Liberdade de expressão de parlamentares causa polêmica no Irã
Ana Cárdenes.
Teerã, 13 jan (EFE).- As críticas à Justiça feitas pelo deputado iraniano Ali Motahari e sua acusação, em seguida, por “insultos” ao Poder Judiciário desencadearam um debate sobre a liberdade de expressão e imunidade dos parlamentares do país durante discursos na câmara.
No dia 29 de dezembro de 2013, Motahari fez uma dura crítica ao sistema judiciário durante um discurso no Parlamento, quando chamou atenção para a falta de processos e pelas longas penas sentenciadas a vários dos envolvidos na Maré Verde, as maciças manifestações de 2009 que aconteceram depois da polêmica reeleição do presidente Mahmoud Ahmadinejad, considerada uma fraude pela oposição.
O deputado criticou diretamente o presidente do Poder Judiciário, o aiatolá Sadegh Larijani, por manter em prisão domiciliar e sem julgamento os dois candidatos presidenciais que rejeitaram os resultados das eleições de 2009, Mir Hossein Moussavi e Mehdi Karrubi, e acusou sua instituição de atuar “sob influência dos organismos de Segurança e Inteligência”.
Motahari foi ainda mais longe e pediu que a Justiça também submetesse Ahmadinejad a julgamento, para solucionar de uma vez por todas o que os setores oficiais e conservadores iranianos chamam de “a sedição de 88 (2009)”.
Além disso, questionou as longas penas impostas aos manifestantes que foram julgados e perguntou qual foi seu crime “além de criticar o sistema”.
“Estas sentenças foram emitidas por um juiz justo e independente ou por um juiz sob as ordens dos interrogadores e agentes da Inteligência?”, perguntou Motahari.
Um dia depois de seu discurso, ele foi acusado penalmente pelo procurador-geral de Teerã, por “insultar” a Justiça.
No dia 4 de janeiro foi bloqueado o acesso a seu site pessoal, embora o Ministério de Inteligência tenha negado a responsabilidade por tal medida.
O porta-voz de Justiça e procurador-geral, Gholam-Hossein Mohsen-Ejei, assinalou que “segundo a Constituição os deputados podem expressar suas opiniões no marco de suas tarefas”, mas acrescentou que podem ser perseguidos judicialmente se insultarem uma pessoa ou instituição.
“Insultar não está entre as tarefas dos parlamentares e eles podem ser indiciados por isso. A questão é se desfrutam de imunidade absoluta e, em sua interpretação da Constituição, o Conselho de Guardiães disse que a imunidade não significa que, se um deputado cometer um crime, o judiciário não pode imputá-lo”, declarou Ejei à agência “Fars”.
Ejei também disse que o “pecado” cometido pelo Movimento Verde, que impulsionou os protestos, é “imperdoável” e argumentou que seus líderes ainda não foram julgados por causa da “amabilidade” de seu departamento.
Um comandante do poderoso Corpo dos Guardiães da Revolução Islâmica, Gholam-Hossein Gehybparvar, chegou a acusar Motahari de ser “mentalmente instável”.
A reação da procuradoria reabriu o debate sobre as garantias à liberdade de expressão dos deputados e a necessidade de que sejam imunes em seus discursos na câmara.
Os setores mais conservadores consideram intoleráveis os discursos como o de Motahari e exigem a aplicação de punições, enquanto os mais moderados pedem respeito à liberdade de expressão no Legislativo.
O jornal moderado “Armam” lembrou esta semana que o artigo 84 da Constituição garante a “todo representante o direito de expressar suas opiniões sobre todos os assuntos do país” e que o 86 afirma que os deputados são “completamente livres para expressar sua opinião e votar no desenvolvimento de suas funções sem poderem ser julgados ou detidos por opiniões ou votos expressados no Parlamento”.
O veículo de comunicação considera “uma grande limitação” que a imunidade parlamentar não possa ser garantida.
Além disso, a publicação argumenta que, “se qualquer tipo de crítica pode ser considerada um insulto, então há vários casos similares” no Parlamento.
O jornal conservador “Jomhuri-ye Eslami” também defendeu a mesma posição ao afirmar que os deputados “podem comentar em todos os assuntos do país e expressar suas opiniões sobre normas e propostas. Ninguém pode perguntar por que um parlamentar criticou a Justiça e questionou as ações de seus funcionários”.
Motahari, segundo a publicação, não fez mais que “exercer seu direito constitucional como parlamentar ao realizar sua obrigação legal. Seu discurso não sugere que toda a Justiça e seus funcionários são incompetentes”, por isso “não há nenhuma justificativa legal para processá-lo”.
Motahari, respondeu a sua acusação por meio de uma carta na qual afirma que “um representante do Parlamento tem o direito de comentar sobre todos os assuntos do país”.
“Essa acusação cheira a despotismo. Seria melhor que a Justiça tolerasse as críticas e respondesse às perguntas como sinal de respeito à câmara”, escreveu na carta. EFE
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