esses atos.
Os atacantes, no entanto, ainda não foram detidos e na sociedade ficou a sensação de que os mais radicais foram convenientemente apoiados em sua insistência de forçar as mulheres a terem mais recato em público.
Apesar da falta de avanços nestes e outros campos, ou os obstáculos para influenciar nas universidades (com a rejeição da confiança do parlamento a quatro de suas propostas para ministro de Ciência), Rohani conseguiu introduzir leves mudanças na economia que, apesar de não terem melhorado notavelmente a situação dos iranianos, ao menos frearam sua deterioração.
No último ano, a inflação caiu de 40% para menos de 20% – segundo dados oficiais, as taxas de câmbio com o dólar e o euro foram estabilizadas e a exportação e a importação foram facilitadas.
A pontual suspensão parcial de algumas das sanções que acompanharam as negociações permitiu ao Irã acessar parte de seus fundos congelados no exterior e abriu partes muito específicas de seu mercado, permitindo a chegada ao país, por exemplo, de equipamentos automotivos e de aviação.
Mas os iranianos querem mais e, por enquanto, parece que terão que esperar – talvez até julho, novo prazo limite para as negociações nucleares – para ver se Rohani conseguirá cumprir sua promessa e tirar o Irã desse prolongado isolamento internacional. EFE
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